Ex-presidente da Petrobras diz que Bolsonaro quer agir como dono da estatal
O ex-presidente da Petrobras Roberto Castello Branco disse, em entrevista publicada hoje pelo jornal O Estado de S. Paulo, que o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), queria proceder como dono da empresa, "desobedecendo regras e regulações".
Castello Branco deixou a presidência da estatal no primeiro semestre deste ano após seguidas críticas de Bolsonaro, que resolveu indicar o general Joaquim Silva e Luna em fevereiro para sucedê-lo. Seu mandato terminaria em março.
Ao ser questionado se mantinha sua opinião favorável à privatização da empresa, Castello Branco afirmou que a postura do Governo e do presidente, sem citá-lo nominalmente, reforçaram sua posição. Não ficou claro se o ex-presidente da estatal estendia sua crítica a governos e presidentes anteriores.
No caso da Petrobras, o Estado brasileiro detém cerca de 37% do capital. A iniciativa privada, milhares e milhares de investidores privados, detém 63%. Mas o governo se acha o dono da Petrobras, o presidente da República diz que ele é o dono da empresa e quer proceder como tal, desobedecendo regras e regulações.
Roberto Castello Branco, ex-presidente da Petrobras, em entrevista ao Estadão
"Esta é uma confusão que políticos fazem, que o dono da Petrobras é o governo. Não, não é o governo. É o Estado brasileiro, a sociedade, somos todos nós. Por isso, não faz sentido tirar dinheiro da Petrobras para subsidiar o consumo de combustíveis por determinados grupos", completou.
Com discursos dúbios durante a crise com Castello Branco, Bolsonaro dizia que não tentava interferir na Petrobras com a troca de comando, ao mesmo tempo que aumentava a pressão. Porém, em maio deste ano, o presidente mudou o discurso, dizendo que era o presidente e era "para interferir mesmo", ao conversar sobre o tema com apoiadores.
Castello Branco ainda disse na entrevista que rejeitou pedidos políticos relacionados a gastos em publicidade e indicação de cargos durante seu mandato.
"Comuniquei não só aos meus diretores, mas ao conselho de administração. No fundo, essas coisas contribuíram para me desgastar junto ao governo, mas não me arrependo um milímetro do que fiz. Acredito que fiz a coisa certa, para proteger a integridade da companhia", disse.
Porém, o ápice do desgaste com Bolsonaro teve como pano de fundo o preço do combustível e a declaração dada por Castello Branco de que a ameaça de greve dos caminhoneiros em fevereiro não era problema da estatal. O presidente reagiu durante sua live semanal, dizendo que iria trocar o comando da Petrobras.
Na entrevista, Castello Branco disse que "as pressões se acumularam no primeiro trimestre de 2021", mas não foram atendidas pela companhia. Ele ainda disse que mostrou transparência em relação à política da Petrobras ao participar de comissões do Senado e da Câmara.
Acho que os parlamentares ficaram satisfeitos com as minhas exposições. Agora, o presidente tem os caminhoneiros autônomos como seus apoiadores. Então, ele defendia os interesses do grupo.
Home office e 'milícias digitais'
Na entrevista, Castello Branco defendeu a política de home office da empresa durante a pandemia do novo coronavírus, que foi alvo de críticas de Bolsonaro, inclusive com ironias relacionados ao fato de o presidente da estatal também ter trabalhado de casa.
"Só na Petrobras 20 mil pessoas ficaram em home office na pandemia, além de outras milhões de pessoas no Brasil e ao redor do mundo. Eu devo ser um mágico, então, porque a companhia na qual diziam que eu não trabalhava estava batendo recorde de produção, recorde de exportação, tendo uma performance excelente e conseguindo reduzir o endividamento na crise", disse.
Castello Branco ainda disse ter sido vítima das milícias digitais bolsonaristas durante o período de crise, o que agravou o desgaste. "Diziam que eu estava vendendo diesel para o Paraguai pela metade do preço. Era uma mentira clara. A Petrobras não vende diesel para o Paraguai desde 2017. Eu nem estava na companhia. E por que eu venderia diesel pela metade do preço? Qual seria o meu interesse nisso?", disse.
"Falavam também que eu teria nomeado como gerente executivo da Petrobras uma nora minha. Eu não tenho noras. Só tenho genros. Tenho duas filhas e duas enteadas", completou.
Neste cenário, Castello Branco conclui que deixou a Petrobras no momento certo. "Eu percebo que estava mesmo na hora de sair, porque, com o Brasil com tanta incerteza política, com tanta instabilidade, a presidência da Petrobras seria um lugar em que não me sentiria mais à vontade. Teria perdido o prazer de dirigir a companhia, coisa que tive durante o tempo em que fiquei lá. Se você perde o prazer de fazer uma coisa, não vai conseguir fazer bem", disse.
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