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'Fui vítima de um golpe, pedi indenização e ainda fiquei no prejuízo'

Criminosos utilizaram dados de desenvolvedor de aplicativos para financiar um carro no banco Itaú - xijian/Getty Images
Criminosos utilizaram dados de desenvolvedor de aplicativos para financiar um carro no banco Itaú Imagem: xijian/Getty Images

Do UOL, em São Paulo

30/04/2023 04h00

O desenvolvedor de aplicativos Adriano Dias, 50, levou um susto quando recebeu a notícia de que o banco Itaú havia movido uma ação contra ele na Justiça da Bahia.

Morador da cidade de São Paulo, Adriano estava sendo acusado de não pagar as parcelas de um financiamento de carro de R$ 76 mil.

O problema? Ele nunca fez esse financiamento. Ao abrir o processo, Adriano percebeu que seus dados haviam sido utilizados para promover um golpe.

O caso ocorreu em julho do ano passado e, depois de oito meses, Adriano conseguiu provar sua inocência, e o financiamento foi encerrado. Ele, no entanto, saiu com um prejuízo de R$ 2.000 após a ação judicial.

Na decisão do Tribunal de São Paulo, a juíza responsável pelo caso determinou uma indenização de R$ 4.000 — valor que nem sequer cobre os custos com advogados, de R$ 6.000.

Não fiz absolutamente nada. Estava vivendo minha vida, trabalhando, e veio alguém e me prejudicou. Depois veio o Judiciário e me fez ficar ainda mais no prejuízo
Adriano Dias

O começo de tudo

Ao UOL, Adriano contou que recebeu a notícia de que o Itaú entrou com uma ação contra ele por meio de uma ligação da ex-mulher.

Já sou separado há mais de 20 anos, mas enviaram uma mensagem para ela dizendo que existia um processo em meu nome. Pensei que pudesse ser algum golpe, mas quando olhei no site do TJBA, vi que realmente meu nome e CPF constavam na ação. Tinham financiado um carro em meu nome em Salvador e não estavam pagando as parcelas

Com o nome no Serasa, Adriano começou a viver uma vida de restrição.

"Tive prejuízos difíceis de mensurar. Ia fazer uma viagem internacional e tinha pedido um cartão de crédito melhor, com seguro, mas foi negado porque eu estava com restrição de crédito. Além disso, também tenho uma pequena empresa, e tive problemas, já que ela está associada ao meu nome."

O medo maior, no entanto, era o de que os golpistas utilizassem os dados dele para cometer crimes. "E se atropelassem alguém com o carro em meu nome?"

Adriano então contratou advogados para defendê-lo na ação movida pelo Itaú e conseguiu provar que havia sido vítima de um golpe. Segundo ele, no contrato de financiamento, havia uma foto de reconhecimento facial do criminoso, o que deixou evidente o golpe.

Ao UOL, o Itaú disse que lamenta o ocorrido e informou que encerrou o contrato de financiamento do veículo e desistiu da ação, "sem prejuízos ao consumidor".

Indenização

Após a primeira sentença, Adriano entrou com uma nova ação pelos transtornos causados. No processo, ele pedia R$ 30 mil de danos morais, um valor que cobriria os prejuízos do tempo em que ficou sem acesso ao crédito, além dos custos advocatícios.

"Entramos no juizado especial para lidar com isso e tivemos de esperar oito meses. Como sou autônomo, trabalho por hora e perdi muito tempo indo atrás de documentos. Perdi horas de trabalho. E ainda gastei com advogados", diz ele.

"Foi muito frustrante quando veio a sentença de R$ 4.000. A magistrada sabe exatamente quanto custam os honorários e não se importou em determinar uma indenização que levasse isso em consideração."

Fiquei indignado porque, se não posso contar com a Justiça, vou contar com quem? O que acontece se golpistas usarem meu nome com outros bancos: vou ter de gastar com vários processos? Para os bancos, parece que é mais barato pagarem uma indenização irrisória do que investir na segurança da informação. Ficou um gosto amargo

Adriano ainda pode recorrer da sentença, mas está com receio de ter ainda mais prejuízos financeiros.

"Teria de gastar mais dinheiro sem saber se eventualmente o valor da indenização vai mudar. Posso até, de repente, ter a decisão revista e perder o que já consegui até aqui. É um absurdo de muitas formas."

Procurado pelo UOL, o TJSP informou que os magistrados não podem se manifestar fora dos autos em processos — que ainda estão em andamento. A instituição também afirmou que não se manifesta sobre questões jurisdicionais.

"Os magistrados têm independência funcional para decidir de acordo com os documentos dos autos e seu livre convencimento. Essa independência é uma garantia do próprio Estado de Direito. Quando há discordância da decisão, cabe às partes a interposição dos recursos previstos na legislação vigente."