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Lugar de mulher também é em investimentos arrojados

Marina está à procura de uma oportunidade profissional. Felipe também. Marina e Pedro têm qualificações similares, e decidem usar o LinkedIn para ajudar na busca.

Após algumas semanas de procura, Marina está levemente chateada: encontrou poucas vagas para as quais conseguiu aplicar, diante de suas qualificações. Afinal, Marina apenas se candidatava para uma vaga quando podia preencher 100% dos requisitos indicados para a posição, conforme o anúncio. Com tantos requisitos, Marina enviou seu currículo para apenas algumas vagas, e aguarda retorno.

Enquanto isso, Felipe se sente satisfeito em sua busca. Encontrou uma série de vagas para as quais se sentiu apto a aplicar, enviando currículos e preenchendo formulários para diferentes posições, empresas e áreas. Felipe tinha todas as qualificações para todas as vagas para as quais aplicou? Não! "Mas o que custa tentar, não é mesmo?", pensou ele em muitos dos casos. "Afinal, preencho por volta de 60% das exigências anunciadas. Deve ser o suficiente".

O relato acima não é real. Mas poderia ser, de acordo com um estudo publicado na Harvard Business Review. Os resultados indicam que mulheres sentem que precisam preencher 100% dos requisitos para aplicar para uma vaga de emprego, enquanto homens entendem que cumprir 60% das exigências é suficiente para se inscrever para a mesma posição.

Entre diversas explicações por trás dessa dinâmica no mercado de trabalho, incluindo fatores socioeconômicos enraizados no Brasil e no mundo, está uma crença limitante presente no comportamento de muitas mulheres. A crença é: acreditar que é preciso ser especialista em um assunto para participar, para dar o primeiro passo que seja.

Crer que o que você sabe não é suficiente impacta na busca por espaços, não somente em determinadas posições profissionais, mas também em papéis sociais ou mesmo na tomada de decisão sobre importantes temas para a própria vida — como a gestão financeira.

Não precisamos saber tudo para cuidar do nosso dinheiro, muito menos investir diferente

Na linha daquela pesquisa e de um relatório do LinkedIn sobre os gêneros no mercado de trabalho, a autopercepção de ausência de conhecimento suficiente para cuidar do próprio dinheiro está entre os principais motivos encontrados em uma série de pesquisas comportamentais que tentam explicar a baixa participação das mulheres no universo dos investimentos.

De fato, a participação feminina nos investimentos segue bastante aquém do esperado em um país onde mulheres representam 51,5% do total da população, e no qual quase metade das famílias são financeiramente chefiadas por mulheres. Para ilustrar, apesar de notáveis avanços recentes, seguimos ainda representando só 24,9% do total de investidores registrados na nossa bolsa (a B3), e 27% no Tesouro Direto — programa de investimentos em títulos públicos.

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Infelizmente, as desigualdades não param por aí. Além da baixa participação e da percepção de que não sabemos o suficiente para tomar as rédeas da nossa vida financeira, também investimos diferente. Tomamos menos riscos também pelo fato de sermos mulheres.

Quer ver? Usando um banco de dados com carteiras de investimento reais de mulheres ao redor do Brasil e um modelo matemático, uma pesquisa realizada por uma das autoras dessa coluna concluiu que mulheres são — de fato — mais avessas ao risco nos investimentos quando comparadas aos homens. E isso se provou verdade mesmo controlando por variáveis como idade, estado civil e salário declarado.

Em bom e velho português: considerando a mesma idade, estado civil, salário e outros critérios, uma mulher é mais avessa ao risco do que um homem? A resposta é sim.

Mas quanto mais avessas ao risco? Considerando clientes de perfil autodeclarado agressivo, por exemplo, a pesquisa apontou que ser mulher implica em uma redução da volatilidade observada na carteira de investimentos, em média, de 2,23 pontos percentuais. Esse aumento se compara a uma redução de 0,57 pontos percentuais na volatilidade observada a cada 10% de aumento no patrimônio líquido do cliente.

Ou seja, o mero fato de ser mulher influencia mais para que uma carteira tenha menor volatilidade do que o próprio montante investido.

Mas a realidade não precisa ser assim!

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Risco X retorno: use a volatilidade a seu favor

Pensar em correr mais riscos na hora de investir pode dar mesmo um frio na barriga, especialmente para mulheres. Afinal, a comprovada maior carga emocional, física e, muitas vezes, financeira que recai sobre nós, mulheres, tende a nos levar a decisões mais conservadoras.

Mas saiba que trazer ativos com mais volatilidade para a sua carteira de investimentos pode compensar no longo prazo.

Quando o assunto é investimento, volatilidade e risco são quase sinônimos: um investimento é considerado mais arriscado quando o valor dele oscila mais ao longo do tempo (ou seja, é mais volátil). Para quem gosta de conferir os investimentos todos os dias, ver o seu dinheiro variando com certeza traz alguma ansiedade — mas existem estratégias para trazer esses ganhos mais altos ao mesmo tempo que você protege seu patrimônio.

Abaixo, comparamos os rendimentos de duas pessoas fictícias que investiram R$ 10.000 em dezembro de 2013. A primeira, com carteira defensiva, investiu todo o seu dinheiro em um título que rende 100% do CDI; a segunda, mais arrojada, colocou um terço do seu dinheiro nesse mesmo título, um terço em títulos do Tesouro atrelados à inflação e um terço em ações brasileiras.

Em dezembro de 2023, a pessoa 1 teria R$ 24.172 (sem descontar taxas e impostos); a pessoa 2 teria R$ 28.630, ou 18% a mais no valor final. Em troca, a pessoa 2 passou por mais momentos de turbulência: se ela olhasse sua carteira no final de 2015, poderia ter se arrependido da abordagem mais arriscada, mas a estratégia mostrou seu valor no longo prazo.

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Ou seja, vimos que dá para usar a volatilidade a seu favor. Assim, aqui vão três dicas para você buscar mais retornos para os seus investimentos sem perder de vista o seu objetivo e seu perfil de investidora:

1. Entenda sua tolerância a risco

O mais importante é que você entenda bem o quanto você aceita ver de oscilação agora em troca de retornos mais altos para encontrar o tipo de investimento mais adequado. Pode ser que você goste de ver seu dinheiro sempre crescendo, sem passar por perdas no curto prazo — e tudo bem! Nesse caso, a carteira mais defensiva seria ideal para você.

2. Saiba quando você vai precisar desse dinheiro

Liquidez é em quanto tempo dinheiro que você resgatou de um investimento demora para cair na sua conta. O mais importante é casar o prazo (no caso dos investimentos em renda fixa levados até o vencimento) e a liquidez com o seu horizonte de investimento. Geralmente, quanto maior o tempo que você pode deixar seu dinheiro investido, mais risco você pode correr com ele — buscando os tais retornos mais altos no longo prazo.

Se estamos falando de uma reserva para imprevistos, é melhor ficar longe ativos super voláteis e focar naqueles que têm liquidez imediata; se você tem mais tempo para deixar o dinheiro rendendo, dá para correr mais risco. Aqui também é importante ficar atento a taxas em caso de resgate antecipado e saber o quão negociado é aquele ativo no mercado — vender um ativo na hora do desespero pode te levar a perder dinheiro desnecessariamente, por isso ter esses pontos bem mapeados e planejados sempre ajuda.

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3. Diversifique sempre!

Já vimos ali que a carteira Arrojada deu mais dinheiro que a Defensiva em 10 anos. Mas correr risco à toa também não é bom: o mesmo dinheiro investido só no Ibovespa, índice de ações brasileiras, teria menos retorno (R$ 26 mil) e mais volatilidade (23%!!). O segredo do sucesso foi a diversificação: com ela, diluímos a volatilidade das ações, nos resguardando de perdas muito altas ao investir em ativos com valorização constante, ao mesmo tempo que nos aproveitamos dos impulsos das épocas de bonança da Bolsa.

A mensagem principal aqui é: não há demérito em adotar uma estratégia mais defensiva ou mais arrojada, desde que você esteja consciente do que está deixando para trás ao escolher uma ou outra.

Com mais conhecimento, é possível construir uma carteira de investimentos perfeita para você e alinhada com seus sonhos e objetivos. O importante é dar o primeiro passo.

E lembre-se: para fazê-lo, você não precisa começar a preparar o seu doutorado em economia ou finanças. E sim acreditar que, de grão em grão, sua carteira certamente refletirá os frutos do esforço gradual e consistente de quem já conquistou tantos espaços que, até outro dia, "não eram lugar de mulher".

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Este material não é um relatório de análise, recomendação de investimento ou oferta de valor mobiliário. Este conteúdo é de responsabilidade do corpo jornalístico do UOL Economia, que possui liberdade editorial. Quaisquer opiniões de especialistas credenciados eventualmente utilizadas como amparo à matéria refletem exclusivamente as opiniões pessoais desses especialistas e foram elaboradas de forma independente do Universo Online S.A.. Este material tem objetivo informativo e não tem a finalidade de assegurar a existência de garantia de resultados futuros ou a isenção de riscos. Os produtos de investimentos mencionados podem não ser adequados para todos os perfis de investidores, sendo importante o preenchimento do questionário de suitability para identificação de produtos adequados ao seu perfil, bem como a consulta de especialistas de confiança antes de qualquer investimento. Rentabilidade passada não representa garantia de rentabilidade futura e não está isenta de tributação. A rentabilidade de produtos financeiros pode apresentar variações e seu preço pode aumentar ou diminuir, a depender de condições de mercado, podendo resultar em perdas. O Universo Online S.A. se exime de toda e qualquer responsabilidade por eventuais prejuízos que venham a decorrer da utilização deste material.

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