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Despacho de mala e assentos: Países pressionam aéreas por taxas abusivas

Os valores cobrados por empresas aéreas para marcação de assentos ou despacho de bagagens estão sob forte escrutínio em diversos países. Conhecidas como rendas auxiliares — tarifas que vão além do transporte entre origem e destino — essas cobranças enfrentam críticas nos Estados Unidos e na Espanha, onde a prática já resultou em uma multa milionária.

Multas pesadas na Espanha

No final de novembro, a Espanha aplicou sanções a cinco companhias aéreas de baixo custo (low cost) que operam no país, somando 179 milhões de euros (R$ 1,1 bilhão). A multa foi motivada por práticas consideradas abusivas, como a cobrança por malas de mão armazenadas no compartimento acima dos assentos.

As companhias multadas foram:

  • EasyJet -- 107,8 milhões de euros
  • Norwegian -- 39,2 milhões de euros
  • Ryanair -- 29,1 milhões de euros
  • Volotea -- 1,6 milhão de euros
  • Vueling -- 1,2 milhão de euros

Entre as razões citadas pelo governo espanhol para a punição estão:

  • Exigir pagamento adicional para transporte de bagagem de mão na cabine.
  • Cobrar taxas extras para reserva de assentos lado a lado em casos envolvendo menores de 18 anos e pessoas dependentes.
  • Impedir pagamentos em dinheiro nos aeroportos espanhóis.
  • Imposição de taxas desproporcionais para impressão de cartões de embarque.
  • Falta de clareza e omissão de informações nos preços publicados, dificultando a comparação de tarifas.

Apesar disso, a decisão foi criticada pela IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo), que defendeu a liberdade de preços como essencial para a concorrência e a escolha dos consumidores.

"Proibir todas as companhias de cobrar por malas de cabine significa que o custo será automaticamente embutido nos bilhetes. Isso prejudica os viajantes que buscam tarifas personalizadas", afirmou Willie Walsh, diretor-geral da IATA. Ele também classificou a medida como "ilegal e prejudicial".

Segundo a associação, uma pesquisa indicou que:

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  • 65% dos passageiros preferem pagar o menor preço possível por sua passagem aérea e pagar mais por quaisquer serviços adicionais necessários.
  • 66% concordam que, em geral, há transparência suficiente sobre as taxas cobradas pelas companhias aéreas para várias opções de viagem
  • 78% disseram que as viagens aéreas têm uma boa relação custo-benefício.
  • 74% disseram que se sentem bem-informados sobre os produtos/serviços que estão comprando das companhias aéreas

Cenário nos EUA

Nos EUA, a cobrança de rendas extras nas passagens também tem gerado incômodo. Um relatório da Subcomissão Permanente de Investigações do Senado norte-americano apontou que as empresas aéreas do país têm usado cada vez mais taxas auxiliares, também chamadas de "porcaria", para aumentar suas receitas.

Grande parte da crítica vem do fato de que houve uma espécie de "desagrupamento", ou seja, "cobrança separada por bens e serviços que antes eram incluídos no preço de uma passagem", indica o relatório do subcomitê.

O levantamento ainda demonstrou que empresas como Frontier e Spirit pagaram cerca de US$ 26 milhões (R$ 156 milhões) a agentes de aeroporto e outros funcionários entre os anos de 2022 e 2023 para que eles pegassem passageiros que supostamente não seguiam as políticas de bagagem da companhia aérea. Com isso, eles acabavam muitas vezes forçando esses passageiros a desembolsarem uma taxa extra pela bagagem ou correrem o risco de perder o voo.

Em uma das empresas, cada agente poderia ganhar até US$ 10 (R$ 60) por cada mala que um passageiro tivesse de despachar no portão, aponta o relatório.

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O levantamento ainda revela que, entre 2018 e 2023, American Airlines, Delta Air Lines, United Airlines, Frontier e Spirit ganharam juntas US$ 12,4 bilhões (R$ 74,5 bilhões) com essas cobranças adicionais.

Nesta semana, os líderes dessas empresas aéreas foram prestaram esclarecimentos no Senado dos EUA sobre as cobranças. Após serem ouvidos, o subcomitê responsável pela investigação irá analisar os próximos passos a serem tomados.

E no Brasil?

No Brasil, diversos projetos de lei tentam abordar questões polêmicas. Algumas propostas buscam:

  • Isentar pessoas com deficiência ou transtorno do espectro autista de taxas de bagagem despachada.
  • Regulamentar a cobrança por serviços auxiliares.
  • Tornar a marcação de assentos gratuita.

Um levantamento exclusivo que realizei em 2022 revelou que, nos cinco anos após a liberação da cobrança de bagagem, as empresas aéreas brasileiras faturaram cerca de R$ 3 bilhões apenas com essa prática.

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Outras rendas auxiliares que reforçam o caixa das companhias também incluem:

  • Transporte de carga e correspondências.
  • Taxas de não comparecimento e remarcação.
  • Serviço de bordo pago.

Em 2020, quase 22% do faturamento das empresas brasileiras vieram dessas rendas auxiliares, refletindo a importância crescente dessa estratégia.

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