Tributação pode azedar ETFs de fundos imobiliários que pagam dividendos
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Eternos queridinhos dos investidores, por gerar renda passiva recorrente, os FIIs (fundos de investimentos imobiliários) já reúnem vários adeptos e os ETFs (fundo que replica o desempenho de um índice na Bolsa) desta categoria nascem como uma ótima oportunidade para destravar o mercado de fundos passivos de renda no Brasil. Mas terão um claro inimigo nessa jornada: a tributação dos dividendos.
Segundo a B3, é a Receita Federal que vai definir se os dividendos dos ETFs de FIIs serão tributados e qual será a alíquota. Quando anunciou a novidade, a Bolsa brasileira não deixou claro para o investidor qual seria o imposto, até porque ela mesma não tinha as informações. Mas o mercado financeiro já especula que seja uma alíquota de 15% sobre os dividendos, da mesma forma que aconteceu com os ETFs de ações que fazem distribuições, lançados a partir de 2023.
O UOL procurou a Receita Federal para esclarecimentos sobre a taxa e se haveria possibilidade de isenção. Atualizaremos esta reportagem se tiver um retorno.
A grande questão é que tributar os dividendos dos ETFs de FIIs em 15% seria um tiro no pé, capaz de minguar a atratividade do novo produto. Isso já aconteceu no passado.
É só olhar para os ETFs que pagam dividendos atualmente, tinham tudo para brilhar na Bolsa, mas apresentaram um crescimento tímido. Desde 2023 até agora, apenas seis ETFs do tipo foram lançados: NDIV11, SPYI11, DIVD11, QQQI11, COIN11 e IWMI11. Juntos, já reúnem 30 mil investidores até janeiro de 2025, enquanto o total de ETFs listados na B3 soma 595 mil cotistas.
Na época, quando começaram os lançamentos a crítica era a mesma, porque pagar 15% no imposto nos dividendos de ações, se atualmente ao comprar diretamente a ação na Bolsa de Valores, o dividendo ainda é isento? Claro que o juro sobre capital próprio (JCP) é tributado, também em 15%. Mas não era uma relação justa.
A mesma lógica se aplica aos FIIs, que atualmente têm os seus dividendos isentos de imposto.
Os ETFs relacionados ao mercado imobiliário também são poucos na Bolsa. Só temos três, relacionados a FIIs e REITs (Real Estate Investment Trust, equivalentes aos FIIs globais). Mas eles não pagam dividendos, pois seguem índices total return. São o XFIX, focado em FIIs, e os de REITs ALUG11 e URET11. Estes 3 ETFs já reúnem 27 mil investidores.
A B3 afirmou ao UOL que várias gestoras demonstraram interesse em criar ETFs de FIIs e REITs focados em proporcionar renda passiva regular para os investidores. O objetivo com a liberação da listagem é fortalecer ambos os produtos, ETFs e FIIs, e diversificar o mercado para investidores pessoa física e institucionais.
"A criação de novos produtos pode atrair mais investidores e aumentar o volume de negociações no segmento. É o papel da Bolsa desenvolver a liquidez do mercado", destaca a B3. Será que essa novidade vai decolar?
O que opinam os analistas?
Os analistas de FIIs estão divididos sobre os ETFs que pagam dividendos. O consenso, porém, é que sem isenção tributária nos proventos, eles não serão competitivos frente aos FIIs, cujos dividendos são livres de imposto.
"Qual o sentido de investir em algo que retira sua isenção? É como comprar FII na pessoa jurídica ou via holding e perder o benefício. Não faz sentido", comenta Rodrigo Medeiros, fundador e analista de FIIs do Desmistificando Research. Para ele, os ETFs podem facilitar a diversificação, mas os FOFs (FIIs que investem em outros fundos) já cumprem esse papel no mercado.
Maria Fernanda Violatti, analista de FIIs, vê vantagens para investidores iniciantes, que podem diversificar com pouco capital e ter uma fonte de renda regular. "A liquidez dos ETFs facilita a compra e venda, além de garantir exposição a vários FIIs, diluindo o risco de cada um dos ativos", destaca. Ela também ressalta a gestão profissional e a possibilidade de rentabilidade igual ou superior ao índice de referência replicado.
As desvantagens, segundo Violatti, incluem a tributação dos dividendos e a taxa de administração, que reduz a rentabilidade. "Outro ponto é a falta de controle da carteira, já que o investidor pode acabar exposto a FIIs que não escolheria de forma individual", acrescenta.
Felipe Sousa, analista de FIIs da Eleven Research, não vê os FOFs como ameaça aos ETFs, pois muitos perdem para o IFIX (Índice de Fundos Imobiliários), enquanto os ETFs de FIIs podem entregar retornos equivalentes ou superiores.
Já Caio Nabuco de Araújo, analista de FIIs da Empiricus Research, acredita que, mesmo com desafios, os ETFs de FIIs que pagam dividendos representam uma evolução para a indústria, fortalecendo o setor, principalmente pela atratividade da renda mensal.
Leonardo Garcia, analista da TRX Investimentos, sugere que índices temáticos de FIIs - como shoppings, varejo ou lajes corporativas - poderiam tornar os ETFs mais atraentes, permitindo investimentos setoriais sem comprar ativos individuais.
Mas todos concordam: a tributação de 15% sobre os dividendos precisa ser resolvida. "A classe de ETFs de FIIs precisa trazer uma rentabilidade muito positiva para que ela seja competitiva com os fundos imobiliários. Isso envolve a tributação dos dividendos e a taxa de administração", opina Violatti.
Os analistas também acreditam que este é um bom momento para este tipo de lançamentos, pelos FIIs estarem descontados e terem oportunidade de valorização. Os ETFs indiretamente também poderiam atrair mais investidores para os FIIs.
O que acham os gestores de ETFs?
O UOL conversou com gestoras que já trabalham com ETFs de FIIs ou REITs, sem proventos, para entender o impacto da novidade. E também com gestoras ativas no lançamento de ETFs que pagam dividendos.
Na XP Asset, responsável pelo XFIX (único ETF que segue o IFIX na Bolsa) e pelo URET11 (de REITs), a visão é positiva, mas a tributação ainda é um entrave. A gestora defende que FIIs e ETFs de FIIs deveriam ter o mesmo tratamento tributário, sem impostos.
"Faz parte da nossa estratégia ter um ETF de FII que pague dividendos, mas sem isenção fiscal, essa opção se torna menos eficiente para nossos investidores, por isso não vemos espaço para lançamentos até uma equiparação tributária", diz Danilo Gabriel, gestor de fundos indexados e internacionais da XP Asset. Para ele, ETFs que reinvestem dividendos favorecem o juro composto no longo prazo, enquanto os que pagam proventos geram renda periódica. "Ambos podem coexistir, mas mais opções seriam bem-vindas", acrescenta.
Na Investo, gestora do ALUG11, o impacto da novidade será limitado. Cauê Mançanares, CEO da Investo, explica que os REITs são empresas do setor imobiliário americano, não fundos, e podem não se encaixar na nova regra da B3. Já sobre ETFs de FIIs com proventos, ele só vê viabilidade de lançamentos quando a tributação do dividendo e a liquidez forem resolvidas. "FIIs são fundos fechados, e muitos possuem ativos ilíquidos, o que pode dificultar a estruturação e liquidez do ETF", aponta.
Flávio Mantesso, sócio-fundador da Wise Capital, comenta que a empresa um ETF de REITs que paga proventos já aprovado, mas que ainda não foi lançado, por conta de condições macroeconômicas conturbadas. É o WISE11, que reúne uma cesta de 400 REITs, de 26 países. O fundo vai oferecer pagamento trimestral de dividendos. "O momento atual está mais propicio e estamos otimistas quanto às novidades em breve. Estamos trabalhando nisso", aponta o gestor.
Mantesso vê 2025 como um bom ano para os REITs, com juros globais mais baixos e crescimento econômico robusto. "Esse cenário pode impulsionar ainda mais o desempenho dos REITs, criando oportunidades de valorização", diz.
Sobre os ETFs de FIIs com proventos, ele acredita que podem atrair parte dos investidores de FIIs, mas reforça: "Muitos apreciam a seleção e gestão ativa da carteira. Para esse tipo de investidor, os ETFs de FIIs com dividendos são um complemento, não um substituto".
Mantesso aposta na democratização do mercado de FIIs. "Os novos ETFs com distribuição de proventos trazem uma dinâmica interessante, mas não vejo isso reduzindo a atratividade dos produtos já consolidados, como ETFs de FIIs e REITs que não fazem distribuições", comenta.
Renato Nobile, gestor e analista da Buena Vista Capital, que lidera lançamentos de ETFs que pagam dividendos, afirmou que trabalha em um novo produto nessa nova linha de ETFs de FIIs com distribuição mensal. "Não podemos divulgar detalhes, mas teremos uma novidade positiva em breve. Um produto inovador", revelou. No entanto, reforça que a tributação do dividendo ainda gera confusão entre investidores e precisa ser resolvida.
Para ele, o momento é oportuno, pois os juros elevados tornaram esses produtos menos atrativos, mas agora há um cenário favorável para lançamentos. "Os ETFs de FIIs com proventos terão boa aceitação tanto entre investidores institucionais quanto pessoa física", conclui.
E os provedores de índices?
Os provedores de índices ainda não demonstraram muita movimentação para criar mais alternativas no formato price return (com distribuição de proventos) para FIIs e REITs.
Paulo Sampaio, diretor sênior da S&P Dow Jones Índices na América Latina, destaca que ETFs com pagamento de dividendos atraem investidores, o que pode aumentar o interesse por esse tipo de produto. "Temos algumas demandas de clientes para criar índices de produtos que pagam remuneração mensal", afirma.
Sampaio lembra que a inclusão do Brasil no GICS (Global Industry Classification Standards) pela S&P e MSCI torna REITs como instrumentos elegíveis, o que traz mais clareza e transparência, elevando a indústria de FIIs a um novo patamar e despertando o interesse de investidores internacionais.
O UOL também contatou a Teva Índices, que preferiu não comentar sobre possíveis pedidos de clientes referentes a índices de FIIs e REITs com distribuição de proventos. Mas a provedora já tem alguns formatos neste segmento imobiliário, mas total return (sem distribuição de proventos).
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