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Sem chuvas, produtores perdem 40% do café em SP e MG, e preço deve subir

Produção de café em Ribeirão Corrente (SP) está comprometida por causa da estiagem - Arquivo pessoal
Produção de café em Ribeirão Corrente (SP) está comprometida por causa da estiagem Imagem: Arquivo pessoal

Felipe de Souza

Colaboração para o UOL, em Campinas (SP)

09/10/2020 17h14

Duas das regiões que mais produzem café no país, em São Paulo e Minas Gerais, estão enfrentando graves prejuízos por causa da estiagem e do calor. Segundo os produtores, é uma "questão de tempo" para que as perdas façam os preços subirem no Brasil, já que os produtores fornecem café ao país todo.

Mesmo se chover nos próximos dias, como esperado, o estrago já está feito, porque não há como recuperar a produção. O Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) prevê chuvas na próxima terça-feira nas duas regiões.

Perdas de quase 40%

A Alta Mogiana, na região de Franca (SP), e a Baixa Mogiana, no sul de Minas Gerais, acumulam perdas de quase 40% na safra que será comercializada no ano que vem.

A Alta Mogiana, região formada por 11 cidades ao redor de Ribeirão Preto (SP), no nordeste paulista, produz café da espécie arábica, com grãos mais finos, conhecidos como "café da bebida mole", abastecendo pouco mais da metade do Estado de São Paulo.

A região tem temperaturas mínimas médias de 21 ºC no verão e 17 ºC no inverno. Os produtores consideram as mínimas porque elas é que são importantes para o desenvolvimento considerado "correto" do grão. As chuvas anuais, na média, chegam a 1.623 mm (a estação chuvosa vai de outubro a abril).

Porém, o que os produtores viram esse ano foi bem diferente disso. A temperatura mínima média na região foi de 24 ºC no inverno deste ano, de acordo com os levantamentos regionais das associações e sindicatos rurais das cidades. As chuvas sumiram.

Sem chuva há 140 dias

Luciano Faleiros, cafeicultor de Ribeirão Corrente (SP), já perdeu 40% da produção - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Luciano Faleiros, cafeicultor de Ribeirão Corrente (SP), já perdeu 40% da produção
Imagem: Arquivo pessoal

Em Ribeirão Corrente (SP), por exemplo, não chove há 140 dias na fazenda Regina, de propriedade de Luciano Faleiros. A área plantada chega a 150 hectares.

Já perdi 40% da minha produção, que é contabilizada como a safra de 2021. A situação é complicada até para as lavouras irrigadas. Ainda não temos noção do que dá para salvar.
Luciano Faleiros, produtor de café de Ribeirão Corrente (SP)

O presidente do Sindicato Rural de Franca, José Henrique Mendonça, afirma que o déficit de chuva na região já ultrapassa os 270 mm, e isso causa efeitos diretos nas plantas. "Acontece o que a gente chama de 'não pegamento' da florada, que é quando o grão não se forma, ou vem defeituoso", conta.

Baixa Mogiana, em MG

Atravessando a divisa com Minas Gerais, a Baixa Mogiana, que corresponde a 209 cidades do sul e sudoeste mineiros, tem prejuízo parecido. Metade do café consumido no estado vem da região.

Fazenda em São Pedro da União (MG) já contabiliza perdas de 35% na produção de café - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Fazenda em São Pedro da União (MG) já contabiliza perdas de 35% na produção de café
Imagem: Arquivo pessoal

O produtor Fernando Barbosa estima que a quebra da safra por causa do tempo seco prejudicou cerca de 35% da sua lavoura de 14 hectares em São Pedro da União (MG), próxima a Guaxupé.

Não chove há cem dias na região, e o cafeicultor começa a contabilizar as perdas.

As lavouras novas são as que mais sofrem por causa da falta de chuva. Elas estão menos desenvolvidas e precisam de mais água para poder crescer.
Fernando Barbosa, cafeicultor de São Pedro da União (SP)

O produtor diz nunca ter visto uma situação tão crítica desde que a sua família começou a plantar café, na década de 1960.

Para Archimedes Coli Neto, presidente do Centro do Comércio de Café do Estado de Minas Gerais (CCCMG), "é difícil fazer uma previsão total das perdas na safra este ano, mas com certeza é uma situação que não víamos há muitos anos".

"Com certeza o preço vai subir"

Para o consumidor, o café moído já subiu 4,07% neste ano, e o solúvel, 5,11%, de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados hoje.

O aumento se soma ao de outros alimentos, que estão disparando e pesando no bolso, como o arroz, o feijão e o óleo de soja.

Mendonça diz que as perdas de agora só devem se refletir nos preços no ano que vem.

Não dá para estimarmos hoje qual será o aumento, mas com certeza isso vai acontecer. Pode até acontecer de faltar produto na prateleira.
José Henrique Mendonça, presidente do Sindicato Rural de Franca

A possibilidade existe porque a qualidade do grão que "sobreviver" à seca de 2020 pode estar comprometida. "É difícil para nós até sabermos hoje quais grãos vão vingar, por causa da estiagem. É fato que haverá uma perda de qualidade do grão", explica Faleiros.

Mendonça diz que os efeitos da seca podem ser duradouros, alcançando 2022, dado que, com as lavouras secas, as plantas do café morrem, afetando a safra colhida em 2021. "Aí os 40% de perdas podem se tornar maiores, colocando em risco toda a cadeia de produção", disse.

Na fazenda de Barbosa, em Minas, essa perspectiva já é considerada. "Acredito que não vou conseguir recuperar cerca de 30% das plantas que secaram por causa de 2020", lamenta o produtor.