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PEC dos Precatórios: OAB questiona legitimidade de votação e estuda ação

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) - Adriano Machado/Reuters
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) Imagem: Adriano Machado/Reuters

Do UOL, em São Paulo

05/11/2021 11h09Atualizada em 05/11/2021 13h47

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) disse, em nota divulgada à imprensa, que estuda ações legais para suspender o resultado da votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos precatórios, depois de identificar possível descumprimento do regimento interno da Câmara dos Deputados.

Especialistas ouvidos pelo UOL explicam que a OAB pode entrar com um pedido de mandado de segurança para questionar a PEC. Se ela passar no Congresso e for promulgada, a entidade também pode tentar derrubar a nova Emenda Constitucional ingressando com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Nos dois casos, o desfecho vai depender do STF.

A votação terminou na madrugada de ontem com aprovação em primeiro turno da PEC, com placar de 312 a 144. A proposta, que já havia passado por comissão especial, abre espaço fiscal de R$ 91,6 bilhões para o governo em 2022, o que viabiliza o lançamento do Auxílio Brasil de R$ 400 em ano eleitoral. A PEC precisa passar ainda por um segundo turno de votação na Câmara antes de ir para o Senado.

No comunicado, a OAB diz que questiona a legitimidade da votação porque o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), permitiu a apresentação de emenda aglutinativa com o parecer do relator Hugo Motta (Republicanos-PB) e trechos negociados com diferentes bancadas.

"A emenda aglutinativa tem por objetivo fundir um texto com emendas apresentadas. Porém, no caso de PECs isso só pode ser feito em Comissão Especial. Mas no caso da PEC dos Precatórios nenhuma emenda apresentada ao texto foi admitida por falta do apoiamento mínimo de 171 parlamentares", argumenta.

A OAB ainda questiona o fato de a Mesa Diretora da Câmara ter permitido que parlamentares em missão oficial no exterior pudessem registrar presença e votar o mérito de matérias em Plenário.

"A decisão foi tomada menos de duas semanas após a publicação do Ato da Mesa 208/21, em 21/10, que determinou que a votação do mérito das matérias em Plenário teria de ser presencial. Não se pode alterar as regras por conveniência de momento para aprovar esta ou aquela matéria", diz a OAB.

Um grupo de deputados federais também pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) a anulação da votação. Além de irregularidades com a emenda aglutinativa, eles citam uma mudança de última hora no regimento interno, feita pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para permitir o voto remoto de parlamentares que estavam em missão oficial na COP26, na Escócia.

STF pode barrar a PEC, dizem especialistas

Especialistas afirmam que a PEC pode ser barrada no STF por meio de um mandado de segurança. Caso seja aprovada, a emenda também poderá ser derrubada em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI).

Segundo Rodrigo Brandão, professor de direito constitucional da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), caso o STF entenda que a votação violou apenas o regimento interno da Câmara, não deverá haver anulação, para respeitar a separação entre os Poderes. Porém, se o STF interpretar que os deputados desrespeitaram regras previstas na Constituição, a tramitação da PEC pode ser anulada a qualquer momento.

Brandão afirma que a PEC dos precatórios pode ser vista como uma invasão do Congresso nas atribuições do Judiciário, porque adia o pagamento de dívidas reconhecidas pela Justiça. Isso pode pesar na avaliação do STF contra o projeto.

Na opinião de Acacio da Silva Filho, advogado especialista em direito constitucional, o presidente da Câmara cometeu irregularidades ao permitir que deputados em missão oficial fora do país votassem, contrariando o regimento interno.

O advogado acredita que o ministro que receber um eventual mandado de segurança contra a PEC deverá levar a questão ao plenário do STF, por ser uma decisão delicada contra ato de outro Poder.

Adiamento de precatórios

O texto aprovado na Câmara traz duas mudanças principais. Em primeiro lugar, permite o adiamento do pagamento de parte dos precatórios devidos pela União em 2022. Pelos cálculos do Tesouro, isso gerará uma folga de R$ 44,6 bilhões.

Precatórios são títulos que representam dívidas que o governo federal tem com pessoas físicas e empresas, provenientes de decisões judiciais definitivas. Quando a decisão judicial é definitiva, o precatório é emitido e passa a fazer parte da programação de pagamentos do governo federal.

Defensor de mudanças nas regras para pagamento de precatórios, o ministro da Economia, Paulo Guedes, vinha qualificando como um "meteoro" sobre a economia a necessidade de pagar R$ 89 bilhões em precatórios no próximo ano. Conforme o ministério, não há espaço no orçamento. Em comparação, o orçamento de 2021 prevê a quitação de R$ 54,7 bilhões em precatórios.

Drible no teto de gastos

Em segundo lugar, a PEC dos precatórios muda regras do teto de gastos, a regra fiscal constitucional que limita a despesa pública ao Orçamento do ano anterior corrigido pela inflação. Na prática, a mudança é vista como permissão para furar o teto.

O texto prevê que o limite seja determinado não mais pela inflação acumulada em 12 meses até junho do ano anterior, mas pela taxa apurada nos 12 meses até dezembro do ano anterior. Com esta mudança técnica, haverá uma folga de R$ 47 bilhões em 2022, pelos cálculos do Tesouro Nacional.