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PEC dos precatórios deixa sobra de pelo menos R$ 10 bi ainda sem destinação

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Imagem: iStock

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

04/11/2021 16h19

Além de abrir espaço no Orçamento para bancar o Auxílio Brasil de R$ 400 e cobrir outras despesas, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos precatórios deixa pelo menos R$ 10 bilhões sobrando, que o governo ainda não sabe como vai empregar. O cálculo é do Tesouro Nacional, mas economistas de fora do governo e a oposição citam cifras maiores.

A PEC aprovada na madrugada desta quinta-feira (4) na Câmara abre espaço fiscal de pelo menos R$ 91,6 bilhões para o governo em 2022. Os recursos ajudarão a bancar o Auxílio Brasil, o programa que substituirá o Bolsa Família, e despesas nas áreas de saúde e educação, entre outras. A proposta ainda precisa passar por mais uma votação na Câmara, antes de ir ao Senado.

Durante a tramitação no plenário da Câmara, o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na casa, afirmou que a PEC poderia gerar um espaço de R$ 20 bilhões para o "orçamento secreto" — as emendas de relator usadas para viabilizar a base de apoio ao governo Bolsonaro.

O economista Felipe Salto, diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado, calcula um espaço fiscal entre R$ 92 bilhões e R$ 95 bilhões, sendo que algo em torno de R$ 15 bilhões ainda não teria destinação. Este valor, lembra Salto, dependerá dos gastos com outras despesas, inclusive as obrigatórias.

Para onde vai o dinheiro?

Com base na PEC, o Tesouro Nacional estimou, na semana passada, como os recursos serão utilizados. Do total de R$ 91,6 bilhões, R$ 50 bilhões iriam para o pagamento do Auxílio Brasil. O programa já conta com R$ 34 bilhões de outras fontes.

Outros R$ 24 bilhões seriam gastos com o aumento do salário mínimo e dos benefícios previdenciários para repor perdas com a inflação.

Além disso, a PEC mantém, conforme o Tesouro, as vinculações de alguns grupos de despesas ao teto de gastos, o que faz com que parte do espaço já seja parcialmente consumido. Assim, haveria aumento de R$ 3,9 bilhões para a área de saúde, de R$ 1,8 bilhão para a área de educação e de R$ 300 milhões para emendas parlamentares individuais.

Pelas contas do Tesouro, cerca de R$ 10 bilhões sobrariam. São estes os recursos que, a princípio, ainda não têm destinação.

Felipe Salto, da IFI, faz contas semelhantes, mas cita uma sobra em torno de R$ 15 bilhões.

O que é possível fazer com a sobra?

No discurso do governo, estes recursos poderão ser usados para atender "diversas demandas da sociedade". Uma delas seria o auxílio caminhoneiro de R$ 400, anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro, mas que não está "carimbado" dentro do Orçamento.

Estimativas iniciais citadas pelo Ministério da Economia indicavam que as despesas com esse auxílio poderiam ficar entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões.

O dinheiro também pode ser utilizado para bancar eventual aumento nas despesas obrigatórias — aquelas que o governo é obrigado a fazer, como o pagamento da dívida pública, dos salários dos servidores, das aposentadorias e dos auxílios maternidade e doença.

Entre a oposição, o temor é de que boa parte do dinheiro seja direcionado às emendas parlamentares, para garantir o apoio da base ao governo Bolsonaro.

Salto explica que o montante disponível para as emendas de relator dependerá do espaço deixado após os reajustes das despesas obrigatórias.

O PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) está com inflação de 6%. Se o índice for revisado para 8,5% ou 9%, é possível que as despesas obrigatórias possam ir para cima. Dependendo do reajuste da inflação, o espaço para o relator vai ser maior ou menor
Felipe Salto, economista da IFI

Conforme Salto, não é possível saber exatamente, neste momento, qual será o espaço para as emendas de relator. "Este tipo de emenda só pode ser feita se houver espaço na PLOA. Com o espaço que sobrar, é possível fazer", acrescentou.

Polêmicas, as emendas de relator são alvo de questionamentos de órgãos de controle. Por meio delas, o relator do Orçamento na Câmara direciona gastos para áreas indicadas por políticos alinhados ao governo.

De onde vem o dinheiro?

O espaço fiscal vem de mudanças trazidas pela PEC dos precatórios, que virou a principal alternativa para bancar o Auxílio Brasil. A ideia do governo é pagar R$ 400 a cerca de 17 milhões de beneficiários até o fim de 2022 — ano em que o presidente Jair Bolsonaro tenta a reeleição.

Para isso, a proposta traz duas mudanças principais. Em primeiro lugar, permite o adiamento do pagamento de parte dos precatórios devidos pela União em 2022.

Precatórios são títulos que representam dívidas que o governo federal tem com pessoas físicas e empresas, provenientes de decisões judiciais definitivas. Quando a decisão judicial é definitiva, o precatório é emitido e passa a fazer parte da programação de pagamentos do governo federal.

O adiamento, conforme o Tesouro Nacional, abrirá espaço de R$ 44,6 bilhões no Orçamento.

A segunda mudança é que a PEC estabelece uma nova regra para o teto de gastos — a regra fiscal constitucional que limita a despesa pública ao Orçamento do ano anterior corrigido pela inflação. Na prática, a mudança permite o furo no teto.

O texto prevê que o limite seja determinado não mais pela inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior, mas pela taxa apurada nos 12 meses até dezembro do ano anterior.

Esta mudança técnica abriria espaço de R$ 47,0 bilhões, de acordo com o Tesouro.

As duas alterações gerariam o espaço fiscal de R$ 91,6 bilhões.