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Está na hora de investir em imóveis?

Valter Police

16/11/2020 04h00

Essa é uma pergunta que tem permeado muitas discussões nas últimas semanas e, como costuma mexer com valores altos, merece uma análise mais baseada em dados e fatos do que em percepções ou exemplos isolados.

Vamos tratar aqui apenas da compra de imóveis como investimento e não para sair do aluguel e morar, porque as análises neste caso seriam menos ligadas às questões financeiras.

A melhor forma de analisar alguma coisa não é com exemplos específicos porque eles podem não ser replicáveis ou podem ser distorcidos do usual. É fundamental analisar dados abrangentes para chegar a conclusões lógicas. Vamos abordar três aspectos comuns a qualquer investimento.

O primeiro deles é a liquidez. Dependendo do imóvel, a liquidez pode ser maior ou menor, mas, de acordo com uma reportagem de 2019, a Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias informou que o tempo médio para a venda de um imóvel é de um ano e quatro meses. Muito longo não é mesmo? O que aconteceria se você precisasse dos recursos em prazo menor? Pense nas perdas que podem acontecer caso venda por um preço muito abaixo do mercado.

O segundo é a segurança. Se pensarmos na chance de nosso dinheiro sumir, o risco é muito pequeno, embora possa acontecer em alguns casos especiais como imóveis adquiridos na planta (caso a construtora venha a falir) ou em alguns loteamentos (com problemas na documentação do terreno).

Mas esse não é o único risco. O "sobe-e-desce" de preços também é um risco, como na Bolsa de Valores, mas nesse aspecto as aparências podem enganar. Isso acontece porque no mercado financeiro temos acesso ao preço de tudo instantaneamente, e as oscilações ficam nítidas, mas no mercado de imóveis não vemos o "preço justo" de um determinado imóvel a todo o momento, porque não existe um sistema eletrônico, no qual compradores e vendedores registram suas intenções. Isso nos causa uma sensação de estabilidade, que traz tranquilidade, mas será que é mesmo assim?

Na verdade não: uma pesquisa feita pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), da USP, em parceria com o portal Zap Imóveis analisou o mercado de imóveis em São Paulo por 40 anos e, de acordo com o Eduardo Zylberstajn, economista que coordenou a pesquisa, "o que se pode observar é que há uma volatilidade de preços muito alta". Por exemplo: o ciclo de alta em meados dos anos 2000 ocorreu após duas décadas de queda nos preços dos imóveis. Embora possamos não perceber, o sobe e desce dos preços não é diferente do que ocorre em investimentos financeiros.

O terceiro é a expectativa de rentabilidade. De acordo com esse mesmo estudo, a valorização média anual foi de modestos 1,8% ao ano ao longo dos 40 anos a partir de 1975, já descontada a inflação do período medida pelo IPCA.

Entre 2015 e 2019, a valorização dos imóveis medida pelo índice FipeZap caiu 0,61%, enquanto a inflação foi da ordem de 25%, o que faz a média dos últimos 45 anos cair para algo em torno de 1,1% ao ano descontada a inflação. E ainda nem consideramos os dados de 2020! Nesses 45 anos, o grande "boom" de retorno ocorreu entre os anos de 2004 e 2014, mas, sobre isso, o pesquisador afirmou que "os ganhos exorbitantes do passado recente, no entanto, parecem ser muito mais um momento de exceção do que a regra no mercado imobiliário brasileiro".

Desta forma, quem investiu em imóveis em um determinado momento e aproveitou a alta se deu bem, mas esse pensamento também á valido para a Bolsa, o dólar, os juros ou até a bitcoin. Achar que sabemos o momento certo de entrar e sair do mercado é uma ilusão e deveríamos nos nortear pelas médias para termos expectativas mais realistas e tomarmos melhores decisões.

É claro que se o imóvel for alugado, os rendimentos daí advindos devem compor a rentabilidade total, mas lembro de outros custos que também devem ser levados em conta quando pensamos na renda do aluguel: Imposto de Renda, gastos com imobiliária, tempo sem ocupação e os custos de IPTU, seguro e condomínio nesses períodos, manutenções diversas, entre outros. Além disso, na aquisição e na venda do imóvel existem outros custos, como impostos, corretagens e documentação, para citar os principais.

Por fim, lembro a primeira regra do bom investidor: diversificação! Caso os imóveis para investimento representem uma diversificação de seu patrimônio, eles podem fazer sentido dentro de uma visão de carteira, mas ter 80%, 50% ou mesmo 30% dos investimentos em imóveis me parece um exagero. Como parâmetro, algumas das famílias mais ricas do mundo, de acordo com uma pesquisa chamada "Global Family Office Report", de 2019, feita pelo banco UBS, possuem 17% dos investimentos em imóveis.

A conclusão que podemos tirar é que os imóveis como investimento representam uma opção válida para diversificação de uma carteira, desde que não representem uma parte muito grande dessa carteira, já que possuem baixa liquidez, alta volatilidade e baixa rentabilidade do ponto de vista histórico.

Assim, antes de tomar decisões, em especial as que podem impactar de forma importante suas finanças, se baseie mais em dados do que em percepções, e você tenderá a fazer escolhas melhores e mais racionais.

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