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Haddad não é economista, mas FHC, do Plano Real, era?
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O mercado financeiro, seja pela movimentação dos pregões, seja pela palavra de seus influenciadores, ainda resiste à indicação de Fernando Haddad para o Ministério da Fazenda. Nisso, acabam se assemelhando às pessoas acampadas em frente aos quartéis, contando 72 horas para que o presidente Jair Bolsonaro, derrotado nas eleições de outubro, comande um golpe e retome o poder.
Mas o calendário constitucional avança e a tendência é que a resistência, tanto na porta dos quartéis quanto nas sessões dos mercados de ativos, acabe diluída. Enquanto isso, críticas a Haddad e desconfianças sobre sua capacidade de conduzir a economia continuam a pipocar, com reflexos nas cotações. Desde as primeiras especulações com o nome do ex-ministro e ex-prefeito para a Fazenda, e depois com a confirmação, o Ibovespa, principal índice da Bolsa brasileira está em queda, e a cotação do dólar, em alta.
Qual é a crítica dos representantes do mercado a Haddad? Na linha de frente dos ataques ao futuro ministro está o argumento de que Haddad não é economista, embora o novo ministro tenha um mestrado em economia, obtido na USP (Universidade de São Paulo). É bastante evidente que esta queixa é o topo visível de uma contestação mais profunda.
O professor de ciência política seria um esquerdista, que tenderá a promover uma política econômica populista, em que predominaria uma gastança com o dinheiro público - eis a tradução em resumo do que incomoda o pessoal do mercado financeiro, em geral ferrenho defensor de ideias econômicas entre as mais ortodoxas da praça.
Implicar com um ministro da Fazenda porque ele não é economista é mais do que mero preconceito. É não ter memória e olhos para a história. O ministro da Fazenda que fez o Plano Real era sociólogo, e nem tinha a experiência executiva de Haddad.
Vindo de uma carreira como senador, depois de ter fracassado numa tentativa de se eleger prefeito de São Paulo, FHC foi nomeado por Itamar Franco, vice do presidente deposto Fernando Collor, ministro das Relações Exteriores, em 1992. No ano seguinte, assumiu o ministério da Fazenda, reunindo um grupo de jovens economistas, com ideias e estudos não convencionais sobre as razões da hiperinflação que afligia a economia. O Plano Real, que promoveu uma estabilização duradoura, foi resultado de uma ação de viés heterodoxo, sob o comando de um ministro não economista.
O QUE FOI O PLANO REAL?
. O Plano Real foi um programa de estabilização monetária inovador. Em lugar de tabelamentos de preços e contração do volume de dinheiro em circulação, o plano atacou a "inércia inflacionária".
. Como a correção monetária, instituída em 1965, havia se generalizado na economia, estudos dos economistas André Lara Resende e Persio Arida, da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica, do Rio de Janeiro), concluíram que a própria inflação passada era o cerne da alta de preços.
. Para combater esse processo, em março de 1994 entrou em vigor a URV (Unidade Real de Valor), uma moeda virtual, corrigida diariamente por um mix de diversos índices de preços. A ideia era coordenar as altas de preços até o momento de corte nessas altas.
. Esse corte ocorreu em 30 de junho, com a URV convertida pela cotação do dólar no dia, com a troca da moeda vigente, o cruzeiro real, por uma nova moeda, o real. Ao mesmo tempo, diversos mecanismos de correção monetária, inclusive os salariais, foram proibidos por lei.
. Para viabilizar o plano de estabilização, um forte ajuste nas contas públicas, com a criação de novos tributos e aumento da carga tributária, foi feito preliminarmente. Depois da criação do real, na vigência de um regime de câmbio fixo, a cotação do dólar foi mantida valorizada, para evitar pressões inflacionárias.
Há, sem nenhuma dúvida, grandes diferenças entre o ambiente econômico de três décadas atrás e os tempos atuais. Mas, mesmo levando essas diferenças em consideração, não deixa de ser interessante imaginar o que teria acontecido se FHC, por não ser economista, não tivesse sido nomeado ministro da Fazenda e conduzido o Plano Real. Como Haddad, Fernando Henrique é, antes de tudo, um acadêmico ao estilo USP. Até em atitudes consideradas arrogantes, os dois se parecem.
A capacidade de reunir bons economistas no Ministério da Fazenda e conduzir reformas modernizadoras foram marcas históricas de FHC. Essas mesmas qualidades deverão agora serem cobradas de Haddad.
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