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É possível ganhar na Bolsa apostando que as ações caiam, mas é arriscado

Ganhar dinheiro apostando na queda de uma ação é operação legal, mas de muito risco, dizem profissionais de mercado - Getty Images/iStockphoto/denphumi
Ganhar dinheiro apostando na queda de uma ação é operação legal, mas de muito risco, dizem profissionais de mercado Imagem: Getty Images/iStockphoto/denphumi

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

17/02/2021 04h00

Resumo da notícia

  • Operar vendido, o chamada short selling, é forma de ganhar na Bolsa apostando na desvalorização de uma ação
  • Veja quando esse tipo de negócio é usado e quais os riscos que o aplicador assume
  • Entenda diferenças entre short selling, operação legal, e short squeeze, como da StopGame, considerada ilegal

Ganhar dinheiro na Bolsa apostando contra uma empresa é algo quase tão comum quanto lucrar com a valorização de uma ação. Mas o assunto ganhou popularidade depois que pequenos investidores pegaram de calças curtas grandes aplicadores que tinham colocado dinheiro esperando a desvalorização da GameStop, uma rede de lojas de games nos Estados Unidos.

Uma operação que dá lucro se a ação cair é conhecida como operar vendido ou também short selling. Da mesma forma que alguém investe porque acredita que uma companhia tem motivos para crescer, faturar e lucrar mais, há casos em que o aplicador vê um cenário negativo para uma companhia, esperando uma redução do negócio.

Segundo profissionais de mercado, as duas análises são legítimas, legais e ambas oferecem risco ao aplicador. Não é uma questão de justo ou injusto.

Há circunstâncias em que o valor de um ativo sai do equilíbrio, em especial quando há assimetria de informação. Como o mercado tende a ser eficiente, em algum momento, há uma convergência dos preços para o valor justo do papel. Então, a pessoa não aposta contra uma empresa, mas a favor do bom funcionamento de mercado.
Felipe Miranda, fundador e estrategista chefe da casa de análise Empiricus

Veja quando e como, segundo profissionais de mercado, investidores apostam na queda de uma ação para faturar e os riscos que esse tipo de negócio envolve.

O que é operar vendido/short selling? Nessa operação, o investidor ganha quando uma ação se desvaloriza. Quanto mais uma empresa perder valor, maior o ganho do aplicador vendido.

Por que investir na queda de uma ação?

Existem alguns motivos que levam um investidor a colocar dinheiro em uma operação que dá lucro se uma ação se desvalorizar, segundo profissionais de mercado:

Preço fora do lugar: Esse é o motivo mais comum de quem opera vendido ou faz short selling. Quem investe apostando na desvalorização de uma ação acredita que aquela empresa está com um valor de mercado acima do que deveria ser o justo.

Esse aplicador acredita que em algum momento, outros investidores terão a mesma percepção e, assim, a ação vai cair de preço.

O valor de uma ação no longo prazo nada mais é do que a projeção de crescimento para uma empresa ao longo de um período. Quando o investidor acredita que a empresa vai crescer e passar a valer menos no futuro, ele pode assumir uma posição que ganha com isso.
Betina Roxo, estrategista-chefe da Rico Investimentos

Operar mesmo com Bolsa em baixa: Quando a Bolsa está numa onda negativa, com a maioria das ações em baixa, operar vendido é uma forma de seguir ganhando algum dinheiro sem ter que esperar a maré virar.

Como funciona operar vendido? Para operar vendido, o investidor precisa vender hoje a ação por um preço maior que ele terá no futuro. Mas como vender a ação antes de comprar o papel?

Aí entra o aluguel da ação. Veja então o passo a passo.

  1. Primeiro passo: aluguel da ação. Na Bolsa é possível alugar uma ação por um tempo. Alguém empresta a ação por um período, por exemplo, de uma semana, cobrando uma taxa por isso.
  2. Segundo passo: venda da ação alugada: A pessoa vende a ação que havia alugado. É a chamada venda a descoberto porque o aplicador está vendendo algo que de fato não possui definitivamente, pois aquele ativo está alugado.
  3. Terceiro Passo: compra da ação no mercado. O aplicador vendido tem que voltar à Bolsa para comprar a mesma ação, afinal, ele precisa devolver o papel que havia alugado do emprestador.

Por que alguém aluga a própria ação? É uma forma de fazer um dinheiro extra com a ação sem se desfazer do investimento.

Como aparece o lucro? Comprar mais barato do que vendeu antes. Suponha uma ação X que custava R$ 100 no começo da semana. O aplicador acredita que esse papel vai cair. Ele então toma emprestada essa ação e paga a quem lhe emprestou uma taxa, de digamos, R$ 2,00.

Ao fim do período do empréstimo, essa empresa se desvalorizou para, suponhamos, R$ 90,00. O aplicador vendido então vai ao mercado, compra a ação da mesma empresa por R$ 90, devolve o papel que havia tomado do emprestador, paga a ele taxa de R$ 2,00 e embolsa o lucro, nesse caso, de R$ 8,00.

Quais os custos? Para fazer esse tipo de operação, o investidor vai ter que pagar o aluguel da ação, mais as taxas de negociação cobradas pela corretora e de operação, à Bolsa. Se lucrar, vai pagar 15% sobre o ganho pelo Imposto de Renda.

Além desses recursos, a pessoa precisa ter algum dinheiro, que é depositado na corretora como garantia, a chamada margem. É como um cheque caução para cobrir perdas no caso de o negócio dar errado. Se tudo der certo, o aplicador pega esse dinheiro de volta.

Quais os riscos? Se falhar a previsão do investidor que apostou contra uma empresa, ele terá prejuízo. Uma perda que pode ser muito maior do que o valor aplicado no negócio, por isso, operar vendido é muito arriscado.

O ganho é limitado a quase 100% do dinheiro aplicado, mas o potencial de perdas é, na prática, infinito. Isso acontece se a empresa contra a qual a pessoa está apostando começar a se valorizar e vez de cair.

A desvalorização de uma ação tem limite - o papel não pode valer menos que zero. Assim, quem vendeu uma ação a R$ 100, na hora de recomprar pode ter um lucro de até R$ 99,99 se, por um acaso, aquela ação desabar para R$ 0,01, digamos.

Já no sentido oposto, não há limites. No exemplo acima, se a ação que a pessoa vendeu por R$ 100 subir a R$ 110, na hora de devolver o papel ao emprestador, o aplicador que estava apostando contra essa empresa vai gastar mais do que recebeu no começo da operação. E ainda vai ter que pagar o aluguel do papel.

E se esse papel for a R$ 200, ou R$ 1 mil? Quem precisa ir ao mercado para recomprar a ação para devolver ao emprestador estará em péssima situação. Quanto maior a valorização dessa ação, maior o prejuízo de que apostou contra.

O risco de operar vendido é maior para operações que envolvem ações com pouca liquidez, aquelas que têm poucos negócios, porque elas podem apresentar uma oscilação grande preço.
Rafael Gouveia, chefe de renda variável da Speed Invest.

Foi o que aconteceu nos primeiros dias em que pequenos investidores combinaram de comprar juntos ações da GameStop.

A empresa tem histórico de poucos negócios. Mas com a ação combinada por pequenos investidores por meio de redes sociais, de um dia para o outro, os papéis explodiram de valor e quem estava apostando na queda da ação teve que se virar.

Aconteceu o chamado short squeeze.

Short selling é diferente de short squeeze

Quando vários aplicadores agem de forma combinada comprando ações de uma companhia para alimentar uma valorização rápida desse papel e, assim, levar prejuízo a quem apostou na queda dessa mesma ação, essa operação é chamada de short squeeze - espremer o investidor que estava vendido.

Mas essa operação é considerada ilegal pelos órgãos reguladores de mercado. Tanto que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) soltou nota ao mercado destacando isso quando investidores brasileiros tentaram reproduzir com a ação da resseguradora IRB a atuação do caso GameStop.

O short squeeze não é modalidade de investimento, como o é short selling. Especialmente quando o valor das ordens de compra não tem nenhum fundamento. É uma operação combinada entre vários agentes de mercado com o objetivo maior de levar prejuízo a outros investidores. Isso sinaliza manipulação de mercado para criação de um preço artificial.
Guilherme Cooke, diretor de compliance e jurídico da distribuidora de títulos e valores mobiliários Vitreo

Segundo Cooke, movimentos de pequenos investidores que se organizam por redes sociais pode ser bastante saudável para o mercado sem ter que recorrer ao short squeeze patra influenciar preços de ações.

"Esses investidores podem fazer ações positivas, como por exemplo, influenciar o futuro de uma companhia votando de forma conjunta em assembleias, por exemplo. Existe um lado muito positivo nisso", diz o advogado e sócio da Vitreo.