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Reforma da Previdência: 10 perguntas e respostas sobre as mudanças que afetarão sua aposentadoria

Mariana Schreiber - Da BBC Brasil em Brasília

Da BBC Brasil em Brasília

09/07/2019 06h22

O texto foi atualizado às 15h02 de 12 de julho de 2019.

Após mais de quatro meses de análise da Reforma da Previdência, a Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira em primeiro turno o texto base da proposta, que prevê que a maioria dos brasileiros terá que se aposentar mais tarde e, provavelmente, com benefícios menores que hoje. O placar foi amplamente favorável, com 379 votos a 131.

No entanto, desde quinta os deputados analisam destaques que podem provocar mudanças importantes no texto principal, reduzindo o impacto da reforma. Nesta madrugada, por exemplo, a Câmara barrou, por placar ainda mais amplo, a tentativa do governo de elevar o tempo mínimo de contribuição necessário para trabalhadores do setor privado poderem se aposentar, de 15 para 20 anos.

Por ser uma tentativa de alteração da Constituição (PEC), ainda será preciso depois votar em segundo turno a proposta, antes de encaminhar a reforma para o Senado. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já admite que esta segunda etapa só deve ser concluída pelos deputados em agosto.

Entenda abaixo em dez pontos por que o governo quer que o brasileiro se aposente mais tarde, o que pode mudar na sua vida, e quais as próximas etapas de andamento da proposta.

1) Por que o governo quer fazer a reforma?

O governo considera fundamental fazer a Reforma da Previdência para equilibrar as contas públicas e liberar recursos que hoje vão para a aposentadoria para investimentos em outras áreas, como educação, saúde e segurança pública.

Desde 2014, o governo federal apresenta deficits bilionários nas suas contas, refletindo o crescimento das despesas em ritmo mais acelerados que a expansão das receitas. No ano passado, por exemplo, o rombo foi de R$ 120 bilhões.

Esse aumento das despesas tem sido puxado, em especial, pelos gastos com Previdência. O rombo da União com aposentadorias e pensões de servidores civis, militares e setor privado (INSS) tem crescido rapidamente nos últimos anos e somou R$ 266 bilhões no ano passado, segundo o ministério da Economia.

O aumento reflete o envelhecimento da população, já que a expectativa de vida do brasileiro aumentou nas últimas décadas, ao mesmo tempo que a taxa da natalidade (número de nascimentos a cada mil habitantes) está em queda. Por causa disso, a proporção de brasileiros com mais de 65 anos passou de 5,6% no ano 2000 para 8,4% em 2015, segundo o IBGE. No mesmo período, a proporção de brasileiros com até 14 anos caiu de 30% para 22,3%.

Como o sistema de aposentadoria brasileiro é de repartição (os mais jovens contribuem para pagar o benefício de quem já se aposentou), esse envelhecimento da população está causando um desequilíbrio entre receitas e despesas. Dessa forma, o governo quer mudar as regras de aposentadoria para que o brasileiro se aposente mais tarde e receba benefícios menores.

2) Quanto o governo vai economizar?

A meta do ministro da Economia, Paulo Guedes, era ter uma reforma que gerasse economia de ao menos R$ 1 trilhão para o governo federal em dez anos. No entanto, após as mudanças feitas na Câmara até agora, essa economia deve cair.

A Instituição Fiscal Independente projeta que o texto base aprovado gera uma economia de R$ 744 bilhões, enquanto o relator da reforma na Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) previa R$ 987,5 bilhão para o mesmo período.

Esse valores representam o saldo entre corte de despesas com aposentadorias e aumento de receitas com aumento das contribuições dos trabalhadores, além de elevação de um imposto sobre lucro de bancos (CSLL), cuja alíquota subiria de 15% para 20%.

Caso a economia fique mesmo reduzido, alguns parlamentares e economistas já reconhecem que talvez seja preciso outra reforma daqui a alguns anos.

A economia esperada representa o saldo entre corte de despesas com aposentadorias e aumento de receitas com aumento das contribuições dos trabalhadores, além de elevação de um imposto sobre lucro de bancos (CSLL), cuja alíquota subiria de 15% para 20%.

Caso os ganhos com a reforma fique mesmo reduzido, alguns parlamentares e economistas já reconhecem que talvez seja preciso outra reforma daqui a alguns anos.

3) As regras serão as mesmas para todo mundo?

Não. Embora a Reforma da Previdência proposta pelo governo Bolsonaro seja ampla e tenha impacto sobre a grande maioria dos brasileiros, algumas categorias continuarão tendo regras diferenciadas, como professores, policiais federais e agentes penitenciários.

Os integrantes das Forças Armadas também terão um sistema diferente, mas ele está sendo tratado em um projeto de lei separado - ou seja, a aprovação dessa PEC não muda nada para eles.

4) Que categorias não sofrerão mudanças?

A proposta em votação na Câmara deixou de fora da reforma servidores estaduais e municipais, o que joga para governadores e prefeitos o ônus de articular nas assembleias estaduais e municipais a alteração dos regimes de aposentadoria dos seus Estados e municípios.

A líder do governo no Congresso Nacional, deputada Joice Hasselmann, reconheceu na segunda-feira ser improvável que isso seja incluído no plenário da Câmara. "Eu acho que a chance não é grande", disse ao chegar para uma reunião com Maia e líderes partidários na residência oficial da presidência da Câmara.

Outra possibilidade é governadores tentarem mudar esse ponto no Senado, para onde o texto segue caso seja aprovado em dois turnos pelos deputados.

Além disso, a Câmara já rejeitou proposta do governo para alterações da aposentadoria rural. Dessa forma, continuarão em vigor as normas atuais que permitem aposentadoria para mulheres aos 55 anos e para homens, aos 60, desde que comprovados ao menos 15 anos de trabalho no campo.

Foi barrada ainda a tentativa de mudar o benefício de um salário mínimo para idosos em situação de pobreza. O BPC (Benefício de Prestação Continuada) continuará sendo concedido a pessoas com 65 anos ou mais que possuem renda de até um quarto de salário mínimo.

5) Com quantos anos as pessoas poderão se aposentar?

Uma mudança importante que atingirá a maior parte da população é a criação de idades mínimas para aposentadoria. A proposta prevê que a maioria dos trabalhadores do Brasil, tanto na iniciativa privada como no serviço público federal, precisará trabalhar até 62 anos, caso mulher, e até 65 anos, caso homem.

Por enquanto, no INSS, vigora um regime misto em que é possível se aposentar por idade (a partir de 60 anos para mulheres e a partir de 65 anos para homens) ou por tempo de contribuição (ao menos 15 anos).

Já no serviço público federal, hoje, em geral, são exigidos 60 anos de idade e 35 anos de contribuição para homens e 55 anos de idade e 30 anos de contribuição para mulheres.

Ou seja, caso a reforma seja aprovada, todos terão que se submeter à regra da idade mínima, mudança que atinge principalmente pessoas de maior renda, já que os mais pobres, em geral, não conseguem contribuir por períodos longos e já se aposentam por idade.

Outra mudança, porém, afetará os homens de menor renda. A reforma prevê que o tempo mínimo de contribuição exigido deles no INSS suba de 15 para 20 anos. A comissão especial rejeitou essa mudança para as mulheres porque elas, em geral, têm ainda mais dificuldade de contribuir por um período longo devido à interrupção da vida profissional para ter filhos e à sobrecarga de tarefas domésticas.

A reforma original previa que o tempo mínimo de contribuição exigido no INSS subiria de 15 para 20 anos, o que afetaria principalmente trabalhadores de menor renda e escolaridade, que costumam alternar períodos de trabalho com caretira assinada com períodos desempregados e na informalidade.

A comissão especial rejeitou essa mudança para ambos os sexos, levando em conta também que as mulheres, em geral, têm ainda mais dificuldade de contribuir por um período longo devido à interrupção da vida profissional para ter filhos e à sobrecarga de tarefas domésticas.

6) Qual a diferença para professores, policiais federais e militares?

O texto base prevê que professoras poderão se aposentar com 57 anos e professores, com 60 - a regra será a mesma para rede pública e privada. Um destaque a ser analisado nesta sexta pode reduzir mais esse patamar.

Hoje, não há idade mínima na rede privada, mas é exigido tempo mínimo de contribuição. No setor público, a idade mínima nas regras atuais são 50 anos (mulheres) e 55 (homens).

No caso policiais federais, policiais civis do Distrito Federal e agentes penitenciários e socioeducativos federais já foi aprovado um destaque suvizando suas regras de aposentadoria.

O texto agora prevê que essas categorias terão idade mínima 52 anos para mulher e de 53 anos para homem, com ao menos 25 anos de contribuição para elas e 30 anos para eles. Para se aposentar com essa idade menor, porém, será preciso pagar pedágio de 100% do tempo que faltaria para se aposentar nas regras atuais. Atualmente, é exigido apenas o tempo de contribuição. Já os que ingressarem após a reforma terão regras unificadas para ambos os sexos, com idade mínima de 55 anos e ao menos 30 anos de contribuição. Caso a reforma passe no Congresso, professoras poderão se aposentar com 57 anos e professores, com 60 - a regra será a mesma para rede pública e privada.

Hoje, não há idade mínima na rede privada, mas é exigido tempo mínimo de contribuição. No setor público, a idade mínima nas regras atuais são 50 anos (mulheres) e 55 (homens).

O texto base prevê que os policiais federais e os agentes penitenciários e socioeducativos da União terão regras unificadas para ambos os sexos, com idade mínima de 55 anos e ao menos 30 anos de contribuição. Atualmente, é exigido apenas o tempo de contribuição. No entanto, parlamentares ainda tenta, alterar o texto para reduzir a idade mínima para 52 anos, no caso das mulheres, e 53, no caso dos homens.

Outro ponto importanete é que hoje essas categorias de segurança pública brigam na Justiça para manter o direito à integralidade (direito a se aposentar com o valor do último salário) e à paridade (continuar ganhando na aposentadoria os reajustos concedidos ao funcionários ativos) - benefícios que já foram retirados da maioria dos servidores públicos a partir de 2004.

O texto mantém a brecha para essa reivindicação, enquanto a Advocacia Geral da União, órgão que defende os interesses da União na Justiça, deve rever a posição contrária a esses benefícios para essas categorias que vinha adotando antes da eleição do presidente Jair Bolsonaro.

Já no caso das Forças Armadas, o governo tenta mudar o regime de aposentadoria por meio de um projeto de lei. Ele prevê que o tempo mínimo de serviço para ingressar na reserva passará de 30 anos para 35 anos.

A proposta também preserva os benefícios de paridade e integralidade, no que é apontado como um grande privilégio que está sendo mantido para a carreira militar. As Forças Armadas justificam essa diferença dizendo que os militares não se aposentam, mas passam para a reserva, podendo ser convocados. Na prática, porém, um percentual mínimo volta a trabalhar após sair da ativa.

7) Como ficará o valor dos benefícios para os civis?

Enquanto mantém benefícios integrais aos militares, a reforma prevê regras que devem reduzir o valor das aposentadorias dos civis.

A proposta é que o trabalhador do INSS que atingir o tempo mínimo de contribuição (20 anos para homem e 15 anos para mulher) terá direito a apenas 60% da média dos seus salários como aposentadoria. A partir do 21º ano, a cada ano extra de contribuição, a taxa subiria em dois pontos percentuais, de modo que só será possível se aposentar com 100% da média da remuneração ao longo da vida após 40 anos de contribuição. Vale destacar que esse valor fica sempre limitado ao teto do INSS, atualmente em R$ 5.800.

No serviço público, as regras variam por causa de reformas da previdência adotadas em 2003 (que acabou com a integralidade para os novos contratos) e 2013 (que instituiu o teto do INSS para os novos contratados ).

A exigência de 40 anos para ter 100% do benefício valerá para o servidor público de ambos os sexos contratado após 2013, com valor limitado ao teto do INSS. Os que entraram no serviço público de 2004 a 2013 terão que trabalhar 40 anos para ter acesso a 100% da média dos salários ao longo da vida (não mais a média dos 80% maiores), não estando submetidos ao teto de R$ 5,8 mil.

Já os servidores civis que ingressaram antes de 2003 continuarão tendo direito à integralidade e paridade, mas terão que trabalhar um pouco mais. A Câmara suavizou as mudanças propostas pelo governo. Pelo texto atual da reforma, os que entraram até 2003 poderão se aposentar com valor integral caso atinjam 57 anos (mulheres) ou 60 anos (homens), desde que paguem um pedágio de 100% do tempo que faltava para tingir o tempo mínimo de contribuição exigido hoje. Dessa forma, o servidor que está a dois anos de aposentar-se com benefício integral terá de trabalhar mais dois anos, totalizando quatro anos, para ter direito ao benefício com integralidade e paridade.

8) Vai ter período de transição?

Para aqueles que já estão trabalhando, a reforma prevê alguns sistemas de transição para trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos, que poderão escolher a opção que lhes for mais favorável.

Um deles, por exemplo, oferece um esquema de pontos, que soma o tempo de contribuição e a idade. Inicialmente, mulheres terão que somar 86 pontos e homens, 96. A transição prevê um aumento de 1 ponto a cada ano, chegando a 100 para mulheres e 105 para os homens.

Há também previsão de sistemas de pedágio. Um deles prevê que os trabalhadores e servidores que estiverem a mais de dois anos da aposentadoria poderão se aposentar caso tenham ao menos 57 anos (mulheres) e 60 anos (homens) de idade e cumpram um pedágio de 100% sobre o tempo restante para atingir o tempo mínimo de contribuição. Dessa forma, se faltarem dois anos, os trabalhadores terá que cumprir quatro.

Caso falte até dois anos para atingir o tempo mínimo de contribuição exigido hoje, o trabalhador poderá se aposentar sem atingir a nova regra de idade mínima cumprindo um pedágio de 50% sobre o tempo restante. Ou seja, para quem faltar dois anos, terá que contribuir por três. Essa alternativa não está disponível aos servidores.

9) Como ficam as contribuições?

No setor privado, a proposta é tornar as alíquotas um pouco mais progressivas, cobrando menos de quem ganha menos e mais de quem ganha mais. Hoje variam de 8% a 11% no INSS. Com a reforma, iriam de 7,5% a 14% (alíquota máxima efetiva de 11,69%). A proposta reduz levemente a cobrança da maioria dos trabalhadores que ganham até R$ 2 mil.

Já cobrança sobre os servidores vai aumentar, caso a reforma entre em vigor. Atualmente, o funcionário público federal paga 11% sobre todo o salário, caso tenha tomado posse antes de 2013. Quem ingressou no serviço público depois de 2013 paga 11% até o teto do INSS, ou seja, não contribui sobre o valor que supera R$ 5,8 mil.

Pelas novas regras, as alíquotas para os que ingressaram antes de 2013 serão proporcionais à remuneração, variando de 7,5% para o servidor que recebe salário mínimo a 22% para quem recebe R$ 39 mil ou mais.

Como a cobrança é gradativa sobre o salário, porém, a alíquota máxima efetiva ficaria em 16,78% - ou seja, o servidor com salário de 39 mil pagaria R$ 6.544 ao mês em vez de R$ 4.290 como hoje.

No caso dos militares, o projeto de lei enviado ao Congresso prevê que a alíquota subirá de 7,5% para 10,5%, independentemente da faixa salarial.

10) Quantas etapas ainda faltam para que a reforma saia do papel?

Propostas de alteração da Constituição têm um trâmite mais demorado e exigente que outras proposições legislativas. O texto entra em vigor apenas se for aprovado de forma idêntica por Câmara e Senado.

Primeiro, a PEC precisa do aval da Câmara em dois turnos, por ao manos 308 dos 513 deputados, ou seja, três quintos da Casa. O intervalo entre as duas votações é de cinco sessões (cinco dias úteis), mas pode ser reduzido com apoio da maioria simples dos deputados.

Caso o texto seja aprovado pelos deputados, seguirá para análise dos senadores. No Senado, a proposta passa primeiro pela análise da Comissão de Constituição e Justiça. Depois, será também apreciada no plenário, onde sua aprovação depende de 49 votos, dos 81 senadores, em dois turnos.

Caso haja mudanças, a parte alterada terá que retornar à Câmara para nova análise. Caso o Senado aprove parte do texto com teor idêntico ao aprovado na primeira análise dos deputados, essa parte poderá entrar em vigor enquanto o restante passar por nova votação na Câmara.


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