Três erros de comunicação cometidos por Bolsonaro que você pode evitar
Bolsonaro está de volta. Na semana passada, Bolsonaro realizou com sucesso a terceira cirurgia após a facada que recebeu na barriga, no atentado cometido por Adélio Bispo de Oliveira, no dia 6 de setembro de 2018, em Juiz de Fora (MG), quando ainda era candidato à Presidência do Brasil.
A cirurgia foi bem-sucedida. Na verdade, a recuperação está sendo mais difícil que a prevista no princípio, mas, ao que tudo indica, pelas informações do hospital e da assessoria do presidente, foram só uns tropeços pós-operatórios, sem motivos para preocupações. Ou seja, tudo indica que em breve Bolsonaro estará quase pronto para retomar as rédeas do governo. É só mais um tempo para se recuperar completamente e já poderá voltar às atividades normais.
A partir daí "sem barriga-me-dói", literalmente. Ele terá de fazer os discursos que são quase o dia a dia de um presidente. Por isso, além de liderar os ministros, saber negociar com os deputados e senadores e tomar as decisões mais acertadas, deverá se comunicar de forma competente.
Não dá para afirmar que, após vencer uma campanha à Presidência tão aguerrida como essa que presenciamos no ano passado, o vitorioso possa ser considerado péssimo orador. Podemos apontar defeitos aqui ou ali, mas, como o que vale na comunicação é o resultado, Bolsonaro está aprovado como orador.
Não significa, entretanto, que não possua defeitos e que não possa melhorar. Ao contrário, Bolsonaro tem um longo caminho de aprendizado na comunicação e pontos que precisam ser aperfeiçoados. O primeiro passo, para isso, é tomar consciência das falhas. O segundo é ter humildade e disposição para corrigi-las.
Há um Bolsonaro antes e outro depois das eleições
Em seus discursos como deputado federal e como candidato à Presidência, Bolsonaro se mostrou um orador eloquente, vibrante e muito ousado. Uma de suas marcas registradas foi sempre a presença de espírito, a facilidade de brincar com as situações e encontrar respostas ácidas e contundentes quando se sentia acuado.
Nunca foi um orador de longos discursos e de mensagens profundas. Suas falas, embora eficientes, são quase sempre curtas, objetivas e, de certa forma, relativamente superficiais. Com um pouco de exagero, podemos dizer que ele se sai melhor em uma frase que em uma página. Foi essa maneira de se comunicar, entretanto, que cativou os eleitores e o transformou em um dos mais destacados fenômenos políticos dos últimos tempos.
Talvez uma de suas qualidades mais importantes seja a habilidade de fazer a leitura precisa do público eleitor. Soube identificar quais eram as aspirações de suas plateias e adequou a mensagem de acordo com esses anseios. Regra de ouro em comunicação, se o orador não souber compreender bem o momento que vive e identificar as expectativas, esperanças e desejos dos ouvintes, provavelmente, irá fracassar.
Após sua eleição, nas poucas vezes em que se expressou, sua fala apresentou mudanças bastante acentuadas. Passou a ser um orador mais rígido, menos fluente e muito mais limitado. Seus discursos expuseram defeitos que eram apenas insinuados antes de chegar à Presidência. Parece que a responsabilidade do cargo pesou sobre os seus ombros.
Bolsonaro não conseguiu manter a leveza que marcava sua comunicação e também não fez a transição espontânea para uma fala mais protocolar, com pitadas de formalidade exigida pela liturgia do cargo. Permaneceu num limbo que, se não compromete, também não encanta.
Entre os defeitos que podem ser observados na comunicação de Bolsonaro, vamos nos ater a três deles: expressão corporal, pausas e dicção. São aspectos que podem prejudicar o resultado de suas apresentações e dificultar o contato mais eficiente com o público.
Será possível constatar que são problemas de comunicação solucionáveis e que podem servir de exemplo para que façamos uma autoanálise. Talvez nos ajudem a verificar se também não estamos incorrendo nos mesmos erros. Se Bolsonaro conseguir acertar esses aspectos da comunicação, dará um grande salto na sua qualidade oratória.
1 - Expressão corporal
Bolsonaro não é nem sombra daquele orador eloquente que se apresentava na Câmara dos Deputados. Seus gestos destacavam as mensagens relevantes e complementavam de maneira adequada as informações do seu discurso. O semblante era tão expressivo que em muitos momentos substituía com perfeição as palavras, nos instantes em que permanecia em silêncio.
Hoje se apresenta de maneira rígida, não aproveita a gesticulação, os olhos ficam perdidos e a fisionomia inexpressiva. Em algumas circunstâncias, como em Davos, por exemplo, nem faz uso dos gestos e, quando gesticula, os movimentos se mostram quase sempre repetitivos e descoordenados. E a naturalidade se vai.
Bolsonaro apresenta um defeito curioso. Por não se sentir à vontade, fica alternando o equilíbrio do corpo ora sobre uma perna, ora sobre a outra, como se precisasse mudar a posição de sentido. Esses pulinhos demonstram claramente o seu desconforto.
Por que o domínio do corpo é importante na comunicação? Quem nos responde essa questão é o destacado filósofo social inglês Anthony Giddens. No seu livro "Modernidade e identidade", ele diz que: "Aprender a tornar-se um agente competente - capaz de se juntar aos outros em bases iguais na produção e reprodução de relações sociais - é ser capaz de exercer um monitoramento contínuo e bem-sucedido da face e do corpo".
Ora, se Bolsonaro não consegue manter esse monitoramento contínuo da face e do corpo, não pode ser visto como alguém competente em suas ações. Esse domínio, ou a falta dele, é como espécie de espelho do que efetivamente ocorre com o orador. Somente a segurança e a tranquilidade no exercício da Presidência poderão dar a ele a demonstração de competência de que precisa.
Para entendermos bem a consequência da falta de expressividade da fisionomia e do descontrole dos gestos de Bolsonaro, podemos recorrer ao livro "Human communication", de Tubbs e Moss. Os autores destacam o resultado de um estudo realizado por Ekman. Ele afirma que a cabeça e o rosto sugerem qual a emoção que está sendo experimentada enquanto que o corpo dá pistas a respeito da intensidade dessa emoção.
Pois bem, pelo que vimos, Bolsonaro não consegue expressar bem pela fisionomia a emoção que provavelmente estaria sentindo e, como consequência, não pode dar pistas de uma emoção que não se revela. Não há como resolver essa questão com exercícios, já que somente a experiência do cargo e o controle de suas inseguranças farão com que esses aspectos sejam naturalmente aprimorados.
2 - Pausas
As pausas são fundamentais para o sucesso da comunicação. Dificilmente encontraremos um bom orador que não saiba fazer bom uso das pausas. Em certas circunstâncias as pausas chegam a comunicar mais que as palavras. Segundo Claude Debussy: "A música é o silêncio entre as notas".
A pausa bem feita pode valorizar as informações transmitidas, isto é, torna ainda mais forte e impactante a mensagem que as pessoas acabaram de ouvir. Além disso, em certos momentos, cria expectativa sobre as informações que serão comunicadas. E, principalmente, quando bem aproveitada, chega a ser sedutora na comunicação, pois demonstra a segurança e o domínio que o orador tem sobre o que está dizendo.
Para atingir esses objetivos, a pausa precisa ser feita no final da informação, na conclusão do pensamento. Bolsonaro tem usado mal as pausas. Ele trunca as ideias, separa com o silêncio palavras que não deveriam ser separadas, fica sem dizer nada por tempo demasiadamente prolongado, sem que essa pausa demorada demonstre ter alguma utilidade para valorizar a mensagem.
Em certos momentos, dá a impressão de que faz a pausa porque não sabe bem o que vai dizer ou não encontra as palavras que deveriam corporificar seus pensamentos. Essas pausas malfeitas associadas à rigidez do semblante e à ausência de foco com a comunicação visual são a demonstração evidente da falta de domínio da mensagem que transmite.
Antes de se tornar presidente, as pausas nunca foram um ponto forte em sua comunicação, mas não chegavam a comprometer o resultado de suas apresentações. Bolsonaro vai precisar de muito exercício, empenho e dedicação para eliminar esse defeito. Leitura em voz alta, com textos assinalados nos momentos mais adequados para as pausas, é um ótimo treinamento para corrigir essa deficiência da sua comunicação.
3 - Dicção
A boa dicção, a pronúncia correta dos sons das palavras, atende a dois objetivos essenciais: facilita a compreensão dos ouvintes e demonstra o preparo do orador. Quanto mais clara a pronúncia mais facilmente as pessoas compreenderão o que está sendo transmitido.
A dicção pode se transformar em um subtexto precioso na comunicação. Nós transmitimos a mensagem com as palavras, mas existe um subtexto que chega a ser mais significativo que as palavras. Entre inúmeros aspectos, compõem o subtexto a correção gramatical, a concatenação lógica do pensamento, o comportamento social e a maneira como as palavras são pronunciadas.
Esses e outros aspectos podem se transformar em indicadores da história de vida do orador. Pela maneira como a pessoa se comporta nos diferentes ambientes, como organiza o pensamento, como se vale da linguagem mais ou menos educada dará sinais da sua experiência e da sua formação.
Dessa forma, quem se apresenta com boa dicção pode demonstrar por esse subtexto qual é o seu preparo, sua formação, sua educação, e, a partir dessa imagem positiva projetada, até conquistar mais credibilidade. Não se exige uma dicção perfeita, com a rigorosa pronúncia de todos os sons. Esse cuidado perfeccionista, em certas pessoas, poderia até torná-la pedante.
É importante alertar também que essa boa dicção precisa ser natural, sem que o orador demonstre qualquer esforço para pronunciar bem as palavras. A pronúncia forçada das palavras tira a naturalidade do orador e chega a comprometer sua credibilidade.
Bolsonaro tem dificuldade para pronunciar determinadas palavras. De maneira geral, quando a palavra tem três ou mais sílabas, uma delas desaparece. Em vários momentos chega a juntar duas ou três palavras e as pronuncia como se fossem uma só. Nesse caso também algumas sílabas dessas palavras são suprimidas.
Esse é um aspecto grave na sua comunicação, mas fácil de ser solucionado. Basta que o presidente contrate um fonoaudiólogo. Em pouco tempo, com exercícios adequados passará a pronunciar com muito mais clareza as palavras. Enquanto o fonoaudiólogo não chega, Bolsonaro poderá fazer exercícios de leitura em voz alta, colocando um obstáculo na boca. Pode ser o dedo indicador, levemente dobrado, com a parte do dedo oposta à palma da mão voltada para a boca. Prende o dedo de leve entre os dentes e vai fazendo os exercícios lendo textos em voz alta. Uns três minutos por dia são suficientes.
Mais uma vez é importante alertar para a importância da naturalidade. É preferível que Bolsonaro continue se apresentando com essa dicção sofrível, mas com naturalidade, pois assim poderá preservar a credibilidade, a se preocupar em pronunciar bem as palavras, mas com artificialismo, já que neste caso poderia ser visto com desconfiança.
A comunicação é uma das mais importantes competências no exercício de uma liderança e, consequentemente, no exercício das atividades de um presidente. Bolsonaro está apenas no começo. Ele ganhará muito se já nesse princípio se dedicar ao estudo e ao aperfeiçoamento da sua forma de se expressar.
Superdicas da semana:
- Evite a falta e o excesso de gestos
- Deixe o semblante arejado, comunicativo e expressivo
- Faça as pausas no final do raciocínio
- Evite os irritantes "ããã" durante as pausas
- Pronuncie bem as palavras, mas sempre com naturalidade
Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante; "As Melhores Decisões não Seguem a Maioria", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva; e "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.
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