Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Reportagem

PL para motorista de app não passa da forma como está, diz deputado Agrobom

O deputado federal Daniel Agrobom (PL-GO) tem como uma das principais linhas de seu primeiro mandato a regulamentação da atividade dos motoristas de aplicativo.

Líder de uma frente parlamentar sobre o tema, ele avalia em entrevista à coluna que o PLP (Projeto de Lei Complementar) 12/2024, apresentado pelo governo em março deste ano e em tramitação na Câmara, não deve ser aprovado no curto prazo. Ainda mais com o Congresso tomado pelas eleições municipais e pela sucessão de suas duas casas, comandas pelo deputado Arthur Lira (PP-AL) e pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

"Um projeto como esse, que ainda não tem um texto que agrada todo mundo, dificilmente será colocado em votação", analisa.

Segundo Agrobom, o principal ponto em debate ainda é o critério de remuneração dos motoristas. Ele propõe a criação de um "markup" para precificar os custos. "A gente sugeriu que o governo, através dos Detrans estaduais, pudesse fazer um markup por região. E, acima desse custo, jogar 20% do valor, que seria o lucro do motorista", explica.

O deputado afirma ainda que as plataformas precisam contribuir para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). No caso dos motoristas, defende um formato especial de MEI (Microempreendedor Individual), apesar de o regime ser criticado por onerar as contas públicas. "Já existem muitos benefícios criados pelo MEI. Motoristas ganham desconto no IPVA, na aquisição de veículos", justifica.

Confira abaixo, a íntegra da entrevista.

No ano passado, o governo criou uma comissão para tentar uma conciliação entre empresas e trabalhadores de aplicativo. Qual é sua avaliação sobre essa comissão e sobre o PLP 12/2024?

Nós, da frente parlamentar, desde o início dessa comissão, tentamos entrar também como representantes dos motoristas por aplicativo. Mas não fomos aceitos. A comissão não aceitou que a gente participasse de nenhuma das reuniões, sempre alegando que já tinham representantes da categoria lá dentro, que eram os sindicatos.

Os sindicatos nunca representaram essa categoria, porque é um número mínimo de pessoas que são filiadas. Então, essa comissão foi criada no intuito de o governo chegar a um relatório e fazer um texto que virasse um projeto [de lei]. Mas, infelizmente, chegaram a esse PLP 12 aí, que não tem nada a ver.

Continua após a publicidade

O senhor tocou no assunto dos sindicatos. Muitos motoristas, lideranças de associações ou influenciadores em redes sociais, batem na tecla "sindicato não nos representa". Mas não seria importante ter uma representação coletiva, até para que eles possam negociar com mais força com as empresas?

Eu acredito que é necessário que tenha uma associação, um sindicato, alguma coisa nesse sentido, para representar essa categoria, mas não da forma que existe hoje. Os sindicatos hoje não representam essa categoria. Primeiro porque, como eu disse, são poucas as pessoas filiadas. E as pessoas que estão lá hoje presidindo esses sindicatos não têm essa parceria junto à categoria para que, realmente, possam representar esses trabalhadores.

Quais são as principais críticas que o senhor faz ao PLP 12, o projeto apresentado pelo governo?

Ele não contempla a maior necessidade, que é a remuneração. Não tenho dúvida que tem muitas coisas: segurança, transparência. Mas o principal é a remuneração para o trabalhador.

O PLP 12 traz remuneração por hora trabalhada, que não é a realidade da categoria. A categoria hoje trabalha por km rodado. Todas as despesas que são atribuídas ao trabalho do motorista de aplicativo são calculadas em cima de km rodado: petróleo, desgaste do pneu, desgaste do veículo.

O que esse PLP 12 está dando é mais autonomia para as plataformas, para poderem trabalhar o algoritmo de forma que façam aquilo que quiserem com a categoria.

Continua após a publicidade

Eu entrevistei o deputado Augustinho Coutinho (Republicanos-PE), relator do PLP 12 na Câmara. Uma das ideias dele era estabelecer uma porcentagem máxima que as empresas poderiam descontar dos motoristas. Como o senhor avalia essa proposta?

O deputado Augusto Coutinho também é o relator do Projeto de Lei (PL) 536, criado pela Frente Parlamentar junto com os motoristas de aplicativo. Nós fizemos esse PL 536 para andar em paralelo com o PLP 12. Inclusive, nós apresentamos primeiro.

Então, eles pegaram algumas coisas que poderiam não prejudicar o governo em nada, mas que melhoravam o PLP 12 e colocaram. Tiraram do PL 536 e colocaram lá no PLP 12. Mas, mesmo assim, deixou de fora a parte principal, que é aquela que eu disse, da remuneração. Essa parte da remuneração é hoje a grande discussão lá dentro do parlamento.

Qual seria o melhor formato de remuneração?

No PL 536, que nós criamos junto com os motoristas de aplicativo, a remuneração seria através de um "markup". O que é o markup? É a precificação dos custos. Então, a gente sugeriu que o governo, através dos Detrans estaduais, pudesse fazer um markup por região, inclusive para saber o custo de cada região. E, acima desse custo, jogar 20% do valor, que seria o lucro do motorista.

Nós chegamos, com esse markup e mais esse acréscimo de 20%, que isso aí daria uma faixa de R$ 2,00 por km rodado. E você tratando de R$ 32,10 [por hora rodada, segundo o projeto do governo], isso vai ser bem abaixo. Vai dar R$ 1,40, alguma coisa.

Continua após a publicidade

Então, a grande discussão hoje é justamente isso: deixar de receber por hora trabalhada e trabalhar por km rodado. Porque nós vamos ter ali motoristas que vão pegar trânsito e ficar ali uma, duas horas parado. O outro, às vezes, pega uma rota melhor, mas que vai andar mais. Vai andar 30, 40 quilômetros dentro de uma hora. Aí o custo dele ficaria muito alto para um preço [da corrida] tão barato. Então, acho que teria que ser por km rodado e usar a forma do markup para precificar os custos.

Sobre a contribuição para o INSS, eu já vi declarações do senhor defendendo o regime do MEI. Alguns motoristas também defendem esse formato. Porém, os críticos dizem que ele tem dois problemas. Primeiro, as empresas não contribuem com nada. Segundo, o MEI é um regime subsidiado, que onera as contas públicas. Qual é sua opinião?

Você pode criar um projeto em que as empresas também teriam que recolher 20%, que é o que eles já estão fazendo hoje no projeto, no relatório do Augusto Coutinho.

Ele trouxe lá um recolhimento de 20% para as empresas e 7,5% para o motorista de aplicativo. A única mudança que nós estamos querendo nessa decisão aí é a questão de eles poderem fazer pelo MEI o recolhimento do INSS.

Isso aí é simplesmente você colocar uma opção. Porque nós entendemos que muitas pessoas gostariam de recolher mais do que isso, porque eles vão pensar também em uma aposentadoria.

Nota da coluna: O projeto do governo fixa a contribuição ao INSS tendo como base de cálculo um quarto do valor repassado pelas plataformas aos motoristas. Ou seja, se um trabalhador recebe R$ 1 mil líquidos no fim do mês, ele recolheria 7,5% sobre R$ 250. Já a empresa pagaria 20% sobre R$ 250.

Continua após a publicidade

Mas o senhor concorda que seria importante que as empresas também contribuíssem para a Previdência?

Sim, claro. Eu acho que o principal é isso: fazer as empresas recolherem. Porque as empresas hoje não recolhem. O trabalhador precisa recolher? Precisa, sim, e eles não são contrários a isso. Mas hoje o MEI, além de você dar essa condição de ele poder pagar, é um valor mais acessível [a contribuição é de 5% sobre o salário mínimo: R$ 70,60].

Em vários estados brasileiros, já tem projetos criados. Aqueles motoristas que estão cadastrados no MEI ganham desconto no IPVA, ganham desconto na aquisição de veículos. Então, já existem muitos benefícios criados pelo MEI.

Mas o MEI é um regime altamente deficitário para a Previdência?

A gente teve como sugestão, e até nós temos uma audiência agora para a primeira semana de outubro com o ministro [do Empreendedorismo] Márcio França para que a gente possa fazer, quem sabe, um MEI exclusivo para o motorista de aplicativo, com uma taxa mais em conta, que seria boa para o motorista, mas também que atendesse ao governo.

Aí, sim, iria discutir valores, que chegariam próximo àquilo que o governo pretende. E o MEI poderia continuar dando esses benefícios dentro dos estados para os motoristas.

Continua após a publicidade

Estamos em período eleitoral, nada anda no Congresso. Mas o senhor acha possível chegar a um consenso e aprovar esse projeto de lei, se não neste ano, talvez no começo do ano que vem?

Olha, nós estamos aguardando agora passar o período eleitoral. Eu acho muito difícil esse projeto ser levado a votação. Ele hoje está dentro da comissão [de Indústria, Comércio e Serviços]. A comissão precisa votar esse projeto para seguir para a próxima [são três, no total]. Ou alguém precisa apresentar um pedido de regime de urgência.

Do jeito como está atualmente o texto do relatório, o senhor acha que o projeto seria aprovado?

Acredito que não. Hoje não seria aprovado. E acredito também que não vá para o plenário este ano, porque tem tantos outros projetos de suma importância que precisam ainda ser votados neste ano. E nós não podemos esquecer que, depois do período eleitoral, vamos entrar naquele período em que a Câmara já vai começar a discutir a nova diretoria. Então, um projeto como esse, que ainda não tem um texto que agrada todo mundo, dificilmente será colocado em votação.

Nota da coluna: a pedido da assessoria do deputado, o texto foi alterado às 10h30 para informar que o valor do "markup" defendido pelo parlamentar é de cerca de R$ 2,00 por km rodado, e não de R$ 1,80, como constava da versão inicial.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Deixe seu comentário

Só para assinantes