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Com taxa de importação menor, uso de soro mais aguado que leite deve subir

Supermercado em Guarulhos, na Grande São Paulo, vende soro de leite ao lado do leite longa vida - Mateus Fernandes/Agência Mural
Supermercado em Guarulhos, na Grande São Paulo, vende soro de leite ao lado do leite longa vida Imagem: Mateus Fernandes/Agência Mural

Do UOL, em São Paulo

05/09/2022 04h00Atualizada em 30/09/2022 15h11

Desde a quinta-feira (1º), a tarifa de importação do soro de leite, subproduto que tem sido vendido em supermercados brasileiros, caiu de 11,2% para 4%. O Ministério da Economia, por meio do Gecex (Comitê-Executivo de Gestão) da Camex (Câmara de Comércio Exterior), diminuiu a alíquota do item até 31 de agosto de 2023.

O soro de leite, líquido que sobra da produção de queijos e geralmente era descartado pela indústria de laticínios, passou a ser opção para quem não tem mais dinheiro suficiente para comprar o tradicional leite de vaca. Ele é mais barato e é menos concentrado que o leite, ou seja, é mais aguado.

Com a nova medida, o consumo do subproduto deve aumentar nos próximos meses, avaliam especialistas ouvidos pelo UOL.

Qual o objetivo do corte de imposto? Fábio Pizzamiglio, diretor da Efficienza, empresa especializada no comércio exterior, afirma que a redução da tarifa de importação do soro de leite tem como objetivo suprir a queda na produção de leite no país.

A tendência é que o consumo do soro de leite aumente por ser mais barato. Mas não é a melhor opção como alimento, afirma Pizzamiglio.

Por que o leite ficou mais caro no Brasil? Em agosto, o leite longa vida ficou 14,21% mais caro, de acordo com o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15), a prévia da inflação oficial. No ano, o acúmulo chegou a 79,79%.

Para Pizzamiglio, vários fatores fizeram o leite encarecer: aumento no preço da ração das vacas, falta de fertilizantes e entraves no setor logístico, causados pelo frete marítimo mais caro da China, que fez disparar o pagamento a produtos enviados em contêineres para cá.

Soro é alternativa ao leite? No Brasil, o custo de produção do leite subiu 62% em dois anos, diz a pesquisadora Kennya Beatriz Siqueira, pesquisadora da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Gado de Leite. Ela afirma que o desequilíbrio entre oferta e demanda motivou a indústria de laticínios a oferecer o soro de leite como alternativa àqueles que perderam poder de compra.

O Brasil é o terceiro maior produtor de leite do mundo, atrás apenas de Estados Unidos e Índia. De acordo com o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), são mais de 34 bilhões de litros por ano.

No primeiro semestre deste ano, a produção sofreu queda de 9% em relação ao mesmo período de 2021, puxada por custos maiores e margens mais baixas.

Consumidor foi avisado da substituição? Siqueira discorda das críticas feitas à indústria de laticínios e aos comerciantes, que não teriam comunicado os clientes com mensagens claras sobre o soro de leite nas embalagens, induzindo a compra do subproduto colocado ao lado do leite longa vida. Segundo ela, o produto já é conhecido há tempos.

Supermercado em Guarulhos, na Grande São Paulo, vende soro de leite ao lado do leite longa vida - Mateus Fernandes/Agência Mural - Mateus Fernandes/Agência Mural
Venda de soro de leite tem sido criticada nas redes sociais
Imagem: Mateus Fernandes/Agência Mural

Preço do leite não caiu? Segundo a Embrapa Gado Leite, o preço do leite longa vida começou a cair em agosto, com redução de 23,5% ante julho. A retração é explicada pelo enfraquecimento da demanda, aumento de oferta na região Sul e alta nas importações.

Entretanto, os valores praticados em agosto deste ano ainda estão 36,6% maiores quando comparados com o mesmo período de 2021.

A instituição não tem dados sobre o preço do soro de leite. No entanto, o subproduto viralizou nas redes sociais após o compartilhamento de uma foto de um supermercado que vendia o litro por R$ 4,49 e a caixa com 12 unidades por quase R$ 54.

O especialista em exportação acredita que os brasileiros terão que se acostumar a ver mais opções de soro de leite nas gôndolas de supermercados a partir de setembro.

Kennya Beatriz Siqueira diz que o consumo do subproduto deve ficar restrito à população mais pobre, sem atingir a classe média.

Quais são os prejuízos do consumo contínuo do soro de leite? A nutricionista e doutoranda pela FSP-USP (Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo) Maiara Soares diz que o soro de leite deve ser utilizado como complemento e não como substituto. A substância é rica em carboidratos, lipídios e proteínas, mas tem uma concentração menor do que o leite.

Segundo ela, a substituição do leite pelo soro de leite terá consequências no aumento da insegurança alimentar, que atinge 125,2 milhões de brasileiros. Maiara afirma que as crianças, com crescimento físico afetado, e idosos, vítimas de osteoporose, são os mais prejudicados pela ausência de minerais importantes como o cálcio.

A especialista declara que alimentos como sardinha e vegetais de folhas verde-escuras, como couve e espinafre, auxiliam no reforço do cálcio, mas reconhece que os brasileiros de baixa renda dificilmente conseguirão comprar esses produtos.