Rapadura dá sabor regional a cerveja brasileira premiada no exterior
Vendedora de rapaduras no Mercado Central de Ribeirão Preto (SP), Maria Joana da Silva Castro, 62, nem imaginava que se transformaria na fornecedora exclusiva desse produto para uma cervejaria da cidade, que usa o doce como matéria-prima para uma cerveja premiada no exterior.
Explorar sabores regionais, como o desse produto feito a partir de cana-de-açúcar, é uma tendência no mercado de cervejas e vem ajudando o Brasil a se promover internacionalmente no segmento, afirma a sommelier Celine Saorin, especializada nesse tipo de bebida.
É o que vem fazendo a Colorado, fabricante de cervejas especiais, que compra mensalmente entre 300 e 500 quilos da rapadura artesanal feita por Maria Joana e pelo marido, José Batista, 67. É quase toda a produção do casal, que prepara quase 600 kg do doce por mês, a partir da cana cultivada em seu sítio na cidade, localizada a 313 km da capital paulista.
“A rapadura preparada pelo casal é um produto artesanal, de boa qualidade e feito próximo da cervejaria, o que facilita e valoriza a produção local”, afirma Ronaldo Nascimento, presidente da cervejaria.
A Colorado começou a comprar o produto do casal em 2007, quando foi produzida a primeira cerveja da empresa que leva rapadura, a Indica.
Em 2012, a empresa criou outro produto com uma rapadura mais tostada que a habitual, a Vixnu, cerveja que naquele mesmo ano recebeu medalha de ouro na competição Copa Cervezas de América, realizada no Chile. A Indica custa ao consumidor cerca de R$ 20 (garrafa de 600 ml), enquanto a Vixnu é encontrada, em média, por R$ 24 (600 ml).
A produtora já provou as cervejas e diz ter gostado. “A Vixnu é mais amarga, mas dá pra identificar o gosto da minha rapadura”, afirma Maria Joana Castro, que produz o doce há mais de uma década. O volume que não é entregue à cervejaria é vendido no mercado de Ribeirão Preto por R$ 6 o quilo.
De acordo com Nascimento, o fato de ser uma produção realizada de forma tradicional, que resulta em uma rapadura saborosa, pesou na escolha do fornecedor.
Para o preparo da rapadura, a cana é moída para extração do caldo, que é fervido até virar melado e então batido, para ganhar mais consistência. Depois, é mantido em formas até endurecer e esfriar, ficando com o formato de um tijolo.
A rapadura é usada no preparo de cerca de 30 mil litros das duas cervejas por mês. “As duas estão crescendo em vendas. A Indica é uma das cervejas mais procuradas nas lojas e a Vixnu já é exportada para os Estados Unidos e França”, diz o presidente da empresa.
No exterior, como não há uma palavra em inglês que identifique o doce, a rapadura é chamada no rótulo de “brazilian brown sugar”. “Eles não sabem o que é, mas o fato de ser brasileiro já chama a atenção”, diz Ronaldo Nascimento.
Explorar sabores locais é tendência do mercado de cerveja, diz sommelier
Para Cilene Saorin, sommelier de cervejas e presidente da Cobracem (Associação Brasileira dos Profissionais em Cerveja e Malte), as duas cervejas feitas pela Colorado com rapadura têm personalidades próprias.
“Elas trazem o equilíbrio entre o amargor e o gosto da rapadura. A Indica, por exemplo, tem o gosto da rapadura no fim do gole, que dá o contraponto. Já a Vixnu, tem teor alcoólico maior”, afirma.
Ao usar produtos brasileiros na composição das cervejas, diz Cilene Saorin, as empresas seguem uma tendência mundial. “Explorar o que é do Brasil, a riqueza gastronômica do país, é interessante e inteligente. Isso acontece no mundo todo e dá chance para que a cerveja brasileira conquiste o mercado internacional”, afirma.
A legislação brasileira não permite que alguns ingredientes sejam usados na fabricação de cervejas --como mel, leite e ervas, por exemplo--, embora algumas empresas tenham obtido liminares para o uso em suas formulações. O governo fez um acordo com as indústrias para modernizar a lei, e a proposta para consulta pública com essas alterações já foi publicada.
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