Por que o destino do Vale-Gás é chave para as contas do governo
A equipe econômica do governo tem dito que é necessário fazer alterações no projeto que pretende ampliar o Vale-Gás (PL 3.335/2024) já enviado pelo governo ao Congresso. As alterações só devem ser feitas durante a discussão nas casas legislativas, após o primeiro turno das eleições municipais, mas é importante essa sinalização de que o governo vai defender ajustes.
As mudanças são consideradas cruciais pelo mercado porque deixarão claro o tamanho da responsabilidade de todos - governo e parlamento - em relação às contas públicas.
Qual é o problema do projeto?
O projeto da forma como está propõe um drible nas regras do arcabouço fiscal, que é o atual instrumento de controle das contas públicas. Pelo texto, parte da ampliação do programa, a que dá descontos no botijão para famílias de baixa renda diretamente nas revendedoras de gás (recompensadas pela União pelo desconto), pode ser custeada por repasses diretos de empresas à Caixa Econômica Federal.
Ou seja, gastos que não passam pelo Orçamento da União e não são contabilizados para o resultado primário e para o cumprimento da meta de resultado das contas do governo, atualmente em zero.
O mecanismo fragiliza o arcabouço fiscal porque ele prevê gatilhos que devem ser acionados em caso de descumprimento da meta. Se gastos começam a ser tirados do Orçamento e do cálculo da meta, os gatilhos não são acionados e o arcabouço vira uma contenção inócua a um eventual descontrole de gastos, o que eleva o risco de calote do país para o pagamento da sua dívida.
A Fazenda defende a revisão do projeto para garantir que os recursos do programa passem pelo Orçamento aprovado pelo Congresso.
A meta fiscal
Os relatórios bimestrais de receitas e despesas apresentados pela equipe econômica neste ano têm mostrado que foi afastado o risco de (1) alteração da meta fiscal: (2) descumprimento da meta para 2024 - lembrando que há banda de tolerância, que varia de déficit a superávit de R$ 28,8 bilhões. O governo, portanto, deve fechar o ano tendo cumprido a meta estabelecida respeitando o arcabouço fiscal.
Cumprir ou alterar a meta, portanto, é uma preocupação já superada pelos agentes detentores dos títulos da dívida. Mas há outras questões chave que são observadas como fundamentais para dar sustentabilidade às contas:
1. Se o governo está evitando conter gastos (bloqueios ou contingenciamentos previstos no arcabouço), ao superestimar receitas e subestimar despesas ao longo do ano.
2. Se há a tentativa de turbinar gastos fora do orçamento: exemplo o projeto do Vale-Gás ou gastos por meio de fundos.
3. Se haverá ajustes no arcabouço para evitar o crescimento maior se algumas despesas estrangulando o espaço das despesas discricionárias, com consequências como o shutdown, ou paralisia da máquina pública.
O grau de investimento
Nesta semana, nos Estados Unidos, Lula e o ministro Fernando Haddad estiveram reunidos com as principais agências de risco para defender que o Brasil está trabalhando para recuperar o grau de investimento.
Para isso, o governo brasileiro precisa mostrar que o arcabouço não é uma regra que perderá a sustentabilidade nos próximos anos e que tem um programa de ajuste fiscal permanente. Há a expectativa que o governo amplie o programa de revisão de gastos e proponha medidas para conter o crescimento da despesa, como desvinculações, desindexações.
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