IPCA
0,83 Abr.2024
Topo

Reinaldo Polito

Os assuntos envelhecem e às vezes precisam de quarentena

lavoura, soja, plantação, agricultura, commodities, colheita - Getty Images
lavoura, soja, plantação, agricultura, commodities, colheita Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

15/12/2020 04h00

O mais próximo de mim sou eu.
Terêncio

Você já deve ter reparado como algumas notícias que frequentam as posições nobres na capa dos principais veículos de comunicação, como jornais e portais da internet, com o passar dos dias vão perdendo a importância e se misturando com as outras informações até desaparecerem. Saem do topo da capa para os espaços menos relevantes no pé da página, até se transformarem em pequenas notas.

Por mais interessante que seja o assunto, chega o momento em que vira notícia batida e as pessoas se cansam. Querem novidade. A quantidade de informações é tão alucinante que algumas notícias ficam velhas em minutos. Entram e saem num piscar de olhos.

Nada garante o interesse das pessoas

O sociólogo francês Jean Baudrillard tem uma tese curiosa a respeito do comportamento das massas. Ele defende que as pessoas possuem grande poder de resistência. Afirma que a massa deseja o espetáculo, mas da mesma forma como compareceu ou se manifesta favorável ou contrariamente a um determinado conteúdo por causa do seu revestimento estético, nada garante que esse mesmo comportamento poderá ser mantido em outras circunstâncias.

Não é por outro motivo que alguns políticos experientes, sabendo que essa roda gira depressa, ao serem apanhados em alguma falcatrua, se afastam dos holofotes e esperam a poeira baixar. Dependendo do caso, como as novidades de corrupção pululam a todo instante, em pouco tempo quase ninguém se lembra mais dele. Alguns que foram condenados no mensalão, por exemplo, hoje nem são mencionados.

Tanto assim que foi criada a lei da ficha limpa. Como a memória das pessoas é curta, para não haver o risco desses fora da lei se elegerem, ao serem condenados por decisão de órgão colegiado, se tornam inelegíveis por oito anos. Por incrível que pareça, se não fosse por essa lei, muitos desses delinquentes estariam ocupando cargos eletivos.

Os assuntos envelhecem

Como os assuntos envelhecem da noite para o dia, alguns cuidados devem ser tomados para que você não saia por aí falando para ninguém, "pregando no deserto". Basta seguir algumas regras bastante simples, e até elementares, para que seus temas sejam sempre atraentes e instigantes.

Fique de olho "na temperatura" do público. Enquanto as pessoas estiverem ávidas para ouvir, ler ou falar sobre determinado tema, vá surfando nessa onda. À medida que o tema deixa de ser empolgante, você precisa ter a sensibilidade de virar a página e identificar o que passou a aguçar a curiosidade delas.

Você até pode continuar falando do tema da sua especialidade, mas precisa, o mais rápido possível, trocar as ilustrações. Se, por exemplo, as notícias sobre o pleito presidencial norte-americano ainda despertam algum interesse, daqui a pouco, entretanto, quando todos os recursos forem julgados, esse assunto já estará praticamente enterrado. Quem é que se interessa pelo impeachment da Dilma hoje?

Há uma regra da comunicação que precisa ser seguida sempre que possível, tanto para falar quanto para escrever: quanto mais um assunto estiver próximo no tempo e no espaço, maior será o interesse dos ouvintes ou dos leitores. Ao contrário, quanto mais distante estiver, menos as pessoas terão interesse no tema.

A realidade dos ouvintes

Por isso, todas as vezes em que tiver de tratar de uma matéria, seja falando ou escrevendo, é preciso refletir: que tipo de adaptação eu devo fazer para que este assunto vá ao encontro da realidade dos ouvintes ou dos leitores. Se, por exemplo, você estiver falando sobre mercado financeiro para um grupo de agricultores, todos os exemplos que der sobre financiamentos ou investimentos deverão se referir ao agronegócio.

Se você comentar sobre uma praga que destruiu parte da lavoura na Indonésia, a não ser que interfira nos negócios dos produtores brasileiros, esse assunto despertará interesse de médio para baixo. Ao contrário, se falar de uma praga que poderá atingir as plantações dos agricultores brasileiros, o interesse passa a ser total.

Dessa forma, podemos deduzir que não existe assunto desinteressante, pois se tivermos o cuidado de associá-lo ao que toca a vivência das pessoas, elas se sentirão motivadas a prestar atenção. Realmente é bastante simples. Na maioria dos casos, basta citar exemplos pertinentes ao negócio delas.

Os exemplos permitem a aproximação

Como eu disse, o assunto deve estar próximo no tempo e no espaço. O que acabei de comentar se refere ao espaço, mas temos de levar em conta também a proximidade com o tempo. No mesmo exemplo da agricultura, as pessoas ficariam mais atentas e interessadas se o assunto no momento se referisse às barreiras impostas pela União Europeia para as exportações dos nossos produtos. O tema, entretanto, não teria tanto apelo se tratasse das dificuldades enfrentadas pelos produtores de café na crise de 29.

Observe os oradores e escritores que conseguem manter sempre a atenção de seus ouvintes ou leitores. Vai constatar que todos, sem exceção, fazem essa aproximação com a realidade das pessoas. Eles se valem de informações atuais, que ainda estão no topo do noticiário, e abordam os temas associando-os com a vivência ou experiência daqueles que desejam conquistar. Se o assunto não tiver essa aproximação instigante, deve ir logo para a quarentena.

Superdicas da semana

  • Quanto mais próximo no espaço e no tempo, maior o interesse das pessoas pelo assunto
  • As informações precisam ser atualizadas para manter o interesse das pessoas
  • Faça adaptações para que o assunto vá ao encontro da realidade das pessoas
  • Os exemplos presentes podem dar atualidade aos temas

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Superdicas para escrever uma redação nota 1.000 no ENEM", "Como falar de improviso e outras técnicas de apresentação", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.

Siga no Instagram: @polito

Siga pelo facebook.com/reinaldopolito

Pergunte para saber mais contatos@polito.com.br