Sopa rende pouco dinheiro, e criador usa tartaruga para fazer xampu e creme
O óleo extraído da gordura da tartaruga-da-amazônia está sendo usado para fabricar produtos de beleza, como xampus, sabonetes e hidratantes. O principal uso comercial do bicho, até agora, era a produção de carne para pratos tradicionais, como a sopa de tartaruga.
A criação de tartarugas com fins comerciais é permitida no país, desde que haja autorização e fiscalização do Ibama. Ainda assim, sociedades de proteção animal são contra a iniciativa, e órgãos ambientais notaram a redução da presença do animal na Amazônia.
José Roberto Ferreira Alves, que usa o óleo de tartaruga em cosméticos, tem uma criação licenciada pelo Ibama desde 2001. Hoje, sua fazenda, a Cotomi --tartaruga gigante, na língua carajá-- conta com 27 mil animais em Araguapaz (GO)
Como a criação fica longe da região Norte, onde se concentra o consumo da carne do animal, Alves afirma que as vendas dificilmente passam de 100 tartarugas por mês. "Para a produção de carne ser rentável, teria que vender no mínimo 600 tartarugas por mês", diz.
Para aumentar o faturamento, ele começou a aproveitar o óleo extraído da gordura desses animais, com o qual faz cosméticos vendidos com a marca Cotomi. Inaugurada em 2013, a linha de beleza da empresa tem xampu, condicionador, sabonete e máscara para cabelos.
Para cada quilo de tartaruga, que abate somente quando há compradores para a carne, Alves obtém 5 gramas de óleo, o suficiente para produzir um quilo de produtos de beleza. Os preços vão de R$ 16 pelo frasco de 250 ml de xampu até R$ 38 por um pote de 40 g de creme hidratante.
Com a venda principalmente online de cerca de 5.000 unidades de cosméticos por mês, afirma faturar entre R$ 130 mil e R$ 150 mil, enquanto a carne de tartaruga não renderia mais que R$ 25 mil por mês.
Tartarugas são abatidas com cinco anos, quando atingem 5 kg
As tartarugas são abatidas com cerca de cinco anos, quando atingem perto de 5 kg. Em 2013, Alves abateu 600 animais, número 18% maior que o de 2012, porém menor do que as 825 tartarugas abatidas em 2011.
O número de animais abatidos varia em função dos pedidos dos compradores, que são bares, em sua maioria. A tartaruga viva é vendida por até R$ 12 o quilo, enquanto a carne custa R$ 35 o quilo com osso e R$ 50 desossada.
Para fabricar cosméticos, Alves retira a gordura do animal, que se distribui em bolsas entre as vísceras. Com o aquecimento, "o óleo se separa de uma parte sólida, que se parece com torresmo de porco", diz Alves. Antes do uso, a substância é filtrada.
Carne de tartaruga é suave e tem textura macia, diz chef
A maior parte da carne produzida por Alves é vendida em cidades de Goiás, além de Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Um dos clientes é o restaurante Aquavit, em Brasília, que serve sopa de tartaruga ao menos uma vez por ano numa espécie de reconstituição do jantar servido no filme cult dinamarquês "A Festa de Babette".
Simon Lau, chef do restaurante, diz que o prato costuma ser aprovado pelos clientes. "Prato francês do século 19, a sopa é sofisticada, mas ao mesmo tempo tem caráter regional." Ele afirma que a carne de tartaruga tem textura macia e sabor suave e particular, que fica entre o frango e o peixe.
ONG condena uso de animais; tartaruga-da-amazônia está sob risco
Silvana Andrade, presidente da Anda (Agência de Notícias de Defesa dos Animais) afirma que tanto o óleo de tartaruga como a carne podem ser substituídos por produtos de base vegetal. "Não há justificativa ética para se matar animais para o consumo", diz.
Para o farmacêutico especialista em cosméticos Maurício Pupo, produtos feitos com óleo de origem animal são os de mais fácil absorção pela pele. "Há uma penetração maior, principalmente na pele danificada", diz.
Como ponto negativo, diz, esses cosméticos exigem a morte de animais para serem obtidos e, quando absorvidos pela pele, podem transferir hormônios, toxinas e vírus eventualmente presentes nos bichos -o que também acontece pela alimentação.
"O óleo vegetal não tem o apelo de marketing do óleo de tartaruga, mas é um produto mais ético, seguro, e também tem muito boa qualidade, especialmente o feito de [óleo de] oliva", diz.
Segundo o chefe da reserva de Trombetas, no Pará, José Risonei Assis, o número de tartarugas que desovam no local caiu 91% em 33 anos. Para Vera Ferreira Luz, do Instituto Chico Mendes, os animais da Amazônia estão sob risco em razão da caça ilegal e coleta de ovos.
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