Katherine Rivas

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Reportagem

O dilema do BBAS3: como ser conservador, sexy e sem perder para o Itaú?

O Banco do Brasil (BBAS3) vive um paradoxo. Para 2025, tem planos ambiciosos com o consignado privado, mas a inadimplência do agronegócio e os juros elevados forçaram o banco a adotar projeções mais conservadoras.

A gestão evita admitir uma possível desaceleração no lucro líquido, o ROE (Retorno sobre Patrimônio Líquido) e o payout (parcela do lucro líquido destinada a proventos), o que poderia afastar investidores.

Geovanne Tobias, vice-presidente de gestão financeira e de relações com investidores do BB, reforçou essa postura ao afirmar que o "Banco do Brasil é muito melhor que o Itaú".

Para driblar o descontentamento do mercado e dos investidores, o BB adotou estratégias "criativas" de comunicação. A projeção de lucro líquido ajustado para 2025 aumentou apenas R$ 1 bilhão em relação a 2024, variando entre R$ 37 bilhões e R$ 41 bilhões. No payout, o BB voltou a usar intervalos: de 45% em 2024 para uma faixa entre 40% e 45% em 2025, algo que não fazia desde 2019. Já o ROE, que foi de 21,4% em 2024, é projetado para cerca de 20% em 2025, patamar tido como sustentável e saudável.

Investidores e analistas estão divididos. Enquanto a ação BBAS3 continua atraente pelos dividendos - com oito pagamentos programados para 2025 -, alguns analistas e acionistas preferem manter sua posição ao invés de ampliar investimentos, devido à postura conservadora do banco.

Em conversa com jornalistas, a gestão do BB deixou pistas sobre o que espera de 2025. Confira alguns destaques:

Lucro conservador

A projeção de lucro líquido ajustado do BB para 2025 é entre R$ 37 bilhões e R$ 41 bilhões, com possibilidade de queda de 2,4% no pior cenário e alta de 8,2% no melhor, segundo Regis Chinchila, da Terra Investimentos. Em 2024, o lucro cresceu 6,6%, chegando a R$ 37,9 bilhões.

Geovanne Tobias explica que a meta do banco estatal é entregar lucro líquido de R$ 41 bilhões, com foco em eficiência, controle rigoroso de custos. "Queremos entregar a faixa mais alta do guidance, no lucro, payout e outras projeções".

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Ele destacou o foco maior no crédito para pessoas físicas, principalmente com o eSocial, linha de consignado privado. "Estamos cientes dos desafios que temos em 2025, com juros e inadimplência. Continuaremos trabalhando com linhas mais seguras", afirmou.

Além disso, esclareceu que o conservadorismo no lucro não tem a ver com o índice de capital do banco, que estaria robusto o suficiente para expandir e financiar negócios.

"O ajuste no lucro e no payout é para nos dar flexibilidade para otimizar nosso capital, garantir um retorno adequado aos acionistas e financiar a expansão", acrescentou Tobias.

ROE

O Banco do Brasil busca um ROE (Retorno sobre Patrimônio Líquido) de cerca de 20% para 2025, com crescimento sustentável.

Tobias manifestou que o olhar é de longo prazo e não apenas crescer por crescer. "Não nos interessa entregar um ROE de 30% no curto prazo que o BB não seja capaz de sustentar. Um ROE na faixa dos 20% é condizente com a situação macroeconômica do Brasil, a estrutura de balanço e os negócios que o BB atua", afirmou ele.

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O crescimento da carteira de pessoa física, mantendo a qualidade, poderia melhorar a rentabilidade, segundo Tobias.

O ROE preocupa alguns analistas. Bruno Oliveira, do Vida de Acionista, acredita em um ROE entre 18% e 19% em 2025. Na visão dele, um ROE ideal seria a partir de 18%, embora considere acima de 20% uma rentabilidade excelente. Já abaixo de 15% é preocupante.

Já Pedro Ávila, da Varos Research, espera um ROE entre 19% e 20%, com um lucro líquido entre R$ 38 bilhões e R$ 39 bilhões.

Payout e dividendos

O anúncio de que o BB terá um payout entre 40% e 45% do lucro dividiu opiniões. A última vez que o banco usou intervalos para o payout foi em 2019, sempre pagando o menor percentual. Contudo, a gestão garante que, em 2025, o objetivo é alcançar a ponta alta da faixa, ou seja, 45%.

Tobias explicou que o BB observou os próximos três anos ao definir o intervalo, levando em consideração expectativas de resultados, taxa de juros e nível de capital. "Essa faixa visa dar flexibilidade à gestão e garantir uma remuneração atrativa aos investidores", afirmou. O objetivo é ajustar o payout para 45% ao longo do ano, conforme os resultados se concretizem.

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Tarciana Medeiros, CEO do BB, destacou o compromisso com a transparência e que, embora o objetivo seja a ponta alta, a postura cautelosa nas projeções evita alterações ao longo do ano.

Os analistas têm opiniões diversas sobre o payout. Chinchila acredita que, devido à cautela do mercado, o payout ficará em 40%. Oliveira também aposta no valor mais baixo, devido ao histórico do banco com faixas, e estima proventos líquidos de R$ 2 por ação. "O investidor receberá menos dinheiro do BB neste ano", pontuou. Já Ávila, da Varos, aposta em 45% devido ao crescimento moderado da carteira de crédito, o que exigiria menos capital.

Marco Saravalle, da MSX Invest, concorda e acredita que com o crescimento mais conservador das carteiras de crédito e uma inadimplência mais controlada, o payout facilmente chegaria aos 45%.

Milton Rabelo, analista da VG Research, trabalha com uma faixa média de 43% de payout, mas acha difícil recuar até 40%, dada a necessidade da União em receber dividendos para ajudar nos déficits fiscais.

Situação do agro

A inadimplência de mais de 90 dias da carteira do agronegócio, que chegou a 2,45%, gerou preocupação no mercado. Medeiros destacou que o banco já trabalha na recuperação dessa carteira e na redução da inadimplência no agro em 2025. Embora não tenha cravado uma data para melhorias, a CEO mostrou otimismo com a safra recorde e o crescimento de 6% no PIB agro. "A expectativa é que o risco de crédito no agro se acomode ao longo deste ano", afirmou.

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Tobias acrescentou que se trata de renegociações pontuais com alguns clientes, não uma crise generalizada. "No 1° e 2° trimestre teremos a safra, depois a safrinha, acreditamos na capacidade dos agricultores que se endividaram e fizeram investimentos, para que com a safra recorde comecem a regularizar suas situações", disse.

A carteira de agronegócio atingiu R$ 400 bilhões, e o número de recuperações judiciais no agro chegou a 270 no 4°TRI24. Sobre a concorrência crescente, com bancos privados entrando no agro, Medeiros não demonstrou preocupação e ressaltou que o BB continua líder no segmento e em participação de mercado.

Crédito consignado privado

Outro ponto que chamou a atenção dos analistas foi a projeção mais robusta para o crescimento da carteira de crédito para pessoas físicas em 2025, que deve avançar entre 7% e 11%.

Questionados sobre a principal aposta do BB em relação a essa linha de crédito, os executivos mencionaram o crédito consignado privado eSocial, que permitirá acesso a linhas de spread (diferença entre o dinheiro captado e emprestado) mais atrativas, sem grande exposição ao risco de inadimplência. Por meio do eSocial, é possível fechar empréstimos descontados da folha de pagamento do funcionário, sem precisar de acordo com os RH (recursos humanos) das empresas privadas.

Líder no consignado público, o BB pretende usar sua experiência de 20 anos para dominar o consignado privado, um mercado de R$ 40 bilhões que pode chegar até R$ 300 bilhões. Atualmente, o segmento está concentrado no Santander e Itaú. "O consignado privado é um oceano azul para uma empresa que já sabe circular nesse mercado há 20 anos", afirma Medeiros.

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Além do consignado privado, o BB pretende impulsionar sua carteira de pessoas físicas com cartão de crédito e consignado público.

Visão do mercado

Apesar da postura conservadora, analistas ainda esperam dividendos atrativos do Banco do Brasil em 2025. As projeções de dividend yield (retorno em proventos) variam de 6,5% a 11%. Já para a valorização das ações, as estimativas indicam um salto de até R$ 35 a R$ 42.

O consenso do mercado, segundo o TradeMap, aponta para um dividend yield médio de 10,82% e um preço-alvo de até R$ 35,95, para a valorização de BBAS3. Chinchila vê a valorização impulsionada pela recuperação da carteira agro e o aumento das margens financeiras com a alta dos juros. Ávila acredita que fatores políticos, como o crescimento de Tarcísio de Freitas nas eleições presidenciais de 2026, podem influenciar.

Curiosamente, o governo Lula beneficiou as ações BBAS3, que valorizam 101,89% desde 2023 até o fechamento de 19 de fevereiro, superando o Itaú, que subiu 55,05%, no mesmo período. O Ibovespa avançou nesse mesmo tempo 16,02%.

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Mesmo com a pernada de alta, as ações BBAS3 seguem baratas, negociando a 0,89 preço sobre valor patrimonial (P/VP). Com os resultados que entregou, analistas acreditam que o banco poderia estar negociando a pelo menos 1,5 vezes P/VP. Para Tobias, não tem de outra: é preconceito do mercado.

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