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Qual é o preço do Brexit para a economia?

AFP
Imagem: AFP

Hannah Fuchs (ca)

Da Deutsche Welle

22/10/2019 14h42

Incerteza de planejamento devido à indecisão em torno da saída do Reino Unido da União Europeia desagrada ao setor econômico. Como resultado, investimentos recuam, prejudicando tanto economia europeia quanto britânica. Até o momento não se sabe se em breve haverá um novo acordo sobre o Brexit.

"Embora o comportamento do Reino Unido seja extremamente irritante, do lado europeu cabe agora cerrar os dentes e não perder a paciência", comentou o presidente da Confederação do Comércio Exterior da Alemanha (BGA), Holger Bingmann, ao jornal alemão Rheinische Post, hoje.

Enquanto as voltas do carrossel do Brexit pouco a pouco deixam um ou outro tonto, a BGA pede paciência. Afinal, um Brexit caótico sem acordo seria a pior de todas as opções possíveis, segundo Bingmann. No momento, a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) está programada para 31 de outubro. Mas, para tal, a Câmara dos Comuns em Londres teria que dar sua anuência ao acordo renegociado com a UE.

No último sábado, contudo, o Parlamento britânico surpreendentemente não votou o acordo sobre o Brexit: os deputados aprovaram uma moção para adiar a votação. Assim, um Brexit desordenado no final de outubro, com todas suas turbulências econômicas, se torna um pouco menos provável.

Além disso, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, confirmou o recebimento do pedido britânico de adiar o prazo do Brexit para depois de 31 de outubro. Agora ele discutirá com os líderes da UE como reagir. Segundo um representante europeu, o pedido de adiamento não foi assinado pelo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson.

Após uma longa disputa com a UE, Johnson havia concordado alguns dias atrás com um acordo de saída modificado, o qual foi imediatamente aprovado pelos líderes do bloco europeu.

A questão de como a fronteira entre a República da Irlanda, país-membro da UE, e a Irlanda do Norte, pertencente ao Reino Unido, pode permanecer aberta mesmo após o Brexit foi novamente esclarecida. Além disso, numa declaração política, Johnson acordou com Bruxelas que, no longo prazo, haverá apenas um vínculo informal entre seu país e a UE.

Holger Bingmann alertou sobre danos adicionais à economia: "É inacreditável o que os britânicos impingem a seus parceiros europeus. As empresas de ambos os lados do Canal da Mancha ainda continuam boiando, ainda sem saber quando e como moldar seus processos comerciais e alfandegários no futuro."

Assim, os britânicos seguem deixando seus parceiros europeus à espera, desgastando ainda mais sua paciência: "Mais uma vez quem perde é a população, mas é claro também as empresas, porque isso prolonga o estado paralisante do limbo, com seus efeitos negativos na economia dos dois lados do Canal."

Depois da incerteza, a contenção

Um estudo recente do Instituto Alemão de Pesquisa Econômica (DIW) confirma essas consequências: "A incerteza contínua sobrecarrega a economia alemã", diz o maior grupo de pesquisa econômica da Alemanha. O resultado: contenção, especialmente nos investimentos.

Cálculos do DIW mostraram que, devido à incerteza desde a votação do Brexit, o crescimento econômico na Alemanha caiu em média 0,2 ponto percentual por ano, desde junho de 2016, em relação ao estimado sem a decisão do referendo. No total, as perdas de crescimento chegam a cerca de 0,8 ponto percentual, e tendem a se manter.

Isso não é nenhuma surpresa. O DIW já o previa em 2016: "É provável que os efeitos persistam além do curto prazo, já que as negociações para deixar a União Europeia provavelmente levarão vários anos", e assim se devia esperar uma menor dinâmica de investimentos e enfraquecimento do mercado de trabalho.

O DIW acrescentava que essas tendências também se fariam sentir na zona do euro: "Os efeitos comerciais deverão ter um papel importante; a demanda mais fraca do Reino Unido mitiga as exportações da zona do euro. A desvalorização da libra reforçará provavelmente esse declínio, à medida que as importações se tornam mais caras do ponto de vista britânico. A elevada insegurança na zona do euro deverá elevar os custos de financiamento e prejudicar adicionalmente a atividade de investimento", prognosticava o instituto de pesquisa.

A incerteza tem basicamente três dimensões, explica Ferdinand Fichtner, chefe do Departamento de Política Econômica da DIW em Berlim: "Não sabemos quando a saída vai ocorrer, mas tampouco sabemos sob que condições acontecerá, e mesmo se soubéssemos, seria difícil para as empresas, mas também para nós, pesquisadores econômicos, avaliar as reais consequências da nova relação entre a UE e o Reino Unido. Dessa forma, reina insegurança em numerosos aspectos."

O atual estado de coisas é: no caso de um Brexit sem acordo, nas relações comerciais bilaterais com a UE o Reino Unido retrocederia ao status de país terceiro. "Isso deverá acarretar restrições imediatas da liberdade de circulação no mercado de trabalho e da liberdade de movimentação de bens, serviços e capitais entre o Reino Unido e a UE", aponta o DIW. Acima de tudo, o prejudicado tráfego de mercadorias provavelmente afetará a economia alemã.

De acordo com os cálculos do DIW, no caso de um Brexit sem acordo no fim de outubro, as taxas de crescimento do PIB na Alemanha cairiam 0,4 ponto percentual em 2020 e 0,3 ponto percentual em 2021, em comparação a um Brexit regulamentado e com uma fase de transição. Porém um Brexit desordenado deverá afetar a economia alemã sobretudo em 2020. Esse efeito negativo deve diminuir gradualmente, do primeiro semestre de 2021 em diante.

Um "Brexit suave" reduziria à metade as perdas de receita para a Alemanha, como revelou um estudo da Fundação Bertelsmann: de cerca de 10 bilhões de euros por ano, na ausência de um acordo; para 5 bilhões de euros. Mas o próprio Reino Unido seria o principal beneficiado: um Brexit sem acordo poderá significar perdas anuais de receita de 57 bilhões de euros, contra 32 bilhões de euros, caso contrário.

Também há quem lucre

Por outro lado, certos países não europeus poderão se beneficiar do Brexit. Segundo o estudo da Bertelsmann, a receita dos Estados Unidos pode crescer 13 bilhões de euros por ano no caso de um Brexit sem acordo. Na China, a renda aumentaria 5 bilhões de euros por ano, enquanto na Rússia o acréscimo é calculado em cerca de 260 milhões de euros anuais.

"O Brexit afeta negativamente as cadeias de valor europeias, tornando o comércio na Europa mais caro e as relações econômicas com o resto do mundo mais atraentes", resume Dominic Ponattu, especialista em economia da Fundação Bertelsmann.

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Autor: Hannah Fuchs (ca)