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Bolsonaro cede, e governo tira reforma administrativa da gaveta

Impopular, assunto mexe com o funcionalismo público e conta com antipatia de Bolsonaro - Adriano Machado/Reuters
Impopular, assunto mexe com o funcionalismo público e conta com antipatia de Bolsonaro Imagem: Adriano Machado/Reuters

Hanrrikson de Andrade, Guilherme Mazieiro e Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

01/09/2020 12h39Atualizada em 01/09/2020 16h08

A novela sobre o envio de uma proposta de reforma administrativa ao Congresso terá um desfecho na próxima quinta-feira (3), segundo Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou hoje após reunião com o ministro Paulo Guedes (Economia) e com líderes do governo no Parlamento.

O assunto é considerado impopular porque mexe com o funcionalismo público e conta com antipatia do próprio presidente — cuja carreira política foi construída com votos de muitos representantes da categoria de segurança pública. Por esse motivo, a equipe de Guedes precisou ajustar pontos do texto que são caros a Bolsonaro, como a questão da estabilidade, a promoção por mérito e a extensão dos efeitos da reforma a servidores estaduais. A íntegra do projeto ainda não foi divulgada.

As discussões sobre a restruturação administrativa se arrastaram por mais de um ano e meio devido ao amargor do tema e também ao vaivém de emoções provocado pela agenda reformista de Guedes. Em 2019, o carro-chefe do governo era a reforma da Previdência, cujos esforços resultaram no aval tanto da Câmara quanto do Senado.

No começo desse ano, o ministro planejava dar o mesmo tom de prioridade às reformas administrativa e tributária, porém havia uma pedra no meio do caminho: o novo coronavírus. O que já era complicado de aprovar tornou-se praticamente inviável durante a pandemia.

Ao enfim vencer a resistência de Bolsonaro e reforçar o compromisso com a agenda de reformas, Guedes ameniza o impacto da fritura pública sofrida com as críticas do presidente ao programa Renda Brasil, na semana passada, e dá um sinal de fôlego em relação à condução das políticas econômicas no país. A avaliação é feita por interlocutores do governo no Congresso.

A "autoafirmação" do ministro ocorre menos de uma hora depois de o IBGE divulgar que o PIB brasileiro registrou queda recorde no segundo trimestre deste ano (9,7%) na comparação com o primeiro trimestre de 2020. Já em relação ao segundo trimestre de 2019, a retração foi de 11,4%.

Quem também ajudou a convencer Bolsonaro a tirar a reforma administrativa da gaveta foi o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Eles se falaram hoje por telefone, pouco antes da reunião no Palácio da Alvorada que terminou com o anúncio de que a proposta será encaminhada até quinta.

Durante o encontro, o presidente também acertou o valor do auxílio emergencial (R$ 300) na MP (medida provisória) de prorrogação do benefício por mais quatro meses. A matéria ainda deverá passar pelo crivo do Parlamento.

Maia defende que a reforma vai valorizar o bom servidor e não pune quem já está concursado no serviço público. O lobby do funcionalismo é um dos mais poderosos e influentes no Congresso.

O presidente da Câmara vinha cobrando o envio da reforma administrativa desde o ano passado. A demora, inclusive, motivou a saída do ex-secretário de Desburocratização, Paulo Uebel. Ele estava insatisfeito com a tramitação do projeto e com a burocracia relacionada a outros temas.

"Nós vamos tentar convencer o presidente de que pode enviar, que ele vai enviar, e que nós não vamos ter desgaste, nós vamos ter apoio da sociedade para que a gente possa...não é cortar, perseguir servidor, muito pelo contrário, é valorizar o servidor", disse Maia em agosto.

No entendimento de quem defende a reforma, o projeto ajuda a conter gastos públicos e cria parâmetros para promoção por mérito, por exemplo.

Segundo um líder na Câmara que esteve na reunião de hoje, Bolsonaro conseguirá aprovar a reforma administrativa ainda neste ano na Casa se souber segurar a nova base aliada e melhorar a relação com Maia e com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

"Do jeito que está, se fosse hoje, dependendo da base, Bolsonaro conseguiria aprovar [a reforma] pós-eleição [municipal]. Ele tenta através dos habilidosos líderes do Senado e da Câmara manter uma melhor relação com os presidentes das Casas Legislativas, fundamentais para isso. Então, ainda acredito que possa prosperar esse ano. Mas, é tudo efêmero", afirmou.

Pela manhã, reunião da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, com a presença de Maia, também já discutia os trâmites da reforma administrativa dentro da Casa, apurou a reportagem.

Em coletiva hoje, Maia disse ser "otimista" quando questionado se é possível tocar tanto a reforma administrativa quando a tributária neste ano. Ele ressaltou que dará a celeridade necessária e ser preciso objetividade.

"Acho que é a regulamentação do teto de gastos, a tributária na comissão mista e a administrativa na Câmara. Com a aprovação dessas matérias, principalmente a regulamentação do teto de gastos nas duas Casas - quando chegar aqui podemos apensar na PEC do Pedro Paulo, ganhamos de 30 a 40 dias - a partir daí podemos organizar melhor o orçamento público", falou.