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Reportagem

Boeing rebate acusação de delator sobre risco do 787 se romper em voo

A Boeing rebateu nesta segunda-feira (15) as acusações feitas por um delator de que os seus aviões 787 e 777 estariam em risco e não cumpririam as normas de segurança vigente. O UOL foi o único veículo brasileiro a participar do evento realizado pela Boeing para informar como são os processos de fabricação do avião.

Embora não tenha citado diretamente as acusações feitas pelo engenheiro Sam Salehpour, que diz ter trabalhado para a empresa por mais de dez anos, o evento girou em torno dos problemas apontados por ele.

A companhia afirmou sua confiança nos processos de fabricação e negou que as denúncias procedam. As acusações estão sendo investigadas pela FAA (Administração Federal de Aviação, na sigla em inglês), órgão regulador do setor nos Estados Unidos.

Relembre o caso

Salehpour, em entrevista ao The New York Times, disse que mudanças na forma como é feita a junção de partes da fuselagem do 787 durante sua produção pode resultar em problemas para o avião ao longo do tempo. Mais especificamente, a fuselagem, que é o corpo do avião, poderia se romper após mil ciclos, que consistem em um pouso e decolagem cada um.

O engenheiro ainda disse ao jornal que foi retaliado diversas vezes pela empresa sobre suas preocupações quanto às mudanças no processo de fabricação do 787. Salehpour disse que após as queixas, foi transferido para a produção de outro avião, o 777, e também apontou possíveis problemas na montagem dessa aeronave.

Como os aviões são montados?

Boeing 787 em montagem na fábrica da Boeing nos EUA
Boeing 787 em montagem na fábrica da Boeing nos EUA Imagem: Boeing

As fuselagens dos aviões são montadas em partes, que chegam de vários fabricantes. Essas seções chegam à linha de montagem final e são unidas após terem sido enviadas de diferentes fabricantes.

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É o caso da cauda, cabine, asas e do corpo em si do avião, onde os passageiros ficam acomodados. Todas elas chegam, praticamente, prontas à fábrica da Boeing nos EUA e são unidas, formando o corpo do avião.

Essa junção é feita com métodos próprios, e dezenas de milhares de rebites são utilizados para fixar uma parte na outra, garantindo que todo o avião se comporte como uma peça única. Após essa junção, o avião termina de ser finalizado, momento em que o interior é montado, equipamentos são colocados, estruturas são concluídas, a parte elétrica é conectada, a pintura é feita, entre outros processos.

O que a Boeing diz

A Boeing afirmou que a mudança é acompanhada de diversos estudos, e que todos os dados sobre os novos procedimentos são disponibilizados à FAA, órgão equivalente à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) no país. Segundo a empresa, não foi uma simples alteração no processo de fabricação, mas uma mudança de engenharia necessária para controlar a tolerância da montagem e melhorar os resultados, e todas essas medidas são analisadas por comitês internos, além de o resultado das alterações ser analisado por testes em componentes reais.

No caso do 787 em particular, a empresa informou que pode haver uma folga de até cerca de 1 mm entre elas. Caso ela exista, são colocados calços específicos para garantir que as peças se encaixem perfeitamente e que a estrutura não sofra esforços desnecessários. A forma como isso é feito foi um dos pontos atacados pelo ex-engenheiro da empresa.

Mesmo após a fabricação, são realizados testes nos aviões prontos para garantir que não há falha nesse sentido. Ainda, a empresa faz testes nos materiais para levá-los ao limite para antever qualquer problema futuro.

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A Boeing também realiza testes em escala de todos os componentes e materiais de suas aeronaves. São mais de 100 mil testes de corrosão e de desgaste em materiais, cerca mil testes em componentes já montados, além de testes em um avião em tamanho real.

A Boeing ainda afirma que possui uma política de incentivo à participação dos funcionários, e que não aceita retaliações. Eles podem questionar a companhia sobre os procedimentos adotados, normas de segurança, e isso é possível de ser feito de maneira anônima.

Testes exaustivos

Estrutura montada com avião real para realização de testes de fadiga da aeronave: Boeing 787 já passou por mais de 165 mil ciclos de teste, enquanto o modelo tem vida útil de 44 mil ciclos
Estrutura montada com avião real para realização de testes de fadiga da aeronave: Boeing 787 já passou por mais de 165 mil ciclos de teste, enquanto o modelo tem vida útil de 44 mil ciclos Imagem: Boeing

A Boeing mantém aviões já montados em sua fábrica para realizar testes práticos. Um dos 787 de testes já passou por mais de 165 mil ciclos de pousos e decolagens simulados, com máquinas que forçam o avião para forças mais de 150% além do que eles foram projetados.

O ciclo de vida do avião é de cerca de 44 mil pousos e decolagens ao todo durante toda sua vida útil. Ou seja, já foram feitos testes quatro vezes mais do que um avião enfrentaria em uma situação real ao longo da sua vida

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Entre alguns dos testes, as asas são puxadas em diversos sentidos, vários metros para cima e para baixo, para saber qual será o seu comportamento. Também existe um teste tradicionalmente feito com a asa, onde ela é forçada até se romper, para saber, na prática, o quanto ela aguenta.

Ao mesmo tempo, o corpo do avião é pressurizado e despressurizado inúmeras vezes para testar se não haverá nenhum estresse dos materiais ou se a fuselagem não se rompe devido a algum desgaste. Os testes foram avaliados pela FAA, segundo a fabricante e, após todos esses ciclos, não foram encontradas falhas decorrentes de fadiga nos materiais da fuselagem do 787.

Avião já teve outros problemas

Entre 2021 e 2022, a Boeing suspendeu a entrega dos 787 enquanto analisava problemas em sua fabricação. À época, a empresa anunciou que componentes de titânio do avião haviam sido fabricados com defeito durante três anos.

Eram peças que auxiliam a prender o piso do avião, presilhas e clipes de componentes. Mesmo sem nenhum deles ser estrutural, a empresa parou as entregas por segurança e chegou a ficar com um total de US$ 25 bilhões em aeronaves paradas na época.

Em 2013, a frota mundial do 787 foi impedida devido a problemas em suas baterias. Em janeiro daquele ano, funcionários que faziam a limpeza de um 787-8 da Japan Airlines detectaram fumaça a bordo pouco após o pouso, realizado nos EUA.

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Equipes de manutenção encontraram chamas no compartimento da bateria. Ninguém se feriu, e, após revisar os procedimentos de segurança das baterias, a FAA liberou o 787 para voltar a voar novamente.

O 787

A aeronave é uma das mais avançadas na atualidade, tendo iniciado sua operação comercial em 2011. Ela deriva do 777, modelo que voou pela primeira vez na década de 1990 e com a qual a pilotagem é muito parecida.

Seu grande diferencial é possuir uma alta quantidade de peças feitas de materiais compósitos, que são mais avançados. É o caso da fuselagem, fabricada com fibra de carbono, o que diminui seu peso e, consequentemente, consome menos combustível.

Sua principal função é realizar voos longos com elevado número de passageiros, como os internacionais. No Brasil, o modelo é operado pela Latam. O UOL já visitou o modelo no centro de manutenção da empresa. Veja aqui.

Ficha Técnica
Modelo: Boeing 787
Capacidade (duas classes): 248 passageiros (787-8), 296 passageiros (787-9) ou 336 passageiros (787-10)
Altura: 17 metros
Envergadura (distância de ponta a ponta das asas): 60 metros
Comprimento: 57 metros (787-8), 63 metros (787-9) ou 68 metros (787-10)
Distância máxima de voo: 13.530 km (787-8), 13.950 km (787-9) e 11.750 km (787-10)
Peso máximo de decolagem: 254 toneladas (787-10)
Velocidade: cerca de 1.000 km/h

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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