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Guedes tem razão ao achar que mercado está errado sobre o PIB?

Washington Costa/ME
Imagem: Washington Costa/ME

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

22/11/2021 04h00

Nas últimas semanas, tem chamado a atenção o fato de as projeções para o PIB (Produto Interno Bruto) do governo estarem se distanciando dos cálculos do mercado financeiro. Enquanto o Ministério da Economia projeta um crescimento de 2,10% em 2022, a expectativa do mercado está em 0,93%. Alguns economistas até já calculam retração econômica no próximo ano.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem demonstrado irritação com as projeções vindas do mercado financeiro e de organismos internacionais, como o FMI (Fundo Monetário Internacional) e a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). De modo geral, as estimativas apontam que o Brasil crescerá menos que a média mundial em 2021 e 2022.

Na terça-feira (16), o Twitter oficial do ministério publicou gráficos que comparavam o desempenho econômico do Brasil, da América Latina, das economias avançadas e da zona do euro durante o primeiro e o segundo governo de Dilma Rousseff, o governo de Michel Temer e o governo de Jair Bolsonaro — neste último caso, incluindo apenas as projeções até o fim de 2021.

Os números apontavam para um desempenho melhor do Brasil durante o governo Bolsonaro, na comparação com as economias avançadas, da zona do euro e da América Latina.

Na mensagem, Guedes afirmou que se baseava em "fatos", que seriam os dados da SPE (Secretaria de Política Econômica), do Ministério da Economia, enquanto os críticos se baseavam em "estimativas" para 2022, vindas do "FMI, da OCDE e de economistas que erraram antes".

A visão de Guedes e de sua equipe é a de que o mercado financeiro está errado em seus cálculos. Na outra ponta, economistas do mercado acusam Guedes e sua equipe de excesso de otimismo.

O que dizem os números?

As projeções do mercado financeiro para o PIB vêm recuando nas últimas semanas, em meio às preocupações com o equilíbrio das contas do governo e a alta da Selic (a taxa básica de juros), usada para segurar a inflação.

Instituições como o FMI e a OCDE também têm projetado números menores para o Brasil, na comparação com a média global.
O Ministério da Economia atualizou na última quarta-feira (17) suas projeções. Confira:

Projeção do PIB para 2021

  • Mercado financeiro (Pesquisa Focus): +4,88%
  • Ministério da Economia: +5,1%
  • FMI: +5,2% (média global: +5,9%)
  • OCDE: +5,2% (média global: +5,7%)

Projeção do PIB para 2022

  • Mercado financeiro (Pesquisa Focus): +0,93%
  • Ministério da Economia: +2,1%
  • FMI: +1,5% (média global: +4,9%)
  • OCDE: +2,3% (média global: +4,5%)

Os números da OCDE foram atualizados em setembro, enquanto os do FMI foram divulgados em outubro. Essas projeções, portanto, tendem a ser corrigidas nas próximas divulgações, incorporando a piora mais recente do ambiente econômico no Brasil.

O Ministério da Economia já fez a atualização e ainda assim divulgou uma expectativa de alta de 2,1% para o PIB em 2021 — bem acima do que o mercado financeiro calcula.

Ministério diz que mercado vai errar, como em 2020

A equipe de Guedes vem defendendo que, assim como ocorreu em 2020, o mercado financeiro e os organismos internacionais vão errar suas projeções para 2022.

Em meados do ano passado, a Pesquisa Focus do Banco Central, que reúne as estimativas de instituições financeiras, chegou a apontar para um recuo de 6,6% do PIB em 2020, na esteira da crise provocada pela pandemia de covid-19. O FMI calculava retração de 9,1%. Entre as instituições financeiras mais pessimistas, falava-se em queda superior a 10%.

A SPE calculava, na ocasião, um recuo menor, próximo de 4,7%. Isso porque o governo esperava que os programas sociais lançados para minimizar os efeitos da pandemia, como o auxílio emergencial, segurassem a economia. O resultado para o ano de 2020 acabou sendo uma baixa de 4,1% do PIB — mais próximo do que o governo calculava.

No ano passado, o mercado estava projetando uma queda superior a 6,5% do PIB. O Banco Mundial projetava baixa de 8,1% e o FMI, de 9,1%. A SPE projetou queda de 4,7% e, depois de muita gente nos criticar e dizer que estávamos errados, no fim do ano o mercado convergiu para nossa estimativa. O ano terminou com queda de 4,1%, mostrando o acerto da nossa projeção.
Adolfo Sachsida, secretário de Política Econômica

Para governo, economistas subestimam emprego

Desta vez, de acordo com Sachsida, a diferença entre as projeções do governo e do mercado financeiro se deve à avaliação sobre a recuperação do emprego.

O secretário afirma que, pelos modelos de projeção econômica de curto prazo, quando os juros sobem, o PIB cai.

"No fundo, o modelo está dizendo que o mercado de trabalho vai se retrair no curto prazo. O que acontece é que eu não acredito que vá haver essa redução no mercado de trabalho", diz Sachsida.

"Nossa projeção está mais otimista que a do mercado. Em 2020, aconteceu a mesma coisa e nós estávamos certos."

Os dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério do Trabalho e Previdência, mostram que em 2021, até setembro, foram gerados 2,51 milhões de empregos com carteira assinada no Brasil. A visão do governo é que esta recuperação vai continuar.

Para economistas, não há motivo para tanto otimismo

Economistas ouvidos pelo UOL afirmam que não há motivo para Guedes e sua equipe serem tão otimistas com o PIB em 2022.

O economista Mauro Schneider, da MCM Consultores, diz que suas projeções para o PIB já estão abaixo de 5% para 2021 e em 0,06% para 2022, com tendência de queda.

Segundo ele, vários setores da economia demonstram fraqueza, e os cálculos do Ministério da Economia parecem ser "um desejo" do governo, e não o "resultado de boas projeções".

O mercado de trabalho, principalmente no segmento formal, de acordo com o Caged, tem tido um desempenho neste ano surpreendentemente bom, é verdade. Mas uma coisa continua sendo lógica: o mercado de trabalho reage a expectativas de crescimento. Ele não é o elemento que lidera o crescimento.
Mauro Schneider, economista da MCM

Essa também é a visão de Flavio Serrano, economista-chefe da Greenbay Investimentos. Para ele, houve uma recuperação do mercado de emprego formal nos últimos meses e também está em curso uma melhora do segmento informal.

No entanto, seria equivocado considerar os resultados do mercado formal para projetar o desempenho da economia nos próximos meses.

Há um grupo grande de pessoas desocupadas e que vão começar a procurar emprego. Se a economia está ruim agora, imagina como será no ano que vem, com os efeitos defasados da alta de juros neste ano. O desemprego está melhorando, mas vai voltar a piorar, porque a economia não cresce.
Flavio Serrano, economista-chefe da Greenbay

Serrano calcula atualmente alta de 4,7% para o PIB em 2021 e um resultado entre zero e -0,5% para 2022. O economista afirma ainda que a incerteza para as projeções está menor agora, na comparação com 2020.

Isso porque, no ano passado, no auge da pandemia, ninguém sabia exatamente para onde iria a economia global.

"Hoje, há incerteza sobre a área fiscal e o processo eleitoral de 2022. Mas sob o ponto de vista econômico, há certeza sobre a inflação alta, o desemprego e os juros mais elevados", diz Serrano.

"Não serão os R$ 400 do Auxílio Brasil que vão salvar a economia. Desta vez, o Ministério da Economia será surpreendido pelo lado negativo."