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Graciliano Rocha

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Foi incompetência ou fraude que levou as Americanas à lona?

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Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

19/01/2023 16h29

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Por enquanto, a melhor analogia para o rombo que levou as Americanas ao pedido de recuperação judicial é a do desastre aéreo.

Cada vez que um avião cai, peritos dissecam destroços, recuperam comunicações de pilotos e torre, refazem equações para encontrar, via de regra, não uma causa, mas vários fatores que interagiram, na pior ordem possível, para a queda, as mortes e o prejuízo.

A diferença entre incompetência e fraude:

  • Do ponto de vista legal, no entanto, faz diferença saber se foi incompetência ou fraude. No primeiro caso, as consequências jurídicas são apenas no âmbito civil.
  • Já a fraude está no campo penal, o que envolve responsabilização individual e, em caso de condenação, eventual pena de prisão.
  • Um bom começo é a Lei de Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (lei nº 7.492/86): dois a seis anos de reclusão para quem "induzir ou manter em erro sócio, investidor ou repartição pública competente, relativamente a operação ou situação financeira, sonegando-lhe informação ou prestando-a falsamente".
  • Na primeira vez em que falou aos bancos sobre o buraco de R$ 20 bilhões no balanço, Sergio Rial (o CEO que ficou nove dias no cargo) disse que as operações de risco sacado (quando bancos antecipam pagamento a fornecedores das Americanas mediante deságio) não vinham entrando na contabilidade de dívida com bancos há "seis ou sete anos".
  • Sabedoria popular: quando alguém erra da mesma maneira grosseira durante tanto tempo, talvez não esteja errando, mas fazendo de propósito.
  • Se ficar demonstrado que o começo de tudo (manipular a coluna de dívidas no balanço) foi mesmo fraude, a longevidade do esquema ("seis ou sete anos") só foi possível graças a, agora sim, incompetência.
  • Do ponto de vista de quem viu suas economias derreterem com Americanas, não há diferença se os responsáveis por omitir dívidas dos balanços foram incompetentes ou cometeram fraude. É a consequência econômica - a destruição de bilhões de reais de acionistas, credores e investidores - que provoca mais dor.

Quem dormiu no volante:

  • A PwC, uma das maiores firmas de auditoria do mundo, ainda está devendo explicações. É esta empresa a responsável por auditar o balanço das Americanas desde 2019.
  • Uma ressalva: auditores não são policiais treinados a apanhar malfeitores em flagrante, principalmente no caso teórico da direção da empresa estar envolvida.
  • Mesmo assim, é difícil entender como foi possível camuflar, por tantos anos, despesas tão relevantes sem que isso tenha gerado qualquer desconfiança dos auditores.
  • Este colunista procurou a PwC em busca de explicações. A resposta da assessoria: "A PwC não comenta casos de clientes".
  • Para não perder o hábito de profetizar o que já estava no preço da ação, as agências de rating cortaram a nota das Americanas para o grau de calote. Só depois a companhia conseguiu a primeira liminar para não pagar dívidas.
  • A área de risco dos bancos também precisa dar algumas explicações. O montante bilionário que liberaram estava aparecendo no balanço a cada trimestre?
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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL