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Inteligência não é tudo para construir uma empresa de sucesso

Marco Roza

Colunista do UOL

21/10/2015 06h00

Muitos empreendedores se lançam às novas aventuras sem terem tempo para se dedicar às abstrações acumuladas pela humanidade. Teriam que ter tempo e dedicação para explorar os mitos e os arquétipos que controlam nossas decisões mais sutis.

Por exemplo, apesar de alguns estarem dispostos, metaforicamente, a vender a alma para conseguir construir uma empresa lucrativa, com chances de se tornar um grande império, poucos leram sobre a Lenda de Fausto e do seu pacto com o Diabo, que Luís Fernando Veríssimo resume tão bem na introdução de um dos seus contos em “O Melhor das Comédias da Vida Privada” (Editora Objetiva):

“A lenda de Fausto e do seu pacto com o Diabo foi usada por escritores como Goethe e Thomas Mann, e pode ser interpretada de várias maneiras. Fausto simbolizaria a ambição humana pelo poder em confronto com Deus e o Destino, ou o espírito humano disposto a desafiar a Natureza e a danação eterna pelo conhecimento. De qualquer jeito, é o mito inaugural do homem moderno, o que sacrificou sua alma para ter a Ciência. E é revivido cada vez que alguém precisa decidir, mesmo metaforicamente, se aceita ou não negociar a alma com o Diabo. Ou que alguém apenas imagine como agiria na mesma situação”, escreve Veríssimo.

Fausto é muito mais que o executivo ambicioso. É inteligente. Preciso. Construtor de novos mundos. Mesmo que tenha, em algum ponto de sua carreira, arriscar a própria alma e negociá-la com o Diabo, Mefistófeles.

Mas nas minhas divagações, já que preciso subsidiar vários executivos com visões complementares aos seus próprios negócios, esbarrei numa reflexão do sábio budista D. T. Susuki, no seu livro “Mística Cristã e Budista”, que nos ensina que inteligência não é tudo e que necessariamente não precisamos vender a alma ao Diabo para resgatar a sabedoria necessária para consolidar um empreendimento bem-sucedido.

Ensina D. T. Susuki: “Achamos, em geral, que a filosofia é questão de pura inteligência e que, portanto, a melhor filosofia vem do espírito mais ricamente dotado de acuidade intelectual e sutilezas dialéticas. Tal não é o caso, contudo. É verdade que não pode ser bom filósofo quem é pouco aquinhoado de dotes intelectuais.”

E avança: “A inteligência não é tudo, porém. Deve haver um profundo poder de imaginação, deve haver uma força de vontade forte, inflexível, deve haver uma aguda intuição da natureza do homem e, finalmente, deve haver uma verdadeira visão da verdade tal como é sintetizada em todo o ser do próprio homem”.

Quem sabe em vez de vender a alma às chefias, ao gerente do banco, a algum “anjo investidor” não teríamos como alternativa complementar, mais ao alcance de nos alavancarmos com nossos próprios recursos, se nos valêssemos da imaginação, da força de vontade e da aguda intuição da natureza humana.

Conseguiríamos, quem sabe, identificar as carências dos consumidores que pretendemos vincular ao nosso projeto e nos sobrariam recursos para mobilizar emocionalmente nossos colaboradores e fornecedores para nos ajudarem a criar uma empresa que poderíamos chamar de nossa, sem ter que vender a alma ao Diabo.