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'Nenhuma indústria do mundo paga o custo de capital que o Brasil paga'
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"O que eu defendo não é que se reduza drasticamente a Selic. Não é isso. Mas já tem espaço para fazer as primeiras reduções. Estou falando de 13,75% para 13,5%."
Presidente da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), uma das mais relevantes do setor industrial, José Velloso engrossa o coro dos que clamam por uma queda na taxa básica de juros — a Selic — fixada pelo Banco Central.
Segundo Velloso, a autoridade monetária nacional até acertou no início do ciclo de elevação de juros para conter a inflação. Mas a atual taxa, em sua opinião, é um "exagero".
"Nenhuma indústria do mundo paga o custo de capital que o Brasil paga", critica o presidente da Abimaq. "O Banco Central, com essa política, está contratando um PIB baixo em 2023 e 2024. Quem sabe a gente consiga salvar 2025", complementa Velloso, que é engenheiro mecânico e administrador de empresas de formação.
Confira abaixo a íntegra da entrevista.
Como o senhor avalia a atual política de juros no país?
O Banco Central foi uma das primeiras autoridades monetárias do mundo a combater a inflação. Então, eles tiveram uma visão antes de outros bancos centrais de que vinha um tsunami pela frente, em função do aumento de commodities, do problema das cadeias globais de valor, da guerra comercial entre Estados Unidos e China, da desorganização do transporte internacional em função da covid. E depois culminou com a crise da Guerra da Ucrânia.
Embora o Banco Central tenha acertado no começo, para nós fica claro que existe um exagero na taxa Selic. O Brasil já há bastante tempo tem tido a maior taxa de juros reais do mundo. Eu acho que nada justifica isso.
E nos últimos dois meses aumentou ainda mais. Agora, em particular, a situação de abril — com o IPCA a 4,18% [no acumulado dos últimos doze meses] — mostra que realmente a inflação despencou. E continuamos com uma taxa de juros muito alta. Vamos fazer uma comparação: quando a inflação estava em torno de 4,5%, em 2021, o Banco Central chegou a baixar a Selic para 2%.
Mas há uma banda de economistas, muitos deles ligados ao mercado financeiro, que contesta a visão de que há espaço para a queda de juros. A divulgação do IPCA, com uma alta de 0,61% apenas em abril, teria mostrado que o "núcleo da inflação" vem se mostrando persistente, o que inviabilizaria a redução de juros. Como o senhor vê esse argumento?
Isso não é verdade. A gente deve terminar o ano com uma inflação de 5,5%. Ora, uma inflação de 5,5% não justifica uma taxa Selic de 13,75%. Tanto não significa que o próprio mercado — uma coisa incomum, uma grande novidade para o Brasil — está precificando os juros de longo prazo abaixo da Selic.
O que eu defendo não é que se reduza drasticamente a Selic. Não é isso. Mas já tem espaço para fazer as primeiras reduções. Estou falando de 13,75% para 13,5%.
Então, é aquele negócio: o mercado financeiro, vamos colocar dessa forma, ele quer continuar com uma Selic alta. Lógico, ele tem interesse nisso porque o mercado financeiro está se remunerando bastante com títulos públicos que são títulos sem risco. E quem paga isso é a população.
Há economistas que dizem que a indústria brasileira só sobrevive graças a proteções, subsídios e incentivos fiscais — a indústria automotiva é um dos exemplo mais citados. Como o senhor encara essa crítica?
Desde 2016, quando começou o governo Temer, não existe nenhum incentivo de taxa de juros ou de financiamento subsidiado para a indústria. Outros setores, como construção civil, têm subsídios.
Eu concordo com você que os economistas ligados ao setor financeiro, que fazem um grande lobby aqui no Brasil, têm mais voz. Mas falar em 2023 que a indústria paga meia-entrada? Isso não é verdade. A indústria, de tudo o que ela produz, 44% viram impostos.
Nenhuma indústria do mundo paga o custo de capital que o Brasil paga. E nós temos aqui no Brasil um setor financeiro muito pouco regulado. Por isso que a gente vê hoje, por exemplo, cartão de crédito a 430% de juros.
O que acontece é que essa taxa de juros da Selic no Brasil, elevada do jeito que está, acaba inibindo investimentos. Acaba obstaculizando que as empresas cresçam através de alavancagem. O Banco Central, com essa política, está contratando um PIB baixo em 2023 e 2024. Quem sabe a gente consiga salvar 2025.
O atual governo defende a reindustrialização do país — ou de pelo menos tentar criar políticas para esse fim. Como o senhor enxerga essa diretriz?
É totalmente necessária a reindustrialização do Brasil. Nos últimos 10 anos, subiu mais de 20% o PIB da agropecuária e o PIB do Brasil subiu só 1,4%. Então, a agropecuária não puxa PIB e gera pouco emprego e renda.
Então, é importante que o Brasil agregue valor a essas riquezas que nós temos. Agregar valor na agricultura, na exploração mineral, no petróleo.
Mas, para fazer isso, o Brasil precisa de uma agenda de competitividade. Não adianta a gente fazer um processo que não se sustenta a longo prazo.
Então, é importante que a gente faça a reindustrialização do Brasil, aproveitando as nossas vantagens comparativas através de medidas estruturantes e reformas.
Porque é através da indústria que você vai gerar empregos de melhor qualidade, com mais tempo de escolaridade. E também você vai gerar mais inovações.
Um primeiro passo importantíssimo é a aprovação da reforma tributária que está na Câmara Federal, do IVA. E outro passo importante também é a aprovação desse arcabouço fiscal que foi apresentado.
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