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Qualquer reforma tributária será melhor do que manter macarronada atual
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Às vésperas do recesso parlamentar de meio de ano, a Câmara dos Deputados promete um "esforço concentrado" nesta primeira semana de julho, para votar temas importantes da economia.
A lista inclui as regras de decisão do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) e a definição final do arcabouço fiscal, norma de substituirá o teto de gastos no controle das contas públicas, que voltou do Senado com modificações. Mas, o foco principal recai sobre a votação da reforma tributária.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), anunciou o desejo de concluir pelo menos o primeiro turno da votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da reforma tributária até esta sexta-feira (7).
Embora a Câmara, sob a presidência de Lira, tenha um histórico de passar rolo compressor e aprovar pareceres alterados de última hora, não é possível saber se este será o roteiro no caso do relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que define novas regras para a cobrança de tributos.
Por que reformas tributárias são difíceis de aprovar?
O que se sabe é que um consenso sobre a melhor reforma ainda está longe de ser obtido. Por alterar a situação vigente, mudando os grupos sociais e econômicos ganhadores e perdedores, uma reforma tributária, na verdade, dificilmente alcançará amplo consenso. Há uma disputa entre economistas sobre a qualidade da reforma agora proposta.
É por isso que as muitas tentativas anteriores de reformar o sistema tributário nunca chegaram perto de serem votadas. Há quase 30 anos, desde uma tentativa frustrada no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, que se tenta sem sucesso simplificar o sistema tributário, dotando-o de alguma coerência econômica e distributiva.
A reforma atual não difere, em essência, dos objetivos das anteriores fracassadas. Também visa a simplificar o conjunto de regras e normas, reduzir a comutatividade — cobrança em cascata de tributos —, acabar com a guerra fiscal entre estados e dividir melhor a carga de tributos sobre setores da economia.
A diferença agora é que restam muito menos dúvidas de que a reforma é uma exigência incontornável para impulsionar um crescimento social e econômico mais duradouro e consistente.
Sistema atual é disfuncional
São bem conhecidas as disfunções do sistema tributário brasileiro. Ao longo do tempo, atendendo a pressões de grupos de interesse, ele se transformou num tal monstrengo fiscal que, a esta altura, qualquer reforma será melhor do que manter vigente o sistema atual.
Alguns exemplos dessas disfunções:
A carga tributária é excessiva, rivaliza com a de países ricos, e se situa muito acima da que vigora nas economias de porte semelhante à brasileira;
Os tributos são de má qualidade, acentuam desigualdades de renda e regionais, cobrando proporcionalmente mais de quem pode contribuir menos;
O sistema tributária prejudica a competitividade da economia e estimula a alocação econômica e social ineficiente de recursos;
É um sistema complexo, com infinitas exceções e inúmeros regimes especiais, o que torna mais custosos tanto os atos de cobrar quanto os de recolher os tributos.
O que a reforma prevê?
A reforma que pode ser votada agora prevê a criação de dois IVA (Imposto de Valor Agregado), que são tributos não cumulativos, aplicados na maioria dos países.
Um desses IVA, de âmbito federal, substituirá PIS, Cofins e IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). O outro IVA, de âmbito estadual e municipal, reunirá o estadual ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o municipal ISS (Imposto sobre Serviços).
O ICMS passará a ser cobrado exclusivamente no destino, ou seja, no estado em que o bem ou serviço é consumido. Com isso, as guerras fiscais, em que estados e municípios se lançam para atrair empreendimentos, à custa de reduções e isenções fiscais, serão eliminadas.
As bases do sistema tributário vigente foram lançadas nos idos dos anos 60 do século passado, com as reformas promovidas pelos governos militares. Em quase 60 anos, pressões variadas de grupos de interesse foram desfigurando o conjunto, o que se refletiu na expansão da carga tributária ao longo do tempo.
Para acomodar isenções, deduções, abatimentos, e uma série de regimes especiais, sem perdas de arrecadação, novos impostos, alíquotas e contribuições foram sendo adicionadas ao conjunto. Assim, o sistema tributário se tornou uma macarronada de leis, regras e normas, com tributos em camadas e superpostos.
Carga tributária alta reflete sistema complexo
O resultado é que a carga tributária, relativamente baixa até inícios da segunda metade do século 20, que não passava de 13,8% do PIB (Produto Interno Bruto), em 1947, chegando a 15,8% do PIB, em 1962, escalou, dez anos depois, para 26%.
Um outro surto de elevação de carga tributária ocorreu a partir da implantação do Plano Real, em meados da década de 90, e ao longo da consolidação do programa de estabilização monetária. A elevação da carga se deu em contrapartida a um equacionamento de dívidas públicas e do saneamento de esqueletos fiscais acumulados.
De 1994 até hoje, a carga tributária avançou até 32% do PIB, em 2002, fim do segundo mandato de FHC, chegando a um pico de 35%, em 2008, já no segundo governo Lula. Nos últimos anos, tem rodado em torno de 33% do PIB.
Além de alta para os padrões de economias emergentes, em torno de 20% do PIB, a carga tributária brasileira é muito mal distribuída. Por se concentrar nos tributos sobre o consumo, a cobrança de impostos onera mais segmentos de renda mais baixa, o que não só configura injustiça fiscal como prejudica a expansão da economia, reduzindo a capacidade de consumo da população
Algumas alterações no projeto original da reforma tributária já incorporadas pelo relator Aguinaldo Ribeiro:
Regimes especiais — como o do Simples e o da Zona Franca de Manaus — existentes foram mantidos;
O IVA foi dividido em dois, um federal e outro estadual e municipal;
A alíquota única padrão ficará para lei complementar, mas haverá isenções, reduções e cobrança seletiva para alguns produtos e serviços;
Cria um Conselho Federativo do IBS, com gestão compartilhada entre estados e municípios, para gerir a arrecadação e a distribuição do tributo;
Dois fundos de compensação, com recurso federais, para compensar perdas de arrecadação de estados e municípios, cujos valores estão entre os pontos ainda sem definição final.
Além de já prever a taxação de bens hoje isentos, como jatinhos, iates e lanchas, e mudanças no imposto estadual sobre heranças e doações, o relatório que deve ser votado prevê a apresentação pelo governo federal de um projeto de reforma da tributação sobre a renda, em até 180 dias depois da promulgação da primeira parte da reforma tributária.
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