José Paulo Kupfer

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Opinião

Empresário de sucesso, Abilio também foi influente nos rumos da economia

Da vida empresarial de Abílio Diniz muito se vai falar e escrever depois de sua morte, neste domingo (18), aos 87 anos. Abílio tem lugar garantido entre os maiores empresários brasileiros dos últimos 50 anos. Sua história é a saga de um empreendedor que construiu um império, a partir de um pequeno negócio familiar. Mas será justo lembrar também de sua influência nos rumos da política econômica no país.

Comandante do GPA (Grupo Pão de Açúcar), Abílio transformou uma pequena confeitaria criada por seus pais, o imigrante português Valentim Diniz e Floripes Pires Diniz, naquela que chegou a ser a maior empresa de varejo da América Latina. O GPA chegou a contar com mais de mil pontos de venda, e mais de 150 mil funcionários, sob diversas marcas e segmentos do setor de varejo — do auto-atendimento em supermercados ao comércio de eletrodomésticos e farmácias —, em diversos estados brasileiros e até em Portugal.

Influência na política econômica

Como um dos homens mais ricos do país, e empresário de grande sucesso, Abílio Diniz tornou-se influente entre seus pares empresários e também no mundo da política, Quando quando fez parte do CMN (Conselho Monetário Nacional), na época composto também por empresários, a convite do então ministro da Fazenda Mario Henrique Simonsen, de quem era próximo. Ficou no CMN por 10 anos, de 1979 a 1989.

Foi nos primeiros anos desse período que mantive contato frequente e regular com Abílio como repórter da revista Veja. Tínhamos um encontro semanal, às quintas-feiras, no escritório do empresário, ainda nos fundos da primeira loja do Pão do Açúcar, justamente onde antes tinha sido inaugurada a doceria de seus pais.

Labirinto de corredores

Chegar na sala pequena e sem luxos onde Abilio trabalhava, exigiu, no começo, que um cicerone me acompanhasse. Era preciso percorrer um labirinto de corredores até chegar ao local. As paredes eram decoradas com fotografias do Abílio esportista — são cenas como goleiro em times de futebol, ao lado de carros de corrida, em corridas e outras atividades físicas.

A sede administrativa do grupo, no Jardim Paulista, próxima do Parque do Ibirapuera, em São Paulo, era uma espécie de metáfora de seu crescimento vertiginoso, com a compra de concorrentes menores e abertura de lojas em ritmo agressivo. A família Diniz foi comprando as casas no quarteirão atrás da primeira loja, e as interligando como fosse possível, por meio de escadas, pontes e corredores.

Nossa combinação era de que as conversas seriam apenas para minha informação e orientação — "off the records", como se diz no jargão jornalístico. Menção "on the records", só com prévia combinação. A confiança de Abílio em mim nasceu de uma entrevista, para a seção "Páginas Amarelas" da Veja, que fiz com ele.

Nos encontros semanais, a conversa começava com Abílio discorrendo sobre algum tema, que ele considerava interessante no momento. Depois de responder às perguntas que eu fazia para fechar o tema, era minha vez de lançar as pautas e informações que eu estava apurando para obter confirmações — e mais detalhes — ou desmentidos.

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Nunca fui enganado ou levado, propositalmente, a desvios do que estava tentando confirmar. Devo ele a reunião de elementos para reportagens detalhadas e consistentes, e também alguns furos jornalísticos.

Análises econômicas

Ter Abílio com fonte privilegiada não me valia apenas pelas informações de bastidores. Abílio era municiado de informações econômicas e análises por uma equipe de jovens e talentosos professores da FGV-Eaesp, que ele reuniu no Pão de Açúcar. Esse grupo foi reunido e era liderado pelo economista Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro nos governos Sarney e Fernando Henrique Cardoso, nos tempos em que ele ocupou o cargo de superintendente geral do Pão de Açúcar.

Esse departamento de análise econômica produzia relatórios e estudos — como hoje fazem bancos e corretoras no mercado financeiro —, além de manter um excepcional banco de dados sobre a economia brasileira e internacional. Esse material era a base das intervenções de Abílio no CMN.

"Índice de Inflação Pão de Açúcar"

Elaborado pelo departamento de análise econômica, ficou famoso na época o "Índice de Inflação Pão de Açúcar", uma prévia bastante aproximada dos índices de custo de vida. Aproveitando a penetração e capilaridade das lojas do grupo, o índice era construído a partir dos preços pagos pela empresa a seus fornecedores. A poderosa diretoria de compras do Pão do Açúcar, nessa época, era dirigida por um irmão de Bresser Pereira, Silvio Bresser.

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Depois que Simonsen deixou o ministério da Fazenda, em 1979, a participação de Abilio no CMN foi ficando mais discreta. Sua saída se deu, já depois da redemocratização, no governo Sarney, no mesmo ano de 1989 em que foi vítima de um sequestro por seis dias.

Foi um período atribulado para o Pão de Açúcar, em que a sede deixou o local de origem e mudou para um prédio moderno, numa avenida de grandes edifícios de escritórios na zona sul de São Paulo. Foi também o período de briga com os irmãos, que resultou na compra da parte deles no negócio.

Do Pão de Açúcar ao Carrefour

Com o controle do Pão de Açúcar, Abilio empreendeu uma reestruturação drástica, que reduziu o número de lojas à metade. Em 2005, negociou uma associação com o grupo francês Casino. De novo uma sociedade tumultuada que resultou na perda do controle do Pão de Açúcar para os franceses.

Com a venda do Pão de Açúcar para o Casino, em 2012, Abílio comprou uma participação no grupo Carrefour, também francês e também gigante do setor, maior rede de supermercados do Brasil. Ao morrer, Abílio era vice-presidente do Conselho de Administração do Carrefour, no Brasil. O empresário brasileiro detinha a segunda maior participação acionária da rede francesa, logo atrás da família fundadora do gigante de varejo.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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