Para apoiar inclusão, empresas e funcionários discutem "nova masculinidade"
Resumo da notícia
- Especialistas afirmam que características ligadas à masculinidade tradicional, como a falta de comunicação e cooperação, afetam o clima organizacional
- Empresas como Creditas, Klabin e Qintess criaram grupos com funcionários para discutir o tema e rever atitudes no ambiente de trabalho
- Entre outros problemas, iniciativas visam coibir assédios e atitudes descriminatórias, como a interrupção de mulheres
- Movimento também luta pela popularização da licença-paternidade, que ajudaria a eliminar vieses em contratações e promoções
Na busca por ambientes de trabalho mais inclusivos e igualitários, empresas como Creditas e Qintess perceberam que não basta apenas contratar mais mulheres. É necessário também focar nos homens.
"Precisamos trazê-los para essa conversa, principalmente em relação à questão de gênero", afirma Ana Cristina Barcellos Rodrigues, gerente de remuneração, performance e diversidade na Klabin, do setor de celulose. "Homem também é um gênero e é parte da discussão. Ele precisa fazer parte da reflexão e da solução."
A solução passa pela criação de um novo modelo de masculinidade, descartando valores atualmente ligados a esse conceito que podem afetar o clima organizacional, como a pouca comunicação ou cooperação.
"É necessário expandir o que significa ser homem. Existem milhões de recortes possíveis", afirma Pedro de Figueiredo, fundador do Memoh, consultoria especializada no tema.
Desaprendendo o que foi ensinado a vida toda
Líderes de RH estão se empenhando para descobrir, junto com colaboradores, qual é esse novo modelo. Não é uma tarefa fácil. "Geralmente, o homem não se enxerga como alguém que não respeita os outros. Existe uma dificuldade inicial de se entender como parte do problema", afirma Ana Cristina.
Para Leticia Fontoura Cupertino Valiente, gerente de capital humano da empresa de tecnologia de negócios Qintess, vencer essa barreira exige desconstruir anos e anos de experiências que privilegiaram e isolaram o homem.
"Ao longo da vida, vamos recebendo informações que acabam por reforçar uma cultura masculinizada, de força e opressão", explica. "Então, constantemente, escutamos comentários ou presenciamos cenas que reforçam características supostamente 'de homem' - em geral, relacionadas à força física, à violência e à supressão de sentimentos".
Figueiredo detectou um exemplo típico em um de seus workshops para líderes. "Um dos participantes disse que não tinha coragem de pedir ajuda aos colegas porque achava que eles o veriam como menos capaz. Alguém que não resolve o problema sozinho", relata. "Ele nunca buscava o auxílio de homens. Recorria sempre às mulheres".
"Eles querem levar esse tema para a mesa do bar"
Na maioria dos casos, porém, a atual masculinidade causa interações bem menos positivas com colegas do gênero feminino, como interrupções, comentários ofensivos, cantadas ou piadas discriminatórias.
Segundo Figueiredo, ao invés de apenas reprimi-las, a solução é criar espaços nos quais os homens possam repensar estas e outras atitudes. Em 2018, a Memoh ajudou a Klabin a criar um grupo de conversa. "Nenhuma mulher entra", afirma Ana Cristina. "Existe troca e confiança dentro do grupo para discutirem sua responsabilidade na cultura da empresa."
Em novembro passado, a Creditas implantou uma iniciativa similar, e a líder especialista em cultura e desenvolvimento Rossana Larronda notou um impacto direto nas reuniões. "Os homens passaram a observar a si mesmo e aos outros, ajudando a dar espaço de fala a todos ou chamando a atenção de um colega que tenha interrompido uma mulher", relata.
Sobretudo, ela percebeu que os benefícios ultrapassam os muros da empresa. "Os líderes e colaboradores saem desses papos com vontade de serem 'polinizadores'. Querem levar esses temas para dentro de casa, para as conversas de bar, para as relações entre amigos", afirma.
Um novo homem é um novo pai, e vice-versa
Na Klabin, uma das "lições de casa" para os participantes dos diálogos foi criar grupos de WhatsApp para discutir algo eminentemente doméstico, mas com impacto na vida profissional: a paternidade.
Trata-se de uma das principais lutas deste movimento de ressignificação, porque muitos homens ainda acreditam que devem desempenhar a função de "provedor", deixando o cuidado e a proximidade com as crianças para a mulher. "Essa construção social precisa ser revisitada, porque não é mais sustentável para ninguém", opina Camilla Antunes, pedagoga, educadora parental e cofundadora da consultoria Filhos no Currículo.
Para Figueiredo, as empresas podem colaborar com uma medida relativamente simples, mas com um impacto tremendo: a instituição da licença-paternidade. "Ela seria um divisor de águas quase automático", acredita. "Se a dispensa for a mesma para homens e mulheres, mudaria, por exemplo, o recorte de gênero nos processos seletivos e nas promoções."
Mesmo empresas que oferecem apenas 20 dias de licença-paternidade já percebem benefícios. Segundo uma pesquisa realizada pela Filhos no Currículo, 73% dessas organizações perceberam uma maior retenção de talentos e 61% notaram mais produtividade quando o profissional retornou ao trabalho. Para 48%, a medida também ajuda a reduzir a desigualdade de gêneros no mercado de trabalho.
O Prêmio Lugares Incríveis para Trabalhar é uma iniciativa do UOL e da Fundação Instituto de Administração (FIA) que vai destacar as empresas brasileiras com os mais altos níveis de satisfação entre os seus colaboradores. Os vencedores serão definidos a partir dos resultados da pesquisa FIA Employee Experience, que mede o ambiente de trabalho, a cultura organizacional, a atuação da liderança e a satisfação com os serviços de RH. A pesquisa já está na fase de coleta de dados das empresas inscritas e os vencedores do Prêmio devem ser anunciados em novembro.
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