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Mariana Londres

REPORTAGEM

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Juros e meta de inflação não podem mudar só por pressão política de Lula

Lula tem atacado os juros altos do Brasil  - CARLOS ELIAS JUNIOR/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO
Lula tem atacado os juros altos do Brasil Imagem: CARLOS ELIAS JUNIOR/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

Do UOL, em Brasília

13/02/2023 09h28

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Em uma verdadeira cruzada política contra os juros altos, o presidente Lula escolheu apontar o Banco Central e o seu presidente, Roberto Campos Neto, como os responsáveis pela permanência da Selic, a taxa básica de juros, a 13,75%. Em diversas ocasiões, Lula disse a seus interlocutores que nada explica os juros nesse patamar no Brasil.

Os juros brasileiros estavam em 2% ao ano até março de 2021. O Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) promoveu altas sucessivas até chegar a 13,75% em agosto de 2022, mantendo esse patamar nas últimas quatro reuniões.

A discussão é válida. O próprio Lula lembra que o seu vice em 2003, José Alencar, reclamava dos juros altos dia sim e outro também. Mas é preciso ter em mente que agora quem fala é o presidente (e não o vice empresário). E que, ao mirar nos juros, Lula atinge uma instituição independente por lei (o BC), responsável por manter a inflação dentro da meta estabelecida por um conselho (CMN, formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e o presidente do Banco Central), em um cenário de explosão mundial da inflação. Ou seja, muito diferente do cenário de 2003.

Desde que a crise Lula x BC explodiu há mais de uma semana, já foram abordadas as possíveis explicações para os ataques do presidente, assim como os efeitos das suas falas: mais instabilidade e, portanto, aumento dos juros futuros. Não à toa, a estratégia de Lula foi chamada de tiro no pé.

A pressão sobre Roberto Campos Neto surtiu um efeito esperado pelo presidente, já se admite rever a meta de inflação para 2023, e a discussão pode acontecer na reunião do CMN desta semana.

Para além da disputa política e suas motivações, ou dos efeitos das falas do presidente, eu procurei um economista que atua no mercado para ouvir uma opinião técnica sobre os juros no Brasil.

Leonardo Costa é economista da Asa Investments. Ele me explicou que as discussões sobre o patamar dos juros, assim como uma eventual elevação das metas de inflação, discutida também por outros países após os choques inflacionários, precisam ser técnicas, com fundamentos na teoria econômica, e não apenas pautadas por discurso ou desejo político. Leia abaixo os principais trechos da entrevista, divididos por temas:

Alterar juros é decisão técnica, não política

A decisão do Copom é uma decisão técnica que leva em consideração diversos fatores. A inflação começou a acelerar já no pós-pandemia, com sucessivos choques, o que acabou puxando os itens mais voláteis, mas também os mais relacionados à atividade econômica, as chamadas medidas de núcleo. Quando você observa essas medidas, em qualquer ótica, todas estão rodando acima do teto do regime de metas do Banco Central e com ritmo de atividade forte, isso sugere uma contração monetária [aumento dos juros]. Essa foi a motivação para subir.

Por que juros ainda não caíram

O Banco Central parou de subir os juros ao observar a inflação desacelerando, mas no horizonte de projeção ainda está acima da meta, o que justifica a manutenção do atual patamar. Isso justifica o Copom dizer que o trabalho ainda não foi feito e ainda está em território contracionista [sem espaço para baixar os juros].

Condições que fariam o BC se sentir confortável para reduzir juros

Inflação e expectativa de inflação dentro da meta, basicamente. Porque esse é o mandato do BC: entregar a inflação na meta. Se você pegar todos os textos, seja comunicado, ata ou relatório trimestral de inflação, o objetivo principal do BC é entregar a inflação na meta.

Como o BC traça o cenário de inflação

Para isso ele tem a aferição de diversas medidas, ciclo de atividades, câmbio, e para monitorar o câmbio ele olha as condições de risco do Brasil, as condições das contas externas. Ele coleta todas as informações possíveis para construir o cenário para onde a inflação está caminhando, que é o que vai dar o tom nas decisões futuras da política monetária. Todos os países que têm o regime de metas de inflação fazem isso, e o Brasil foi retardatário na autonomia do BC entre os países que têm regimes de metas de inflação.

A discussão de elevar a meta de inflação

A estabilidade é o que mais favorece os agentes econômicos e a mesma coisa acontece para a meta de inflação. Essa discussão, depois da pandemia e da guerra, acontece em outros países, que [em função da alta da inflação] discutem rever a meta de inflação. Então não é uma discussão exclusiva do Brasil. O problema é quando é uma interferência externa, porque fica parecendo casuísmo do presidente em questão, e isso pode ferir a autonomia do BC.

Meta de inflação é debate técnico

O ideal é que a meta seja definida a partir de justificativas técnicas, uma decisão teórica, mais do que um desejo político. O que a teoria econômica diz é que países em desenvolvimento acabam tendo inflação mais alta do que desenvolvidos. A provocação [de elevar a meta] é interessante, mas seria melhor se fosse mais teórica. Se politicamente e teoricamente a discussão chegar a uma conclusão de que é melhor mudar a meta, o mercado poderia acomodar, mas como está sendo feito, de um ponto de vista unilateral, parece um pouco mais complicado.

Intervenções políticas na economia costumam dar errado

O mundo é profícuo em intervenções que não deram certo, Hungria, Turquia, Argentina, e os resultados não são bons. Tem que trazer o debate para o campo técnico, sem falar apenas no valor da taxa de juros. O que o Banco Central faz é política monetária, que existe desde que abandonamos o padrão-ouro. Vai se jogar a política monetária fora? Temos que lidar com o que temos, que é a política monetária.