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José Paulo Kupfer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

PIB pode surpreender no 1º trimestre, mas expansão terá vida curta

08/03/2023 12h33

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O primeiro trimestre de 2023 está se aproximando do fim e a sensação, na economia, é de que o ritmo de atividades está em desaceleração, talvez caminhando para uma recessão. É bem possível, porém, que o resultado concreto seja uma surpresa positiva, com crescimento forte, quando os números da evolução do PIB (Produto Interno Bruto), entre janeiro e março, forem conhecidos.

Um crescimento nas vizinhanças de 1%, no primeiro trimestre, é o que estão prevendo economistas de ponta, especializados em analisar e projetar a variação do PIB. Essa previsão serve de base para as estimativas de uma expansão no entorno de 1,5% no conjunto de 2023, acima do 0,9% de alta, de acordo com a mediana de momento das projeções reunidas no boletim Focus, organizado semanalmente pelo Banco Central.

O que explica essas projeções de crescimento?

A "virada", inesperada diante das percepções de que a economia enfrenta uma crise de crédito — efeito-dominó depois da quebra da Americanas, combinado com juros altos por tempo prolongado —, se daria pela evolução muito desigual entre os setores econômicos. Mas teria vida curta, com os trimestres seguintes marcando pequenos avanços e recuos.

Todo o crescimento no primeiro trimestre viria da agropecuária e da indústria extrativa mineral, enquanto a atividade nos demais setores permaneceria estagnada ou em retrocesso. Comparando cada trimestre com trimestre anterior, depois de crescer 1%, nos primeiros três meses do ano, a atividade não iria além de 0,2% no segundo trimestre, registraria estagnação ou ligeiro recuo, no terceiro, e avançaria 0,3%, no último quarto de 2023.

Previsão de avanço desigual entre setores

As projeções apontam dinâmicas muito diferentes entre os diversos segmentos da economia. Agropecuária, também impulsionada por uma supersafra, e extrativa mineral, mais sensíveis aos estímulos de oferta — condições climáticas, variação de preços internacionais, disponibilidade de recursos para investir —, podem crescer mais de 7% em 2023, vindos de uma queda de 1,3% em 2022.

Já os setores mais sensíveis aos ciclos econômicos e às condições financeiras — indústria, construção civil, grande parte dos serviços —, que englobam 60% do PIB, retrocederiam 0,1% no ano. Segmentos menos sensíveis às condições financeiras, como a administração pública e serviços imobiliários — corretagem e aluguel de imóveis — cresceriam 1,2% em 2023.

Condições financeiras ditam ritmo de expansão

"As condições financeiras muito apertadas fazem a diferença nessas projeções. Aos juros altos por longo período juntou-se o contágio no crédito com o caso Americanas. A sensação trazida pelos indicadores é como se o Banco Central tivesse aumentado os juros e apertado ainda mais as condições financeiras, mesmo com a taxa Selic estacionada em 13,75%".
Braulio Borges, pesquisador do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getúlio Vargas) e economista sênior da LCA Consultores.

A expansão excepcional prevista para a agropecuária e o segmento extrativo mineral em 2023 terá impacto relativamente baixo sobre o consumo e o mercado de trabalho. A razão é que respondem por menos de 10% do PIB.

Reversões e travas no avanço

Medidas de política econômica podem reverter em parte o quadro dessa projetada estagnação. Bolsa Família de R$ 600 mensais ao longo do ano inteiro, outros programas de transferência de renda e a expectativa de êxito do programa Desenrola, de alívio do endividamento e da inadimplência, que são recordes hoje no país, são alguns dos pontos favoráveis. Também teria influência positiva a definição de uma âncora fiscal considerada crível.

Borges lembra, porém, um importante elemento restritivo nesse conjunto de possibilidades: os investimentos de estados e municípios, que deverão sofrer grandes cortes em 2023. Dos R$ 160 bilhões investidos pelos governos regionais em 2022, o volume aplicado deve cair para R$ 90 bilhões em 2023, um encolhimento de mais de 40%.

"Os governos regionais perderam mais de R$ 100 bilhões com as renúncias de tributos determinadas pelo governo Bolsonaro em 2022. Eles não podem carregar déficits primários nem se endividar para cobri-los, como é permitido para o governo central. Logo, terão de promover grandes contrações de investimentos".
Braulio Borges