Reinaldo Polito

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Opinião

Nenhuma acusação parece ter força para derrotar Bolsonaro e o bolsonarismo

O futuro é a projeção do passado, condicionada pelo presente.
Braque

Ninguém pode afirmar neste momento que Bolsonaro é culpado das acusações que recebe. Afinal, ele ainda não foi julgado, muito menos condenado. Somente depois de todas as apurações é que a Justiça saberá se as informações que pesam contra ele têm ou não fundamento. Os opositores podem, entretanto, de acordo com suas conveniências, chegar às suas conclusões.

Os crimes imputados ao ex-presidente, ainda não provados, poderiam até enfraquecer o ânimo do bolsonarismo. Mesmo que alguns afirmem ter certeza do esvaziamento do número de seus seguidores, não há como negar evidências de uma realidade distinta. Bolsonaro continua estourando a audiência dos programas em que concede entrevistas e segue arrastando multidões pelos lugares que visita.

Paixão e fidelidade política

Que fenômeno é esse que anestesia parte da população? Por que as pessoas nem sempre se incomodam com as notícias recorrentes que mostram os possíveis malfeitos do político que admiram? Não se pode afirmar que seja falta de informação, já que praticamente todos os veículos de imprensa abordam o assunto com insistência exaustiva. E sempre foi assim.

Quando Jânio Quadros renunciou em 25 de agosto de 1961, era opinião praticamente unânime que ele nunca mais teria condições de concorrer a nenhuma eleição no país. Realmente, foi derrotado ao se candidatar ao governo de São Paulo em 1962. Voltou a perder as eleições ao tentar retornar ao Palácio dos Bandeirantes em 1982.

Uma vitória improvável

Parece que não havia mesmo dúvida sobre o seu ostracismo político. Até que, para surpresa de quase todo mundo, enfrentando o poderoso Fernando Henrique Cardoso, conseguiu se eleger prefeito de São Paulo em 1985. Jânio concorreu por um partido de pouca capilaridade, o PTB, enquanto FHC estava amparado por uma sigla expressiva, o PMDB.

As desilusões e frustrações do eleitorado devido à renúncia arrefeceram, portanto, duas décadas depois. Acreditaram na sua narrativa de que "forças ocultas" haviam provocado sua saída da presidência após poucos meses no poder. Nunca explicou que forças foram essas, mas a história serviu para convencer os eleitores a votar novamente em seu nome.

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Os perrengues de Lula

Com Lula não foi diferente. Tanto na época do mensalão quanto do petrolão houve avalanches de acusações contra ele. Todos os dias desfilavam pela televisão empresários, doleiros e políticos revelando os crimes cometidos por aqueles que faziam parte do seu governo.

Foi condenado por unanimidade em várias instâncias. Segundo um desembargador que o julgou, com "provas sobradas". Foi preso por longos 580 dias. Sua imagem ficou esfacelada. Parecia estar condenado a não mais competir em novos pleitos eleitorais. Enquanto cumpria pena, tentou indicar Haddad como substituto para enfrentar Bolsonaro em 2018, mas não deu certo.

Por tecnicidades jurídicas Lula foi solto. Teve seus direitos políticos resgatados. Concorreu com Bolsonaro e venceu as eleições em 2022. Ou seja, tudo o que se falou sobre o petista, todas as provas apresentadas, todo passado de acusações e prisão não foram suficientes para interferir na opinião que seus seguidores tinham sobre ele.

Exemplos que fazem pensar

Esses exemplos podem ser um alerta a quem imagina estar Bolsonaro alijado da vida política por causa das acusações e das notícias negativas que todos os dias aparecem contra ele na imprensa. Ao contrário, se os bolsonaristas interpretarem que esses fatos não passam de narrativas de seus opositores, que desejam destruí-lo por todos os meios, serão ainda mais leais a ele.

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Na vida política ninguém pode fazer afirmações como se o futuro fosse determinado apenas pelos acontecimentos do presente. Um governo tem de enfrentar dificuldades que, às vezes, fogem do controle da sua administração. Por mais que procure acertar, os resultados nem sempre são os esperados.

Um adversário poderoso

Esses descaminhos decepcionam os eleitores que acreditaram em dias melhores, provocam neles a vontade de buscar novas opções que despertem em cada um outras expectativas. Nesses casos, aquele que merecia em determinado momento críticas e censuras, volta a ser a esperança para dias melhores.

Por isso, se os governistas querem mesmo tirar as possibilidades de Bolsonaro voltar a ser um concorrente importante, terão de reunir suas forças e energia para liquidá-lo agora de uma vez por todas. Se ficarem apenas nessas acusações sem provas consistentes, talvez estejam apenas preparando um adversário mais forte para os dias que virão.

Superdicas da semana

  • As certezas de hoje não serão, necessariamente, as de amanhã
  • Os perdedores de hoje poderão ser os vencedores do futuro
  • Os exemplos mostram que as decepções políticas desaparecem com as novas esperanças
  • Combater e acusar sem provas um adversário poderá ser combustível para fortalecê-lo
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O conteúdo desse tema é estudado no curso de pós-graduação em "Gestão de Comunicação e Marketing" que ministro na ECA-USP. Livros de minha autoria que abordam esses conceitos: "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo", "Como falar corretamente e sem inibições" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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