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País corre risco de estourar inflação por 3 anos e você ficar mais pobre

Sob o comando de Roberto Campos Neto, Banco Central pode completar três anos com inflação fora da meta - Adriano Machado/Reuters
Sob o comando de Roberto Campos Neto, Banco Central pode completar três anos com inflação fora da meta Imagem: Adriano Machado/Reuters

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

11/07/2022 04h00

Em 2021, a meta de inflação foi estourada. Tudo indica que o mesmo acontecerá em 2022 e em 2023. Economistas ouvidos pelo UOL afirmam que o Banco Central, comandado por Roberto Campos Neto, completará três anos seguidos sem cumprir seu principal objetivo: manter a inflação dentro da meta estabelecida.

Por que é importante? Se acontecer, será o pior desempenho em 20 anos, desde o período de 2001 a 2003, quando a meta não foi alcançada também por três anos consecutivos.

O que você tem a ver com isso? Inflação em níveis altos significa que você fica mais pobre, seu dinheiro perde poder de compra. Todos pagam mais caro por uma série de produtos essenciais, como combustíveis e alimentos. E seu salário não acompanha isso. O que você conseguia comprar antes não vai mais.

O que aconteceu? As dificuldades começaram em 2021: em meio à disparada dos preços das commodities em todo o mundo, o Brasil registrou inflação de 10,06%. O percentual ficou acima da meta perseguida pelo BC, que era de 3,75%, com margem de tolerância de 1,5 ponto porcentual para mais ou para menos. Na prática, a inflação poderia variar entre 2,25% e 5,25% que ainda assim estaria dentro da meta. Com índice de 10,06%, o BC falhou.

E só vai piorando. As projeções do mercado financeiro e do próprio BC indicam que o descumprimento da meta vai se repetir em 2022. A meta é de 5%. Projeções de mercado estimam 7,96%. O BC prevê 8,8%. O IPCA, o índice oficial de preços, está em 11,89% nos 12 meses até junho. Para 2023, a meta de inflação é de 1,75% a 4,75%. Os especialistas já acham que não vai dar.

Veja no gráfico abaixo as metas para o IPCA (o índice oficial de preços) nos últimos anos e a inflação efetivamente verificada. Para 2022 e 2023, aparecem as projeções do relatório Focus.

Quem faz a meta? A meta de inflação para cada ano é determinada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), formado por dois representantes do Ministério da Economia e um do BC. Ao fixar parâmetros, o conselho busca evitar o descontrole de preços, como visto nas décadas de 1980 e 1990.

Como baixar a inflação? Para tentar segurar os preços, desde março de 2021 o BC vem elevando a Selic (a taxa básica de juros), que saltou de 2% para 13,25% ao ano até agora. Com o aumento de juros, espera-se que as pessoas consumam menos. Isso, em tese, reduziria os preços.

Ainda assim, economistas afirmam que o BC perderá novamente a luta contra a inflação em 2023.

Por que 2023 já estaria perdido? O governo está fazendo gastos no ano eleitoral, como criação do auxílio-caminhoneiro e aumento do Auxílio Brasil e vale-gás. Isso é necessário para ajudar as pessoas, mas aumenta o consumo e piora a inflação, diz Otto Nogami, economista e professor do Insper.

Como impostos influenciam? Segundo o economista Mauro Schneider, da consultoria de economia e política MCM, um dos motivos para que a inflação em 2023 siga acelerada foi a aprovação de um projeto que limita o ICMS sobre combustíveis em 17% ou 18%. Essa redução do imposto foi boa. Só que a mesma lei zerou impostos federais sobre a gasolina e o etanol em 2022, mas não em 2023. Isso ajuda agora, mas vai causar um aumento da inflação no ano que vem.

Por que benefícios sociais atrapalham? É importante dar benefícios sociais, mas as contas do governo não fecham, diz Schneider. E isso afeta a inflação também em 2023.

De acordo com o economista da MCM, a PEC dos Auxílios, atualmente em tramitação na Câmara, contribui para manter os preços elevados.

A proposta prevê, entre outras coisas, o aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, o lançamento de um auxílio-caminhoneiro de R$ 1.000 e o reajuste do vale-gás de R$ 53 para R$ 120. As medidas valem até o fim de 2022, mas seus reflexos vão para além disso.

Bolsonaro ou Lula vão cortar gastos em 2023? Para José Faria Júnior, diretor da consultoria Wagner Investimentos, a inflação pode até ser mais baixa em 2022, em função da redução do ICMS dos combustíveis e da energia elétrica. Mas o próximo ano trará novas pressões.

Ele diz que, qualquer que seja o presidente em 2023, dificilmente será reduzido o Auxílio Brasil de R$ 600 para R$ 400 ou o vale-gás. Então os gastos continuarão.

Haverá mais inflação no ano que vem? Faria Júnior espera pressões inflacionárias vindas do funcionalismo público, que não obteve reajustes salariais em 2022, do petróleo no mercado internacional e dos alimentos.

O que diz o Banco Central

Em seus documentos mais recentes, o BC reconheceu —sem citar especificamente a PEC dos Auxílios, defendida pelo governo Bolsonaro— que políticas que sustentem o consumo podem representar um risco de alta para a inflação. O BC também demonstrou preocupação com o cenário externo.

Ao mesmo tempo, a instituição disse que algumas medidas em tramitação no Congresso reduzem a inflação no ano corrente, embora elevem os índices para os anos seguintes.

O UOL abriu espaço para o BC se pronunciar especificamente sobre esta matéria. A instituição não comentou. Em contato com a reportagem, a instituição disse que tratou sobre os temas em seus documentos públicos.