Perdi dinheiro ao investir nas Americanas: posso receber indenização?
Quem comprou ações das Americanas recentemente pode ser indenizado pela perda do valor das ações, depois que a empresa divulgou um rombo contábil, viu suas ações derreterem e pediu recuperação judicial com dívidas de R$ 43 bilhões. Mas não é tão simples: a indenização depende da comprovação de uma eventual fraude ou má-fé da companhia, e os investidores podem entrar na lista de pagamentos da empresa aos credores, que é definida na recuperação judicial.
O que pedem os minoritários?
Um grupo de acionistas minoritários representados pelo Ibraci (Instituto Brasileiro de Cidadania) já entrou na Justiça no dia 13, pedindo indenização e dizendo que a empresa "manipulou fatos e dados".
Já o Instituto Ibero-Americano da Empresa, associação que representa investidores, acionou no dia 19 a Câmara do Mercado da B3 contra as Americanas S.A. e a 3G Capital. O grupo pede indenização de R$ 500 milhões ao alegar que os acionistas teriam sido induzidos ao erro com seus investimentos e agora sofrem prejuízos com o rombo das Americanas.
O processo é de arbitragem coletiva. Essa é uma forma de evitar os trâmites tradicionais da Justiça, mas ainda conseguir compensação. Além disso, a recuperação judicial não impede o trâmite de uma arbitragem. Outros investidores que se sentirem lesados pelo rombo da varejista podem entrar no processo até a instauração da arbitragem.
Qual foi a perda no valor das ações?
Quem investe nas Americanas viu seu patrimônio despencar na última semana. De R$ 12 no dia 11, as ações foram para R$ 1, segundo o fechamento do dia 19. Desde que foi divulgado o rombo contábil, as ações já acumulam queda de 91,7%, segundo a Economatica.
Qual a situação das Americanas?
As Americanas reúnem dívidas de R$ 43 bilhões com 16.300 credores, segundo o pedido de recuperação judicial apresentado na Justiça do Rio de Janeiro. O requerimento foi aceito hoje à tarde.
Mais cedo, a empresa havia revelado ter apenas R$ 800 milhões em caixa, com uma parcela significativa "injustificadamente indisponível para movimentação". A CVM abriu investigações para apurar o escândalo contábil. Entenda aqui.
Quem são os acionistas das Americanas?
Segundo o TradeMap, a base acionária das Americanas tem a seguinte composição:
- S-Velame S.à.r.l: 15,2%
- Brc S.A.R.L.: 11,6%
- Capital International Investors: 5,4%
- Nuveen LIc: 5,1%
- Blackrock: 5%
- Carlos Alberto Sicupira: 2%
- Cathos Holding LIc: 1,1%
- Cedar Trade LIc - Credit Suisse (Brasil) S/A: 0,2%
- Outros: 54,3%
Esses outros englobam investidores que detêm ações da empresa.
Entre os investidores, constam os acionistas de referência, que são aqueles com participação relevante no capital para influenciar nos rumos da empresa. Nas Americanas, os acionistas de referência são os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira, que estão entre os mais ricos do Brasil. O trio atua junto há décadas, é dono do fundo 3G Capital (de marcas como Kraft Heinz e Burger King) e responsável pelas fusões de cervejarias que criaram a Ambev, em 2004.
Alguns diretores venderam mais de R$ 210 milhões em ações das Americanas no segundo semestre de 2022, apontam documentos publicados pela própria empresa no portal de relacionamento com investidores.
Quais os direitos de quem compra ações?
A sócia responsável pela área societária da Briganti Advogados, Mariana Giannini, diz que as Lojas Americanas têm capital aberto na B3 dentro do Novo Mercado, o nível mais alto de governança corporativa das empresas de capital aberto no país.
Por isso, as ações dos acionistas minoritários são ordinárias, ou seja, com direito a voto.
Eles têm direito de acesso às mesmas informações da contabilidade da empresa que os acionistas controladores. Eles podem pedir a instalação de um conselho fiscal para verificar os exercícios anteriores ou até eleger um membro do Conselho de Administração.
Mariana Giannini, sócia responsável pela área societária da Briganti Advogados
Amanda Visentini Rodrigues, sócia do VBSO Advogados, diz que, caso comprovada fraude, erro ou mesmo crime, os administradores podem ser responsabilizados. Assim, os acionistas poderiam buscar reparação dos danos causados pelos processos sofridos por credores.
Guilherme Champs, sócio-fundador da Champs Law, escritório de direito empresarial focado em mercado de capitais, entende que há direito a eventual indenização pelos acionistas na hipótese de má-fé ou fraude.
Caso comprovado erro, fraude ou mesmo crime, os administradores envolvidos poderão ser responsabilizados nas esferas cível, administrativa e penal, e os acionistas poderiam buscar reparação dos prejuízos sofridos via processos individuais ou coletivos.
Amanda Visentini Rodrigues, sócia do VBSO Advogados
Os acionistas perderam com esse rombo?
Pedro Simões, advogado da Duarte Garcia Serra Netto e Terra, afirma que os acionistas minoritários que tiveram papéis das Americanas por muitos anos também podem ter se beneficiado das "inconsistências contábeis", já que a distribuição dos lucros foi maior para todos, assim como para os controladores.
As Americanas pagaram R$ 333,2 milhões em dividendos no ano passado até setembro, conforme levantamento do TradeMap, Foi o maior valor já distribuído pela empresa nos últimos dez anos. Desde 2013, as Americanas e Lojas Americanas pagaram R$ 1,42 bilhão em dividendos, segundo o Trademap.
Neste caso, para que houvesse uma indenização, seria necessário comprovar um dano a uma parte em detrimento de outra - e ele entende que não há.
Seria necessário identificar um dano ou uma perda, e não estou convencido que eles [acionistas minoritários que permaneceram na varejista por muitos anos] tiveram uma perda.
Pedro Simões, advogado da Duarte Garcia Serra Netto e Terra
E quem entrou na ação recentemente?
Por outro lado, os minoritários que compraram o papel recentemente e são acionistas da empresa podem, sim, ser indenizados. O entendimento é que eles foram surpreendidos com o problema contábil da empresa. Mas ele diz que é necessário entender se os controladores foram ou não beneficiados e a ingerência que eles tinham sobre a companhia.
Em caso de fraude ou má conduta, o que os acionistas das Americanas podem fazer?
O caminho mais fácil para obter uma indenização seria aguardar uma punição administrativa dos controladores, a apuração das acusações de insider trading (pessoas com acesso à informação privilegiada) sobre os administradores e a verificação contábil.
Neste cenário, os minoritários poderiam argumentar que tomaram uma decisão de investimento com base em informações incorretas que a empresa divulgou para o mercado.
Para o investidor pessoa física, o caminho indicado geralmente é entrar em um grupo de acionistas minoritários. Isso pode ter custos e taxas com advogados.
O que acontece agora que a empresa pediu recuperação judicial?
Os acionistas que entrarem com um pedido de indenização entrariam na condição de credor das Americanas. Isso porque o "fato gerador" do pedido de indenização - a eventual fraude, se comprovada - é anterior à recuperação judicial.
A eventual indenização será paga segundo os termos do plano de recuperação judicial que as Americanas apresentarem aos credores. Ou seja, os acionistas minoritários entram em uma fila de pagamentos, que será definida por esse plano, diz Leonardo Adriano Ribeiro Dias, advogado especialista em recuperação judicial e doutor em Direito Comercial pela USP.
Isso se a responsabilidade pelo rombo recair sobre a companhia e não apenas sobre seus administradores. A movimentação dos minoritários, porém, deve ser contra os administradores, controladores ou até mesmo contra a auditoria, a depender do que ficar comprovado, dizem advogados.
Minoritários já ganharam processo contra a Petrobras
- Por conta dos desvios de recursos encontrados pela Operação Lava Jato, a estatal precisou ressarcir seus acionistas nos EUA em US$ 2,95 bilhões.
- No Brasil, as diferenças de jurisdição para os Estados Unidos dificultam uma compensação dos minoritários.
- Enquanto nos EUA a empresa foi considerada co-autora dos crimes, por conta da conduta dos administradores e controladores, no Brasil ela é considerada vítima.
- Por isso, fundos de funcionários da Petrobras, o Petros, e do Banco do Brasil, o Previ, ainda buscam reparações na Justiça.
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