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Risco de vender Eletrobras agora vai de pagarem pouco a conta de luz subir
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Depois de um longo e conturbado processo, o TCU (Tribunal de Contas da União) aprovou, nesta quarta-feira (18), a privatização da Eletrobras, estatal do setor de energia. Em teoria, está aberto o caminho para o lançamento do edital de venda de ações do governo que garantem o controle da companhia.
O caminho está aberto, mas ainda só em tese, porque são esperadas muitas ações, inclusive na Justiça, tentando impedir o leilão de venda de ações da empresa. De todo modo, a liberação pelo TCU para prosseguimento do processo de privatização foi considerada uma vitória do governo Bolsonaro porque há grande interesse oficial em transferir o mais rápido possível o controle da Eletrobras.
Seria, no apagar das luzes do governo, uma espécie de satisfação à praça por uma promessa de campanha que, como tantas outras, não foi adiante. Do enfático discurso privatista de Bolsonaro, vocalizado com mais estridência por seu ministro da Economia, Paulo Guedes, com o anúncio de "um trilhão em privatizações", nada de expressivo foi feito, restando a Eletrobras como ponto de honra relevante.
O governo corre para fazer esse gol de honra, depois da goleada que tomou por não privatizar quase nada no mandato que se encerra no fim do ano. Mas é quase inevitável que enfrente resistências e tentativas de atrasar os cronogramas, com o objetivo de inviabilizar a privatização — na verdade, um processo de capitalização, em que o governo manterá parte do capital da empresa e também uma ação especial (golden share, no jargão do mercado), que lhe dará direito a veto em determinadas operações.
Esse roteiro para a capitalização da Eletrobras como forma de privatizá-la foi traçado ainda no governo Temer. A ideia é oferecer novas ações da Eletrobras ao mercado — daí a capitalização —, sem a participação do governo. Assim, a parte estatal no capital de controle ficaria diluída. O objetivo é que a União reduza sua participação de cerca de 70% para 45% do capital votante da Eletrobras.
Terá pano para manga uma capitalização neste momento. O ministro Vital do Rêgo, revisor no TCU da privatização da Eletrobras, voto solitário contrário, diz que o valor de outorga — ou seja, o que montante que o governo deveria receber por transferir o controle da Eletrobrás — deveria ser de R$ 130 bilhões, e não de R$ 67 bilhões, como desenhado pelo governo e aceito pelo relator do caso no Tribunal, ministro Aroldo Cedraz. A revisão de Vital do Rêgo, apontando preço baixo e risco de prejuízo aos consumidores, reúne diversos elementos e oferece um roteiro para quem quiser tentar barrar a venda da estatal na Justiça.
Numa outra frente, entidades de funcionários da Eletrobras levaram denúncia contra a companhia à SEC (órgão regulador do mercado de capitais nos Estados Unidos). Acusam a Eletrobras de falta de transparência e omissão de riscos financeiros bilionários, relativos a passivos da usina de Santo Antonio, no rio Madeira, perto de Porto Velho (RO). A estatal tem papéis listados na Bolsa de Nova York.
Os riscos mais sérios, caso a privatização seja realmente consumada, são dois. Primeiro, que o valor apurado na venda seja baixo e, depois, que sejam frágeis as garantias de que as tarifas cobradas dos consumidores serão módicas. Esses riscos crescem na medida em que a eventual venda se dará a pouco meses de uma eleição em que a continuidade de Bolsonaro no governo não está assegurada.
Embora representantes de grandes fundos de investimento que já são acionistas da Eletrobras indiquem interesse no negócio, é difícil imaginar muitos competidores disputando a Eletrobras neste momento. Não só há a incerteza de uma eleição presidencial logo à frente, como, no caso específico, o até aqui principal oponente de Bolsonaro no pleito, o ex-presidente Lula, tem reiterado que, se eleito, atuará para revisar ou revogar a privatização. O fato de que o governo diluir sua participação na Eletrobras, mas não deixar a empresa também pesa contra a atração do negócio para o setor privado.
Além de se prever poucos concorrentes e menos competição pela Eletrobras, é legítimo imaginar que estarão presentes investidores mais ousados — uma forma elegante para classificar investidores aventureiros — o que, se confirmado, aumentaria o risco de que cláusulas contratuais fossem descumpridas ao longo do tempo.
Pode-se imaginar também que, para atrair investidores, condições mais generosas acabariam sendo oferecidas. Já é certo que, se as exigências aprovadas no Congresso para a privatização da Eletrobras forem mantidas, os consumidores pagarão contas de luz mais salgadas.
A medida provisória que desenhou o roteiro da capitalização da Eletrobras foi aprovada no Congresso com uma série de penduricalhos que tendem a encarecer a operação. Os jabutis que, sob o comando do Centrão, foram pendurados na árvore da Eletrobras impõem, entre outras exigências, a contratação de usinas térmicas a gás em regiões onde ainda não há gasodutos e subsídios a térmicas a carvão, estas na contramão das preocupações ambientais.
É por isso que, mesmo para especialistas que apoiam a privatização da Eletrobras, o momento em que o governo pretende fazê-lo é inconveniente e arriscado. Privatizar nessas circunstâncias pode trazer prejuízos de tal ordem que seria melhor esperar tempos menos incertos e instáveis, após a instalação do novo governo.
A Eletrobras é a maior empresa de geração de energia da América Latina, respondendo por 28% da geração de energia no Brasil e por 40% das linhas de transmissão. A empresa estatal obteve lucros de R$ 5,7 bilhões em 2021 e só no primeiro trimestre de 2022 contabilizou ganhos de R$ 2,7 bilhões. Se, no ano passado, seu lucro foi 11% inferior ao realizado em 2020, no primeiro trimestre deste ano superou em 70% o realizado no mesmo período de 2021.
Alguns podem se perguntar por que privatizar uma empresa que dá lucro. Cada caso é um caso e a resposta pode incluir uma série de elementos, mas especialistas vêm vantagens quando se trata da Eletrobras. Um deles, por exemplo, é o fato de a empresa estatal atuar em setor já desenvolvido, mas com potencial de mercado e expectativa de retorno atraente para novos investimentos.
O setor elétrico se encontra nessa situação. As novas fronteiras tecnológicas de geração de eletricidade — energias solar e eólica, por exemplo — dispensam a presença estatal pioneira e indutora.
Na fase de implantação, com a exigência de altos investimentos com retornos mais lentos e espaçados no tempo, nem sempre capitais privados se sentem atraídos a desenvolver um dado setor. É aí que a presença estatal se faz necessária. Mas, quando a etapa de implantação já foi superada, a oferta do serviço tende a ser mais eficiente se for tocada pela iniciativa privada. Os objetivos de uma estatal devem ser o de atuar na indução de mercado e manter finanças equilibradas, mas não dar lucro.
A tendência de menor eficiência de administrações estatais, em comparação com a gestão privada, tem origem nas regras de controle mais rígidas e nas amarras institucionais que costumam engessar entes públicos. Sem falar nos desvios de conduta — corrupção, nepotismo, influência política — que, se podem ocorrer em empresas privadas, são muito mais comuns nas públicas.
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