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Proposta de remuneração mínima de apps não agrada entregadores e motoristas

Apesar dos rumores de que o presidente Lula estaria insatisfeito com o ritmo lento da comissão especial que debate a regulamentação do trabalho de motoristas e entregadores de aplicativos em Brasília, a aguardada reunião desta segunda-feira (14) terminou sem consenso, mais uma vez.

Responsável pela condução dos debates, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) agendou uma nova rodada de negociações para o próximo dia 29.

De fato, havia bastante expectativa sobre o encontro. Mais de cem dias após a instalação do comitê, especulava-se que, finalmente, seriam votadas medidas concretas pelos membros do grupo formado por representantes de empresas, trabalhadores e governo. A pauta central diz respeito à remuneração das duas categorias.

No entanto, a proposta apresentada pela Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) — entidade que reúne as plataformas líderes de mercado, como 99, Amazon, iFood e Uber — passou longe de agradar às lideranças de motoristas e entregadores.

Quanto os principais apps oferecem?

Para o transporte de passageiros, a Amobitec propõe um piso de R$ 15,60 por hora. Já no delivery, os valores seriam de R$ 10,86 para carros, R$ 10,20 para motos e R$ 6,54 para bicicletas.

Em todos os casos, esses pagamentos se referem ao tempo efetivamente trabalhado e não levam em conta os intervalos entre as corridas. Para atingir R$ 10,20, por exemplo, um motoboy precisaria acumular 60 minutos em viagens.

"Isso não significa que ele não possa receber mais. Em determinadas situações, ele vai receber mais do que isso", afirma André Porto, diretor-executivo da Amobitec.

Porém, a proposta da entidade é alvo de críticas de lideranças dos trabalhadores com assento na comissão. Na avaliação de Leandro Cruz, presidente do Stattesp, sindicato que representa motoristas de app em São Paulo, o valor de R$ 15,60 é inferior ao que as principais plataformas já praticam hoje em dia. "É inaceitável", resume.

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Representantes de profissionais do delivery também protestam. "Ignoraram o custo do celular, por exemplo. Periculosidade, alimentação, um monte de coisas", explica Nicolas Souza Santos, secretário da Aliança Nacional dos Entregadores de Aplicativo.

Divergências e protelação

Para além da discussão sobre valores, há outros pontos de divergência. Os principais aplicativos pressionam pela criação de uma legislação específica para a prestação de serviços por plataformas, com regras diferentes das previstas pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Isso evitaria que as negociações sobre remuneração e medidas de saúde e segurança, por exemplo, se dessem por meio de convenções coletivas entre empresas e trabalhadores — instrumento defendido pelas centrais sindicais que participam da comissão especial.

Criado oficialmente no dia 1º de maio, o grupo do Ministério do Trabalho que discute a regulamentação da atividade em apps tem previsão de funcionamento de cinco meses, prorrogável pelo mesmo período.

No entanto, lideranças de trabalhadores ouvidas pela reportagem se queixam de que as plataformas estariam atuando para travar o funcionamento do comitê, até a sua extinção. Além da Amobitec, existem duas outras associações que representam as plataformas. "Uma burocracia danada, nem parece que são empresas de tecnologia", ironiza Nicolas Santos.

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Gilberto Almeida dos Santos, presidente do SindimotoSP, sindicato dos motofretistas da capital paulista, partilha da mesma visão. "O que as empresas querem é levar a discussão para o Congresso Nacional", analisa.

A leitura é que os debates com deputados e senadores tendem a beneficiar as plataformas, num cenário em que o parlamento é tido como menos sensível à proteção trabalhista do que o governo federal.

O diretor-executivo da Amobitec refuta a avaliação. "A gente está 100% interessado, 100% disponível para tocar essas conversas no ritmo que for necessário para a gente conseguir chegar nesses consensos. Se vai ser possível ou não, é um exercício de futurologia", sustenta André Porto.

A falta de agilidade e produtividade das discussões não tem incomodado apenas o presidente Lula. "Nós já estamos indo para 110 dias vindo aqui para Brasília tomar cafezinho e beber água", finaliza Gilberto Almeida dos Santos, do SindimotoSP.











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