José Paulo Kupfer

José Paulo Kupfer

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

Ata do Copom realinha 'no grito' expectativas desajustadas pelo comunicado

É evidente que a ata do Copom (Comitê de Política Monetária) de julho, publicada nesta terça-feira (6), difere, não só no tom, mas também nos termos, do comunicado divulgado logo após o encerramento da reunião em que o colegiado que reúne presidente e diretores do Banco Central decidiu manter a taxa básica de juros (taxa Selic) em 10,5% nominais ao ano.

Uma ata afirmativa detalhou o ponto central que ficara ambíguo no comunicado. Enquanto o comunicado sinalizava de modo hesitante a hipótese de que o avanço da inflação pudesse exigir altas na taxa básica, a ata foi bastante clara em essa possibilidade.

Selic fica como está

Ao informar, de forma suficientemente clara, haver unanimidade entre os integrantes do Copom sobre a perspectiva de retomar um ciclo de altas na Selic, o Copom parece ter sido bem sucedido em dirimir dúvidas que pipocaram no mercado financeiro, pós-comunicado, a respeito da firmeza com que trabalha para assegurar a convergência da inflação à meta.

A cotação do dólar opera em nível mais alto do que o registrado até maio — fator relevante de pressão inflacionária —, e os índices de inflação, no acumulado em 12 meses, rondam na fronteira de uma alta de 4,5%, teto do intervalo de tolerância do sistema de metas. Apesar disso, depois de publicada a ata, analistas do mercado financeiro concluíram que, mesmo com "o dedo no gatilho", como registrou relatório do banco Itaú a clientes, não será preciso elevar a Selic além do patamar alto em que já se encontra, para conduzir as expectativas na direção da meta.

Ainda que a ata tenha enfatizado que o Copom não se compromete com estratégias futuras, as análises agora majoritárias levam à expectativa de que a taxa Selic será mantida em 10,5%, se não até o fim de 2025, pelo menos até meados do ano que vem. Para chegar nessa conclusão as análises também agregam argumentos que não constam da ata.

Mudança no ambiente

O primeiro desses argumentos é reflexo da chacoalhada pela qual passou o mercado global de ativos nesta segunda-feira (5), puxado por um início de crash no mercado japonês, e que, involuntariamente, deu à ata um caráter de declaração de princípios forte, mas envelhecida e já um pouco desnecessária.

Com o tumulto nos mercados, a convicção de que o Fed (Federal Reserve, banco central americano) está demorando em iniciar um ciclo de cortes na taxa de juros de referência no mercado americano se tornou predominante. Mesmo a reversão parcial do clima de pânico que se instalou em bom número de praças financeiras, na terça-feira, não mudou essa convicção.

Além disso, apesar das juras do Copom de que "fará o que for preciso" para manter a inflação sobre controle, inclusive aumentando as taxas de juros, são poucos os que acreditam que haja clima político para elevar a Selic, no momento em que se aproxima o anúncio do substituto de Roberto Campos Neto, desafeto de Lula, na presidência do BC por alguém indicado pelo presidente.

Continua após a publicidade

Tudo considerado, assim como o efêmero tumulto nos mercados globais pareceu indicar mais um ajuste de posições, diante das bolhas que vinham se formando, a ata do Copom, talvez sem condições políticas de endurecer mais na prática a política de juros, parece ter conseguido realinhar expectativas no grito. A ponta desencapada desse fio se relaciona com a hipótese de persistência na escalada do dólar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

Só para assinantes