Musk quer usar o Brasil como 'Venezuela' da direita americana
"Vai acontecer na América também se Kamala/Walz chegarem ao poder."
"Todos precisam acordar. Sim, isso pode acontecer aqui também."
Mais do que uma suposta defesa do direito absoluto à liberdade de expressão, os ataques de Elon Musk postados no X/Twitter contra Alexandre de Moraes, depois de o ministro determinar a suspensão da rede social no país, mostram uma clara estratégia política: usar o Brasil como fantasma para assustar os eleitores americanos.
Em novembro, os Estados Unidos vão escolher seu novo presidente. O bilionário sul-africano não só já declarou seu apoio a Donald Trump como até já fez uma entrevista de duas horas em sua rede social com o candidato republicano, no começo de agosto. Trump retribuiu a gentileza dizendo que poderia nomear Musk para um cargo em seu governo.
Qualquer semelhança com as eleições brasileiras de 2022, em que a ditadura venezuelana era usada como espantalho para excitar a militância de direita, não é mera coincidência. Musk segue à risca a cartilha da direita populista: fabricar um perigo iminente — no caso, o 'fim da liberdade' — para turbinar a sensação de pânico social e, de quebra, manter seus apoiadores em permanente estado de alerta.
Por lá, a briga com Alexandre de Moraes está sendo explorada como uma ameaça futura: "corremos o risco de virar o Brasil, não deixe isso acontecer". Por aqui, o chamado é mais urgente. Não à toa, bolsonaristas estão usando a derrubada do X/Twitter para alavancar a divulgação do ato de 07 de setembro na Avenida Paulista.
Não importa o fato de que a plataforma de Musk cumpriu ordens, sem pestanejar, para derrubar conteúdos na Índia e na Turquia, coisa que se recusa a fazer no Brasil. Tampouco têm relevância as relações fraternas com a "China comunista" — onde o X/Twitter é proibido, diga-se de passagem — para garantir a operação industrial da Tesla, sua marca de carros elétricos.
Definitivamente, coerência não é o forte de Musk. Responsabilidade, muito menos. Por sinal, nem precisamos entrar no mérito de que, com o X/Twitter sob a batuta do bilionário, conteúdos de grupos neonazistas e supremacistas brancos passaram a ser disseminados com bem menos dificuldade, para usar um eufemismo. Afinal, ressuscitar Hitler é um argumento cansativo e manjado.
Então, quem se lembra de que em abril do ano passado o X/Twitter ignorou os pedidos de autoridades brasileiras para derrubar dezenas de contas usadas para insuflar massacres com armas em escolas? Quem se recorda de que a assessoria de imprensa da plataforma respondia com um emoji de fezes aos questionamentos de jornalistas sobre o caso?
Taí um curioso conceito de liberdade de expressão: permitir que criminosos e psicopatas explorem algoritmos treinados para bombar conteúdos histéricos e agressivos, como os que defendem — vamos repetir em letras maiúsculas — MASSACRES EM ESCOLAS.
O fato é que extremistas são peritos em usar incautos para subir o sarrafo do absurdo e normalizar ideias que precisam, sim, ser banidas. Daí, de repente, vemos um youtuber alcoolizado defendendo ao vivo, para milhões de pessoas, a existência de partidos nazistas — ainda que "não concordasse" com as ideias de Hitler. Tudo em nome da liberdade de expressão.
Por fim, o leitor pode objetar: tem muita gente bem-intencionada, para além dos extremistas, criticando os abusos de Alexandre de Moraes. É verdade. Por sinal, são pessoas que publicam dia sim, dia também, críticas pesadas ao ministro do STF, mas que não foram censuradas. Sabe por quê? Porque não tramaram golpe de estado nem defenderam a distribuição de conteúdo supremacista branco. Só foram dragados para a corrida eleitoral americana. Musk e Trump agradecem.
Newsletter
OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receber
Deixe seu comentário