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Bolsonaro abandona programa de cisternas como fez com o Bolsa Família
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Enquanto pressiona o Congresso a quebrar regras de controle fiscal para liberar recursos que permitam pôr de pé o programa Auxílio Brasil, com a transferência de R$ 400 mensais em média para 17 milhões de famílias, o presidente Jair Bolsonaro e seu governo deixam no abandono outros importantes programas sociais. É o caso do programa Cisternas, que prevê abastecimento de água na região do Semiárido nordestino com captação de água de chuvas em reservatórios.
Criado em 2003, o Cisternas é uma espécie de Bolsa Família da água. Como o programa de transferência de renda, é focado em famílias pobres, no caso localizadas na área rural do semiárido brasileiro, assegurando abastecimento de água para o período da seca. Também como o Bolsa Família é barato e eficaz.
Ainda como o Bolsa Família, o Cisternas tem sido alvo de inúmeros estudos, é aplicado em outros países e recebeu prêmios internacionais. Em quase 20 anos de existência, comprovou-se eficaz para a sobrevivência e fixação de populações em suas pequenas propriedades.
Mais uma vez como o Bolsa Família, o Cisternas vem definhando no governo Bolsonaro, chegando agora ao literal abandono. No jornal "Valor" desta segunda-feira (22), o repórter João Valadares mostra que, depois de entregar 30,5 mil cisternas em 2019, apenas 8,3 mil foram concluídas em 2020, devendo cair para 6 mil em 2021, nos cálculos do ministério da Cidadania, o responsável pelo programa. Até agosto, foram concluídos 1,6 mil reservatórios, bancados por recursos de anos anteriores.
Do orçamento de R$ 32 milhões para o Cisternas aprovado para 2021, nada foi efetivamente gasto com o programa até meados de novembro. O total de recursos empenhados, ou seja, já disponíveis para serem gastos, não passa de R$ 500 mil, 1,5% da dotação orçamentária, e decorre de emendas parlamentares.
Ao armazenar água da chuva, as cisternas garantem regularização do abastecimento para consumo humano e produção tanto de alimentos quanto criação de animais para sobrevivência. O programa tem outras vertentes, que consideram a construção de reservatórios maiores para atividade agrícola e consumo humano em escolas.
Em quase 20 anos de atuação, o programa permitiu a construção de mais de um milhão de cisternas em mais de 1,2 mil municípios. Alcançou cerca de 5 milhões de pessoas, metade da população rural da região semiárida, que abrange os estados nordestinos e parte norte de Minas Gerais.
Segundo informações da ASA (Articulação do Semiárido Brasileiro), o déficit de cisternas ainda é de 350 mil unidades, que atenderiam a cerca de 1,8 milhões de pessoas. A ASA, uma rede que congrega mais de três mil organizações da sociedade civil, foi a inspiradora e parceira do programa Cisternas desde a origem. Seus dirigentes se queixam de não estarem mais conseguindo interlocução no ministério da Cidadania. A ASA está lançando uma campanha para levantar recursos e dobrar o número de cisternas.
As cisternas, juntamente com os açudes e programas de dessanilização de água salobra, formam um conjunto integrado de ações para acumular água de fontes diversas numa região de seca, onde chuvas e fluxos de rios são muito escassos em dois terços do ano. São diversas as microrregiões do semiárido, merecendo soluções específicas, mas integradas no conjunto.
No caso das cisternas, a vantagem é o baixo custo da solução descentralizada e o foco bem direcionado no público-alvo. Um dos problemas é a necessidade de treinar usuários para a construção correta dos reservatórios e também para manter a água armazenada em boas condições para consumo humano.
A descontinuidade na prática de um programa barato e já comprovadamente eficaz no enfrentamento de um problema grave de ampla repercussão social é mais um ponto a reforçar a marca de despreocupação social do governo Bolsonaro. Ajuda também a dirimir dúvidas quanto ao caráter populista de suas ações - são, em geral, populistas, e visam, antes de tudo, a angariar aprovação e votos a Bolsonaro.
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