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Reinaldo Polito

OPINIÃO

O marqueteiro de Moro precisa combinar com os russos

Reprodução/ Flickr Ministério da Justiça e Segurança Pública
Imagem: Reprodução/ Flickr Ministério da Justiça e Segurança Pública

08/02/2022 04h00

Quanto mais isso muda, mais fica a mesma coisa.
Alphonse Karr

Li atentamente a entrevista que Pablo Nobel, marqueteiro de Sergio Moro, concedeu a Fábio Zanini, jornalista de política da Folha. Se por um lado Zanini perguntou tudo o que precisaria ser perguntado, Nobel não escorregou nas respostas. Bem, pelo menos não em todas.

Ceteris paribus

Quem lê a entrevista tem a impressão de que o ex-juiz tem muita chance de se eleger. Ceteris paribus. Sim eu me lembrei dessa expressão que aprendi ainda no primeiro ano da faculdade de ciências econômicas. Toda vez que um dos colegas de classe perguntava ao mestre se os fatos iriam mesmo ocorrer de acordo com suas previsões, ele fazia uma pausa prolongada, sorria, e amenizava suas profecias com essa preciosa expressão.

Sim, tudo iria ocorrer conforme imaginava se todas as outras variáveis se mantivessem constantes. Por isso os economistas se equivocam tanto em seus prognósticos - os fatos que margeiam seus cálculos quase nunca são imutáveis. Ora, se esse fenômeno se dá com as ciências econômicas, podemos imaginar o que acontece quando o assunto é política.

Na prática, a teoria é outra

Nas aulas que ministro no curso de pós-graduação em Marketing Político, na ECA-USP, esse é um tema recorrente. Depois de avaliarmos as chances de certos candidatos a determinado pleito, invariavelmente um aluno levanta a questão: mas será que vai mesmo se eleger, professor? E a minha resposta é pronta: ceteris paribus.

Para Nobel será fácil conquistar os votos dos eleitores descontentes com Bolsonaro. Fica, entretanto, mais cauteloso quando comenta a respeito do eleitorado de Lula. Não disse, mas deve ter pensado que os lulistas guardam profunda mágoa do juiz que botou o grande chefe atrás das grades.

Novo figurino

Ele também vai mexer na imagem de Moro. Sua intenção é a de afastar o perfil do juiz sério, sem reações emocionais, e transformá-lo num indivíduo mais leve, mais informal, mais próximo das pessoas, que vista esse figurino de candidato político. Ou seja, passar uma borracha no juiz e redesenhar o contorno do político.

Ah, e o combate à corrupção não deverá ser a tônica principal da campanha. Não, o objetivo é partir para um discurso que defenda plataformas sustentadas em temas como covid, políticas sociais, e... descer o pau no Bolsonaro. Alega que estamos no princípio e que, por isso, há muito tempo para trabalhar.

Quando foi indagado sobre as acusações que Moro tem sofrido pelas tarefas que desempenhou na Alvares & Marsal suas explicações não foram tão diretas. Disse que ainda não tem resposta para isso. Que precisa primeiro entender a matéria-prima toda. Opa, esse tem sido um assunto da mídia no dia a dia. Será que as entrevistas e lives do seu candidato ainda não o convenceram?

Combinou com os russos?

Ok, vai mudar o jeitão do candidato, criticar o governo Bolsonaro, deixar a corrupção de lado e partir para temas que Moro nunca defendeu, nem mesmo na época em que esteve no governo e tinha condições de falar como ministro. Não me lembro de ele ter tocado nessas matérias em nenhum momento.

A pergunta é essa: Nobel, você já combinou com os russos? Ou será que a população não vai perceber essa mudança de comportamento, e passar a vê-lo como personagem artificialmente criada? Como não atacar a corrupção, se foi a única bandeira que levantou na vida? Vai centrar fogo nas ações de Bolsonaro, aquele que elogiava até uma semana antes de abandonar o governo?

Voltar aos bancos escolares

E falando em Bolsonaro, Moro vai precisar aprender o bê-á-bá de como se comportar como um candidato, matéria em que seus principais concorrentes, o presidente e o ex-presidente já são catedráticos. Haja cadeira escolar, quadro de giz e boa vontade para suplantar esse desafio.

E mais, o marqueteiro insiste que campanha não se faz com argumentos, mas sim com narrativas. O que significa usar narrativas? Distorcer os fatos? Colocar o manto diáfano da fantasia para tornar quase invisíveis as verdades que reveste? Não duvido da competência do profissional contratado para essa missão, mas já tendo preparado incontáveis candidatos ao longo desses últimos 47 anos, sei que no papel é possível vencer qualquer eleição. Na prática, todavia, a teoria é outra.

Superdicas da semana

  • No papel toda teoria é boa
  • Na prática a teoria é outra
  • A toda ação corresponde uma reação
  • Cuidado com os ataques, pois eles podem se voltar contra si

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Como falar corretamente e sem inibições", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo", "Saiba dizer não sem magoar as pessoas", e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.