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Reinaldo Polito

OPINIÃO

E se Bolsonaro ficar inelegível?

Sessão plenária do TSE -  Alejandro Zambrana/Secom/TSE
Sessão plenária do TSE Imagem: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

Colunista do UOL

27/06/2023 04h00

Tenho para mim a justiça e perco o meu processo.
Molière

Talvez não exista assunto mais relevante no momento que o julgamento sobre a inelegibilidade de Bolsonaro. Com o país dividido, surgem as mais diferentes narrativas. Seus adversários tentam desqualificá-lo dizendo que está abandonado, deprimido, desesperançado. Seus aliados, por outro lado, mostram vídeos provando o contrário, ele carregado nos braços pela multidão.

Julgamento jurídico ou político?

Os governistas, que desejam se livrar de uma vez por todas do seu mais direto concorrente, não veem a hora de ter o ex-presidente fora da disputa de 2026. Alegam, para tanto, que os ministros seguirão a letra da lei. Não têm dúvida de que será um julgamento baseado nos mandamentos da Constituição.

Já os bolsonaristas não têm a mínima dúvida de que o processo todo, desde o início até à conclusão, será político, pois imaginam estar tudo preparado para afastá-lo da corrida ao Palácio do Planalto, independentemente das provas que sejam apresentadas. Argumentam que há um "consórcio" montado entre a esquerda, a imprensa e o judiciário para derrotá-lo.

Os substitutos de plantão

Dizem alguns, tanto da direita quanto da esquerda, que retirar os direitos políticos de Bolsonaro é um erro. Julgam que, com a força eleitoral do ex-presidente, já que perdeu o pleito por margem estreita de votos, deixá-lo de fora poderá catapultar as chances de quem o suceda. Os mais cotados a substituí-lo são Tarcísio, Zema e Leite.

Guardadas todas as proporções, há até quem afirme que, se Dilma tivesse ficado inelegível, a ideia de golpe contra ela teria sido mais contundente, e suas chances de voltar à cena política seriam mais robustas. Com o acerto feito pelo STF e Congresso para que continuasse elegível apesar do impeachment, perdeu feio na primeira oportunidade em que ela concorreu.

Um dilema

A maioria de todos os espectros políticos, entretanto, não concorda. Os governistas são da velha teoria, em sentido figurado evidentemente, de que "adversário bom é adversário morto". Os admiradores do ex-presidente, ainda que queiram sonhar com algum candidato à altura do seu líder, não acreditam que haja alguém que possa tomar seu lugar.

Há aqui um dilema para uns e outros. Se Bolsonaro for inocentado, para parte do eleitorado poderá chegar enfraquecido na disputa. Alguns, de forma diferente, acreditam, todavia, ser ele o único nome ainda capaz de derrotar a esquerda. Portanto, tem gente que não sabe se torce contra ou a favor nesse julgamento.

As multidões

Neste cenário cabem algumas reflexões. Se analisarmos os argumentos daqueles que veem nele a única opção de vitória nas próximas eleições, é possível considerar que talvez não estejam tão equivocados assim. Basta pensar em um candidato fazendo peregrinação por todo o país. Quem conseguiria aglutinar legiões de pessoas ao seu redor? Tarcísio? Zema? Leite? Difícil supor que isso possa acontecer.

Fenômeno intrigante na história política brasileira, Bolsonaro parece ser o único a ter multidões esperando nos aeroportos e fazendo carreatas, ou motociatas, quilométricas. Nem Lula, sempre visto como grande magnetizador de pessoas, consegue chegar perto dos resultados obtidos pelo adversário.

Uma grande mudança

Tarcísio tem plateia numerosa quando seu padrinho político está ao seu lado. Zema vai bem nos limites das Minas Gerais. Leite não tem carisma suficiente para mobilizar grandes públicos. Está certo que os tempos são outros, que as pessoas perderam o hábito de sair de casa para ver comício político. Até aí Bolsonaro leva vantagem, pois suas redes sociais são imbatíveis.

Há candidatos que ainda se iludem. Quantas vezes recebo políticos que vão concorrer aos mais diversos cargos no Legislativo ou no Executivo dizendo que precisam aprender a falar diante de plateias numerosas. Eu pergunto qual a chance de isso acontecer. Depois de refletirem concluem que essa é uma imagem dos comícios do passado.

Sabem que agora só falam para pequenos grupos de 50 a 100 pessoas. Excepcionalmente para públicos mais numerosos. O único no Brasil que ainda consegue motivar os eleitores espontaneamente a sair de casa, quer você deteste ou goste dele, é Bolsonaro. E esse é o receio dos governistas e a esperança dos oposicionistas.

Apenas conjecturas

Para os bolsonaristas, se o ex-presidente for impedido de concorrer, seja por questões jurídicas ou políticas, estando ao lado de um candidato que conte com seu apoio poderá até mesmo transformá-lo em um competidor vitorioso. Dá a impressão de ser essa uma pressão escamoteada para amedrontar a oposição, já que desejam impedir sua inelegibilidade.

No lado situacionista, sem saber qual seria o melhor resultado, alguns que dizem querer o afastamento do ex-presidente agem como certos jogadores de futebol. Sabendo que, se conseguirem atingir a bola antes que ela saia de campo, terão que se esforçar mais ainda para completar a jogada, correm, correm, correm, fingindo desejar esse intento, mas fazem de tudo para não chegar.

Superdicas da semana

  • Nem sempre a vitória é do vitorioso
  • Nem sempre perder significa ser derrotado
  • Há situações em que só o resultado diz quem estava com a razão
  • Quando os adversários concordam, nem sempre desejam o mesmo objetivo

O conteúdo desse tema é estudado no curso de pós-graduação em "Gestão de Comunicação e Marketing" que ministro na ECA-USP. Livros de minha autoria que abordam esses conceitos: "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante.