Qual a diferença entre as crises do Hurb e da 123milhas?

O mercado de viagens brasileiro foi sacudido por mais um problema, após a 123Milhas ter suspendido a emissão de passagens na linha promocional, decisão que foi considerada "grave" pelo governo. No começo do ano, o Hurb também se viu em crise, por não honrar com pacotes comprados por grande parte de seus clientes.

Qual a diferença dos casos?

A venda de pacotes flexíveis da Hurb foi suspensa pelo governo após aumento das reclamações. Isto é, a decisão foi uma intervenção das autoridades.

A empresa já era alvo de reclamações por não cumprir o prometido na compra dos pacotes flexíveis, ou seja, sem data fixa. À época, a Senacon orientou que os consumidores com problemas em viagens na Hurb vissem opções de reembolso ou remarcação do pacote.

Já a 123 milhas, que também sofria com reclamações, interrompeu a venda de pacotes flexíveis na quarta por decisão própria. Para os clientes que tiveram viagens canceladas, a empresa só ofereceu a opção de devolução por voucher — estorno do dinheiro não está entre as opções.

A 123milhas disse que não vai emitir passagens com embarque previsto de setembro a dezembro de 2023. as vendas deste produto estão interrompidas desde o dia 16.

Empresa culpa juros e alta demanda. Em nota, disse que a decisão de suspender a emissão de passagens na linha promocional foi motivada por "fatores econômicos e de mercado" e citou a alta demanda por voos, "que mantém elevadas as tarifas mesmo em baixa temporada", e a taxa de juros elevada.

Entenda o caso da 123

A 123Milhas anunciou o cancelamento dos pacotes entre setembro de dezembro de 2023, além da suspensão da linha promo. Como compensação, a empresa ofereceu vouchers aos clientes afetados.

Autoridades de diversos órgãos, como os ministérios da Justiça e do Turismo, manifestaram preocupação e informaram que irão notificar a empresa. A opção de reembolso por meio de voucher não pode ser impositiva, tampouco exclusiva, segundo governo.

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O Procon-SP também notificou a 123milhas. Segundo o órgão, a empresa "não pode alterar suas regras comerciais de forma unilateral sem oferecer opções ao menos razoáveis aos seus consumidores, ou mesmo alternativas que tenham equivalência com a oferta inicial".

Hurb também teve problemas com pacotes

Hurb viveu uma grande crise no início do ano, após não honrar com pacotes comprados por grande número de clientes durante a pandemia de Covid-19.

A empresa teve a venda de pacotes suspensa pelo Ministério da Justiça e viu a pasta abrir um processo por conta das possíveis irregularidades.

João Ricardo Mendes deixou o cargo após xingar e vazar dados de clientes insatisfeitos. Em meio à crise, ele era o CEO da empresa.

A empresa também fez uma demissão em massa de funcionários. Os demitidos também tiveram os salários atrasados pela empresa.

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Na última semana, a Senacon informou que o Hurb "segue impedida de vender pacotes flexíveis desde o dia 29 de maio. A plataforma apresentou recurso contra a decisão, que está neste momento sob análise do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor - DPDC. A medida foi adotada pela Senacon como forma de proteção aos consumidores e busca garantir a resolução das milhares de reclamações já existentes, antes que novas vendas sejam realizadas".

Em nota ao UOL, o Hurb afirmou apenas que "por questões legais, não comenta processos e/ou ações em andamento" e que "aproveita para reiterar o seu comprometimento com a realização das viagens adquiridas na plataforma, bem como com a devolução de valores solicitados por clientes que optaram pelo cancelamento do serviço. A companhia frisa que está trabalhando em força-tarefa para a normalização das operações, prezando pelo melhor interesse de seus consumidores, parceiros e da companhia."

O que o consumidor pode fazer?

Cliente deve entrar em contato com os canais oficiais da agência para obter o voucher. Após a solicitação, a empresa diz que o cliente receberá seus vouchers em até cinco dias úteis pelo e-mail cadastrado do pagante. Os vouchers podem ser solicitados pelo site oficial na aba "PROMO 123" ou por meio do WhatsApp verificado (31) 99397-0210.

Valor das viagens está sendo dividido em mais de um voucher. 123milhas diz que a divisão serve para dar mais "flexibilidade e liberdade de escolha do que com um só voucher no valor total". No entanto, clientes reclamam nas redes sociais que não conseguem usar mais de um voucher na mesma compra, o que força gasto maior no site.

Devolução apenas em vouchers é proibida pelo Código de Defesa do Consumidor. Advogados especializados em direito do consumidor ouvidos pelo UOL dizem que consumidor tem o direito de pedir dinheiro de volta.

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Consumidores lesados podem fazer registro na plataforma consumidor.gov.br. Segundo o Ministério da Justiça, a opção de reembolso por meio de voucher não pode ser impositiva, tampouco exclusiva.

Procon orienta que consumidor não suspenda os pagamentos, mesmo diante da suspensão da oferta. "Essa postura será importante caso a questão precise ser judicializada, demonstrando boa-fé por parte do consumidor." Orientação não é unânime. Arthur Rollo, advogado, ex-Secretário Nacional do Consumidor diz discordar dessa orientação e afirma que os consumidores devem entrar em contato com as administradoras de cartão para sustar os pagamentos caso ainda haja parcelas em aberto.

Isso é proibido pelo Código de Defesa do Consumidor, está lá no artigo 35, que o descumprimento da oferta dá para o consumidor o direito de pedir o dinheiro de volta, insistir na prestação do serviço ou trocar para uma prestação de serviço equivalente. A empresa está descumprindo o artigo, que diz que quando a empresa não faz a parte dela o consumidor tem direito sim ao dinheiro de volta.
Arthur Rollo, advogado, ex-Secretário Nacional do Consumidor

Não existe devolver em voucher, isso é totalmente fora do planeta. Tem que devolver em dinheiro. Você torna o consumidor cativo de um produto que não é cativo. Produto cativo é plano de saúde, aí acho que é discutível que exista uma relação de longo prazo (...) Passagem aérea hoje você compra em uma empresa, amanhã pode comprar em outra.
Gustavo Kloh, professor de direito da FGV Rio

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