Aumento no preço dos combustíveis: 5 perguntas para entender o cenário no Brasil
Um levantamento feito pelo Google apontou para um aumento repentino das buscas por questões relacionados à subida no preço dos combustíveis no Brasil.
Segundo a pesquisa elaborada por meio da ferramenta Google Trends, os brasileiros estão curiosos para entender o porquê do aumento no valor do litro da gasolina na última semana. Os internautas também procuram por explicações para a diferença entre os preços do combustível no Brasil e em outros países.
O levantamento observou a disparada nas buscas por versões da pergunta com os termos "por que" + "gasolina" entre 9 e 15 de março, algumas delas com crescimento de até 5 mil por cento em relação ao período anterior.
A BBC News Brasil consultou especialistas para ajudar a responder as principais questões dos brasileiros sobre o preço dos combustíveis.
1. Por que a gasolina está tão cara?
O aumento no preço ocorre em decorrência da implementação do reajuste de 18,8% no preço da gasolina comum cobrado nas refinarias anunciado pela Petrobras em 10 de março. A empresa reajustou ainda o preço do óleo diesel em 24,9% e do Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), o gás de cozinha, em 16%.
Na gasolina, economistas estimam que o combustível vendido pela estatal representa cerca de 33% do preço, então a alta de quase 19% nas refinarias deve resultar em aumento de 6,2% na bomba. Em muitos postos de combustível em algumas regiões do país, a gasolina já está sendo vendida acima dos R$ 7 por litro.
O reajuste da Petrobras ocorreu após 57 dias de preços congelados e em meio ao salto da cotação de petróleo no exterior.
"A gasolina é um derivado de petróleo, então seu preço está diretamente ligado ao da commodity. Se o preço do petróleo sobe, o da gasolina também sobe", explica Pedro Rodrigues, sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
Há pouco mais de uma semana, o preço do petróleo Brent saltou para acima de US$ 139 por barril. Desde então houve uma rápida reversão e na terça-feira (15/03), o barril chegou a US$ 98 - mas especialistas apontam que a volatilidade do mercado pode reverter a tendência nos próximos dias.
Segundo Pedro Rodrigues, a alta das últimas semanas foi impulsionada principalmente pelas instabilidades causadas pelo conflito entre Ucrânia e Rússia, mas também tem uma pequena influência da pandemia de Covid-19.
"A indústria do petróleo é muito volátil porque está sujeita a diversos fatores que envolvem riscos, problemas políticos e geopolíticos e às vezes problemas da própria indústria", diz.
O especialista explica que a pandemia provocou uma situação de queda brutal da demanda por petróleo e acabou contribuindo para a cotação negativa do barril no ápice da crise. Mas, com a volta à normalidade, a oferta de petróleo não acompanhou a demanda, gerando uma tendência de alta de preços.
"Mas a cereja do bolo atualmente é um fator externo à indústria que é a guerra na Ucrânia", diz.
A alta do petróleo por causa do conflito chega ao Brasil por dois motivos: a Petrobras importa petróleo e derivados e repassa reajustes por conta da política de Preço de Paridade de Importação, adotada em 2016.
O barril ficou mais caro como resultado da guerra e medidas como as sanções dos Estados Unidos e da União Europeia contra o petróleo e o gás exportados pela Rússia. As sanções tendem a reduzir a quantidade desses produtos no mercado internacional e a aumentar preços.
"Como estamos falando da Rússia, segundo maior exportador de petróleo do mundo, e da Ucrânia, um país que tem uma importância logística para que o petróleo e gás russo chegue na Europa, o conflito envolve ainda mais riscos para a indústria do petróleo", diz Rodrigues.
O Brasil produz mais petróleo do que consome e se declara "autossuficiente". Porém, devido ao tipo de petróleo extraído e a insuficiência na capacidade de refino, ainda precisa importar tanto petróleo cru quanto derivados como a gasolina. Isso faz com que a Petrobras sinta imediatamente o efeito de qualquer mudança no valor que paga pelo petróleo no exterior.
A cotação do dólar também tem impacto imediato. "Aqui no Brasil, em especial, também temos um outro fator que corrobora com o preço da gasolina: o câmbio. O barril do petróleo é cotado no mercado internacional em dólares e, toda vez que o real está desvalorizado, também sofremos aumento nos preços dos combustíveis", explica o sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura.
2. Por que o etanol aumenta junto com a gasolina?
Segundo os especialistas consultados pela BBC News Brasil, o aumento do preço do etanol acompanha o da gasolina por conta da ampliação da demanda pelo produto.
O etanol é um substituto direto da gasolina para muitos brasileiros, pois no país mais de 70% da frota de automóveis em circulação é composta por veículos flex. Dessa forma, quando o consumidor se depara com o aumento do litro da gasolina, muitas vezes acaba optando por abastecer com o etanol.
Segundo Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), a formação do preço do etanol para o produtor está diretamente relacionada ao mercado, ou seja, a oferta e demanda das distribuidoras. "Assim, quem regula esse mercado é o consumidor", explica.
"Se o preço da gasolina se mantém alto por muito tempo aumenta a demanda pelo etanol. Mas a oferta do produto é limitada, o que reflete na subida dos preços", complementa Pedro Rodrigues.
O caminho inverso também é verdadeiro. Quando o etanol perde competitividade, o consumidor migra para a gasolina, o que resulta em oferta de biocombustível maior do que a demanda, levando a uma redução dos valores pagos aos produtores.
"Depois de um ciclo de baixa demanda no Ciclo Otto, que vinha desde novembro, a demanda por etanol apresentou um leve incremento nas últimas semanas. Dessa forma, mesmo com estoques suficientes para atender a demanda, há uma autorregulação do mercado, resultando em aumento no valor pago aos produtores", diz Antonio de Pádua Rodrigues.
3. Por que os postos de gasolina estão cheios?
Assim que a Petrobras anunciou o reajuste nos preços, motoristas correram para as bombas para abastecer seus carros antes que os preços mudassem.
Isso fez com que os postos ficassem lotados na quinta-feira (10/03). Foram registradas filas em diversas cidades do Brasil.
"Há um fator cultural importante aqui: as pessoas correm para comprar um produto quando há qualquer risco de escassez", diz Pedro Rodrigues, do CBIE. "Mas não creio que há risco de desabastecimento da gasolina neste momento, justamente porque a Petrobras reajustou os preços de acordo com os praticados no mercado internacional".
O especialista afirma ainda que o consumidor no Brasil é muito sensível a qualquer aumento ou diminuição do preço da gasolina ou diesel. "Aumento de gasolina ganha espaço em primeira página de jornal e causa problema para o presidente de República. Gera uma reação da população na hora", afirma.
4. Por que gasolina é cara no Brasil?
Segundo a consultoria Global Petrol Prices, o Brasil ocupa a 89ª posição em um ranking de 170 países em relação ao preço da gasolina. De acordo com o levantamento, elaborado em 14 de março, o litro do combustível é vendido por aqui por, em média, a US$ 1,31 (R$ 6,60).
A conclusão é que o país fica no meio da tabela, atrás dos Estados Unidos (R$ 6,36) e de nações vizinhas como Colômbia (R$ 3,21) e Equador (R$ 3,46). A gasolina mais barata do mundo está na Venezuela (R$ 0,13 por litro) e a mais cara em Hong Kong (R$ 14,77).
Segundo a Global Petrol Prices, as diferenças de preços entre os países devem-se aos vários impostos e subsídios à gasolina. "Todos os países têm acesso aos mesmos preços do petróleo nos mercados internacionais, mas decidem impor impostos diferentes", diz a consultoria em seu site.
Para Pedro Rodrigues, o preço mais alto da gasolina no Brasil quando comparado ao de outras nações tem relação justamente com os tributos.
"O Brasil fez uma escolha, assim a gasolina é mais cara do que em outros países porque tem uma tributação mais alta. Mas no momento ela está mais cara não só por causa dos impostos, mas porque o petróleo está caro e o câmbio também", diz.
O especialista ainda compara a situação do Brasil com a de outras nações, como os EUA e a Suécia, que ocupa a posição 155 da lista da Global Petrol Prices e vende sua gasolina a uma média de US$ 2,17 (R$ 10,90).
"Na Suécia, um dos fatores para o preço alto da gasolina é uma decisão do governo de desencorajar o uso do carro e incentivar transportes públicos e bicicleta. Já nos Estados Unidos é o oposto", diz. "Aqui no Brasil ainda temos que entender onde nos encaixamos nessa realidade".
5. Por que a gasolina na Argentina é mais barata?
Também influenciada pelo conflito na Ucrânia, a estatal argentina YPF anunciou, na segunda-feira (14/03), um aumento no valor da gasolina, de 9,5%. Ainda assim, o valor do combustível nas bombas é bem menor do que o encontrado no Brasil.
Segundo a Global Petrol Prices, o litro da gasolina está sendo comercializado no país vizinho a uma média de US$ 0,97 (R$ 4,98).
O preço mais baixo fez com que brasileiros de cidades próximas à fronteira cruzassem para a Argentina para abastecer seus carros nos últimos dias.
Mais uma vez, a diferença no preço entre os países deve-se aos impostos e subsídios à gasolina. "A Argentina rotineiramente aplica uma política de intervenção no mercado, congelando os preços do combustível ", diz o especialista do Centro Brasileiro de Infraestrutura.
Entre maio de 2021 e fevereiro de 2022, o preço da gasolina no país esteva congelado pelo governo - ou seja, não acompanhou o mercado internacional. Políticas semelhantes já foram implantadas em outros momentos, o que ajuda a explicar a disparidade no valor do litro do combustível em relação ao Brasil.
Mas para Pedro Rodrigues, o congelamento dos preços ou o subsídio da gasolina - como acontece na Venezuela - nem sempre é vantajoso para as finanças do país e pode se tornar insustentável se mantido por muito tempo.
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