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Quem ganha e quem perde com a possibilidade de apagão?

Nivaldo Souza

Colaboração para o UOL, de São Paulo

03/06/2021 04h00

Exatos 20 anos depois da crise de racionamento de energia no país, um novo risco de apagão coloca em xeque a capacidade de resposta do sistema elétrico ante o baixo nível nos reservatórios das hidrelétricas, responsáveis por 63% de toda eletricidade consumida pelos brasileiros.

Nessa história, está claro que os consumidores são os mais prejudicados, e começam a sentir no bolso a pressão imposta pela incerteza no abastecimento. Mas há quem "ganhe" com esse cenário, segundo especialistas ouvidos pelo UOL Economia+, e quem investe na Bolsa pode ganhar com empresas que fazem parte da solução, e não do problema.

Confira o que disseram os especialistas, e entenda quem pode ganhar ou perder diante da possibilidade de uma nova crise energética.

Quem perde: consumidores devem sentir no bolso a crise energética

A sinalização unânime é de que, ao longo de 2021, a conta de luz será mais cara para consumidores residenciais, comércios, empresas de serviços e indústrias. Na semana passada, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu adotar a bandeira tarifária vermelha no segundo patamar. Isso significa cobrar o valor adicional de R$ 6,243 para cada 100 quilowatts-hora consumidos.

Os analistas consideram que a situação atual tende a ser menos grave que crises anteriores, como as de 2000 e 2014, porque o país ampliou as fontes energéticas com geração por biomassa, eólica, solar e termelétricas.

O Credit Suisse, por exemplo, afirma em relatório que o aumento de 30% na capacidade de geração desde 2014 diminuiu a dependência de hidrelétricas, cuja participação no sistema naquele ano era de quase 68%. "O sistema brasileiro é mais adequado para absorver os impactos em comparação com a crise hídrica de 2014", afirma o banco no documento.

Ilan Arbetman, especialista em energia da Ativa Investimentos, não elimina completamente o risco de apagão, mas afirma haver um "sistema robusto" para enfrentar a crise. "O setor elétrico tem lidado com crises nos últimos 20 anos. Mas hoje a gente tem um sistema mais robusto em relação à principal crise, que foi no início dos anos 2000", compara.

Quem ganha: empresas que fazem parte da solução do problema são opções para investidores

O sistema energético está dividido em três áreas: geração, transmissão e distribuição. Há empresas individualmente envolvidas em cada uma dessas etapas. Outras companhias têm atuação cruzada, operando em mais de um segmento. Elas devem sofrer algum tipo de pressão, positiva ou negativa, seja no valor de ações, aumento de gastos ou maior lucro com oportunidades surgidas da crise.

Na avaliação de Arbetman, a baixa nos reservatórios deve pressionar mais o desempenho de empresas concentradas na geração hidrelétrica. É o caso da Cesp (CESP3), AES Brasil (AESB3), Engie (EGIE3) e Eletrobras (ELET3). Já a redução de demanda causada pela restrição de consumo por racionamento prejudicaria potencialmente as empresas que atuam na distribuição - como Equatorial Energia (EQTL3), Energisa (ENGI3), Cemig (CMIG3) e Light (LIGT3).

Enquanto companhias de transmissão, como Taesa (TAEE3) e Isa Cteep (TRPL4), estão menos expostas que as geradoras.

O investidor, principalmente o estrangeiro, busca fluxo de caixa mais previsível. As empresas de transmissão estão menos expostas que as geradoras e são grandes pagadoras de dividendos. Então, devem atrair esse investidor.
Vitor Santos, especialista da Valor Investimentos

Saem na frente empresas de geração eólica, solar e térmicas, especialmente as que operam com gás natural (menos poluentes).

Santos avalia ser este o caso da Ômega (OMGE3), que atua em geração de energia eólica, e a Eneva (ENEV3), que opera na geração térmica. São ações com potencial de alta na Bolsa, afirma o especialista.

As ações da Ômega saíram da baixa de R$ 36,50, em meados de maio, para R$ 39,62, na última terça-feira (1º). Movimento similar ao da Eneva, que evoluiu de R$ 14,58 no início de maio para R$ 18,24 no primeiro pregão deste mês. "Essas duas empresas estão sendo beneficiadas'', diz.

Investidores devem observar economia

Apesar do cenário pontual que a crise hídrica pode proporcionar para ações de empresas, o risco para a economia como um todo é ponto de atenção que o mercado observa. O principal medo, segundo especialistas, é de alta descontrolada da inflação, o que pressionaria o Banco Central a aumentar bruscamente a taxa básica de juros (Selic) a fim de evitar uma disparada de preços.

Vitor Sousa, analista da Genial Investimentos, considera o "cenário ruim". Ele observa que se o próximo período chuvoso for tão ruim quanto o anterior, a restrição brusca no fornecimento de energia será inevitável.

"O problema maior é caso isso transborde para além do setor elétrico, com medidas que comecem afetando a indústria e a economia real", afirma.

Economia real é aquela sentida pelos brasileiros, e trata de geração de emprego e renda, principalmente.

O crescimento de 1,2% do PIB no primeiro trimestre ocorreu com o aumento de 7% no consumo de energia.

Arbetman considera que a retomada econômica está ameaçada por uma eventual falta de suprimento energético. "O grande medo é que a crise hídrica impacte esse processo de recuperação, que a gente espera que o país tenha", afirma.

Recuperação mais lenta da economia não é boa para as empresas e nem para os investidores.

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