Crise, juros: será mais difícil ter consignado ou financiar carro e casa?
Resumo da notícia
- Crise econômica da covid-19 é o maior obstáculo para crescimento do crédito em 2021, dizem economistas
- Mas alta da taxa básica de juros Selic também deve afetar oferta de empréstimos, afirmam especialistas
- Na piora do cenário, taxas de juros que vinham em queda podem voltar a subir para consumidor
Na semana passada, o Banco Central subiu a Selic (juros básicos da economia) de 2% para 2,75% ao ano. A primeira alta da taxa desde 2015 pode encarecer os empréstimos e afetar o crescimento do crédito para as pessoas neste ano, dizem economistas. Financiamento da casa própria, carro ou empréstimo consignado devem sofrer pouco. Mas crédito pessoal e compras parceladas podem sentir mais.
A grave piora da crise de saúde provocada pelo avanço da covid-19 já levou muitas das principais cidades do país a parar a economia. Esse ainda é o maior obstáculo para que os bancos aumentem a carteira de crédito para as famílias, segundo especialistas. Mas o aumento dos juros pode agravar a situação e interromper a queda das taxas dos empréstimos para as pessoas físicas, que vinha ocorrendo em 2020.
Segundo os bancos, a crise econômica provocada pela pandemia trava a economia. E isso por si só já diminui o espaço para o aumento dos empréstimos este ano. Mesmo que os bancos tenham dinheiro e vontade de emprestar, o crédito não cresce por falta de procura.
Veja abaixo a evolução da carteira de crédito para pessoas físicas em algumas modalidades de operações, considerando o saldo e os juros cobrados:
Juros em alta no meio da crise
Mas é nesse ambiente já negativo que a taxa básica de juros foi elevada de 2% para 2,75% no último encontro do Copom (Comitê de Política Monetária). O Banco Central já avisou que deve subir a taxa novamente em maio, para 3,5%. E o mercado projeta que a Selic vai a 6% dentro de um ano.
Para o doutor em finanças pela University of Washington, Rafael Schiozer, a alta da Selic em meio ao agravamento da crise econômica pode levar os bancos a serem mais seletivos na hora de conceder novos empréstimos ou renovar financiamentos.
A pandemia piorou muito em março, o que aumenta o risco de crédito por causa do impacto na economia. A Selic subir até era esperado, mas agora ficou claro que essa alta vem e que será forte. São dois fatores que andam juntos e que devem impactar a concessão de crédito neste ano. Por isso, não acho que a carteira de crédito deva crescer muito mais que a inflação em 2021.
Rafael Schiozer, professor titular de finanças da FGV-Eaesp
Empréstimos sem garantia vão sofrer mais
O superintendente de assessoria econômica da ABBC (Associação Brasileira de Bancos), Everton Gonçalves, afirma que as novas concessões de empréstimos já estão caindo. Em janeiro de 2020, atingiram R$ 184 bilhões, mas em janeiro de 2021 ficaram em R$ 165,6 bilhões.
O aumento da Selic terá impacto na oferta de crédito, mas será diferenciado dependendo da modalidade de empréstimo. Além disso, há outros componentes, como a tributação e a evolução da inadimplência, que deverão aumentar o custo do crédito para pessoas físicas. Na realidade, as concessões de crédito para pessoas físicas em termos dessazonalizados já estão se reduzindo, com o arrefecimento da atividade que tende a ser maior no segundo trimestre de 2021, pelo agravamento da crise sanitária.
Everton Gonçalves
Impacto depende do tipo de empréstimo
A alta da Selic vai atingir o crédito para as pessoas dependendo do tipo de empréstimo que o cliente esteja buscando, dizem economistas. Veja os impactos, segundo analistas:
- Empréstimos com garantias: Financiamento da casa própria, carro ou empréstimo consignado tendem a sofrer pouco impacto -seja na oferta de dinheiro ou nos juros.
- Empréstimos sem garantias: Crédito pessoal ou compras parceladas no comércio devem sofrer mais. Os bancos serão mais seletivos e devem aumentar os juros por causa das incertezas da economia e do aumento de devedores.
- Cartão de crédito e cheque especial: Esperam-se juros mais altos. Mas a oferta dessas duas modalidades está sendo reduzida pelos bancos desde que houve mudanças nas regras para limitar as cobranças, diz Schiozer, da FGV-Eaesp..
O saldo dos empréstimos no cheque especial caiu 24,4% nos 12 meses encerrados em janeiro, caindo a R$ 19,4 bilhões. No cartão, o total recuou 14,6%, a R$ 35,9 bilhões, no mesmo período.
Para comparar, a carteira de crédito pessoal aumentou 13,2% em 12 meses, para R$ 592,2 bilhões; a carteira de financiamento de veículos cresceu 7,3%, para R$ 222 bilhões; e o financiamento imobiliário avançou 12,1% para R$ 717,7 bilhões.
Juros são tão altos, que Selic não faz diferença
O economista especialista no setor bancário Roberto Troster, consultor de órgãos internacionais como Banco Mundial e FMI, diz que a crise da pandemia é o fator principal para limitar o crédito, e não a alta da Selic.
Mas isso porque os juros finais cobrados dos consumidores ainda são muito maiores que a Selic. Os juros do cartão de crédito passam de 320%, enquanto a Selic está em 2,75% ao ano..
A pandemia não vai acabar tão cedo. Temos hoje 62 milhões de CPFs com mais de uma conta em atraso. Com a piora da crise, isso é uma bola de neve. Já a alta da Selic já estava na conta. Além disso, considerando os juros na ponta [cobrados do cliente/, uma Selic subindo de 2% para 6% tem impacto marginal.
Roberto Troster, sócio diretor da Troster e Associados.
O que dizem os bancos
Os bancos projetam um crescimento de 7,3% na carteira total de crédito neste ano, para R$ 4,1 trilhões, segundo pesquisa da Febraban (Federação Brasileira de Bancos) com seus associados, em um movimento puxado pelos empréstimos totais às pessoas físicas, que poderia crescer 10% na visão das instituições financeiras.
Mas quando essa pesquisa foi feita, no começo de fevereiro, o país ainda não tinha sido atingido pela segunda onda da covid-19. E a alta da Selic projetada pelos bancos para este ano seria mais leve, indo até 3,75%. Mas agora o mercado já vê a Selic subindo ainda mais.
O diretor de economia, regulação prudencial e riscos da Febraban, Rubens Sardenberg, disse que a alta da Selic já estava no radar e não é esse o fator que pode atrapalhar ainda mais o crescimento do crédito para as pessoas físicas neste ano.
A pandemia está exigindo medidas adicionais de restrição à atividade econômica, o que vai ter impacto no crédito, com destaque, por exemplo, naquele relacionado ao consumo. A alta da Selic já estava nos cenários dos mercados. O que o Banco Central fez foi antecipar esse movimento.
Rubens Sardenberg
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