Qual é a diferença entre os poupadores e os investidores brasileiros
No começo de dezembro, os jornais de economia publicaram uma notícia histórica, ainda que ela não tenha recebido tanto destaque: pela primeira vez, o mercado de capitais superou a poupança na composição dos fundings que pagam a produção imobiliária do país. Segundo a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), enquanto o primeiro aumentou a sua participação de 24%, no fim de 2021, para 38%, no meio deste ano, com saldo total de R$ 787 bilhões, a poupança encolheu de 49% para 36% a sua fatia nesse mercado, com estoque de R$ 738 bilhões.
Até aqui, os novos edifícios e casas se multiplicavam Brasil afora majoritariamente com o dinheiro do poupador. Com o tempo, um novo personagem começou a aparecer na cena até dominá-la: o investidor.
A diferença dos verbos poupar e investir vai além do óbvio. Nesse caso, ela implica em uma mudança de mentalidade. Em um país com baixo nível de educação financeira como o Brasil, o número crescente de cidadãos comuns que passaram a investir no mercado de capitais é motivo de esperança não só para alguém como eu, que trabalha com operações estruturadas de crédito, mas para toda a sociedade.
É claro que a poupança perdeu competitividade. Hoje, é possível lucrar não apenas com a pujança da produção imobiliária, mas também com a força do agronegócio, com a expansão da estrutura logística brasileira e outras atividades econômicas dos setores que mais crescem no país. O mercado de recebíveis, securitizados em operações saudáveis e bem estruturadas, pode proporcionar ganhos muito superiores à poupança aos agora milhares de proprietários de cotas de FIIs e Fiagros.
E por que isso significa um avanço para a sociedade? Porque o investimento em fundos representa a expansão da economia brasileira, o financiamento de novos negócios e empreendimentos, como hotéis, parques, shoppings e escritórios. Implica também no aumento do número de postos de trabalho e da riqueza produzida por aqui. Dinheiro já foi algo para ser guardado em cofres e até dentro de colchão, mas a sua vocação sempre foi a de circular.
O Marco Legal da Securitização (Lei 14.430/22) abriu novas possibilidades de investimento e de captação de recursos para empresas. Ao Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) e os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), somaram-se todos os setores que trabalham com recebíveis, como educação, saúde e serviços, passaram a poder buscar dinheiro no mercado de capitais para expandir seus negócios.
A democratização do acesso ao crédito via mercado de capitais, ou seja, com o dinheiro do investidor, é uma missão pessoal que se estendeu à securitizadora na qual trabalho. É preciso tempo e disposição para atender a todos os empreendedores, não apenas dos grandes centros ou de empresas conhecidas, mas também aquele empresário modesto que planeja construir o único prédio ou o primeiro shopping da sua pequena e distante cidade. Em princípio, todo negócio pode produzir lucro aos investidores.
Sob esse prisma, o mercado de capitais poderia financiar tudo no país, da expansão da malha ferroviária à moradia popular, combatendo o déficit habitacional brasileiro, de 5,8 milhões de casas. Mas entre o sonho e a contabilidade, há muitos fatores importantes a serem observados. O crédito oferecido pelo mercado de capitais ainda não supera em competitividade ao ofertado a setores subsidiados, com linhas próprias de financiamento, como o agronegócio e a habitação de interesse social.
É preciso considerar também o know-how do mercado, que vai se desenvolvendo a cada nova operação. O setor imobiliário é bastante conhecido dos que trabalham em operações estruturadas de crédito. O agronegócio está começando agora e ouso em dizer que ainda estamos distantes do produtor rural. A maior parte dos CRAs são criados para grandes empresas. Neste ano, os recebíveis do agronegócio cresceram 40% apenas no primeiro semestre, segundo levantamento da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Para 2024, eu enxergo possibilidades seguras e rentáveis de investimento em setores como o mercado livre de energia, por exemplo, em franco crescimento no país. Cada vez mais consumidores, na maioria grandes empresas, passaram a comprar energia de companhias privadas que investem em fontes alternativas como eólica e solar. Segundo a Câmara Comercializadora de Energia Elétrica (CCEE), de janeiro a setembro deste ano, 3.300 consumidores migraram para o mercado livre, aumento de 52%.
Ajudar investidores a lucrar com a expansão desse setor é o desafio que se apresenta, assim como o de diversas outras áreas. Porque melhor do que desejar um feliz 2024, é trabalhar duro para que assim o seja.
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