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Reinaldo Polito

Sergio Moro participa do Roda Viva e mostra por que tem credibilidade

Juiz Sergio Moro participa do programa Roda Viva, da TV Cultura - Reprodução/TV Cultura
Juiz Sergio Moro participa do programa Roda Viva, da TV Cultura Imagem: Reprodução/TV Cultura

27/03/2018 13h44

Atendendo a um pedido pessoal do jornalista Augusto Nunes, que faria sua despedida como apresentador do programa Roda Viva, da TV Cultura, o juiz Sergio Moro, que sempre procura se comportar de maneira low profile, sentou-se nesta segunda, 26, na cadeira central como entrevistado, cercado de jornalistas por todos os lados.

A entrevista bateu os pontos mais elevados no Twitter em todo o mundo e foi assistida por um grande número de telespectadores, que aguardavam ansiosos suas respostas sobre a Lava Jato, a possível prisão do ex-presidente Lula e o comportamento dos juízes do STF (Supremo Tribunal Federal), que concederam uma liminar para que o líder petista não fosse preso antes da decisão sobre pedido de habeas corpus impetrado pelos seus advogados.

Moro tem consciência de que a fama nos precede. E fama aqui no sentido mais amplo do termo. Não contam na avaliação dos ouvintes apenas as palavras que proferimos nas conversas que entabulamos, nas palestras que proferimos ou nas entrevistas que concedemos, mas sim todo nosso histórico de vida, tudo o que fizemos ou deixamos de fazer.

Imagine, por exemplo, que surja agora na nossa frente, para discursar, um político sabidamente corrupto. Antes de ele pronunciar a primeira palavra todos os seus malfeitos seriam levados em consideração na nossa análise. Por mais eloquente que ele pudesse ser, dificilmente apagaria de nosso crivo crítico sua conduta reprovável.

Cabe a quem fala, portanto, manter um comportamento que corresponda às expectativas positivas ou afaste as opiniões contrárias. Se a fama for de boa qualidade, como no caso de Moro, para ir ao encontro do anseio do público, a comunicação deve privilegiar e ratificar todos os aspectos que construíram essa aura positiva.

A aura (e aqui aproveitamos a definição dada por Walter Benjamim ao se referir à obra de arte) é uma figura simbólica que se projeta no espaço-tempo. Esta forma simbólica corresponde a valor. O fato de Moro ser discreto e evitar o excesso de aparições públicas ajudou a conceder a ele esse valor de figura simbólica.

Fica impregnada no imaginário popular a figura do herói, daquele que tem o poder e a coragem de realizar o que nós, “pobres mortais”, nos sentimos impotentes de empreender. A cada graúdo poderoso que o juiz condena e ajuda a colocar atrás das grades é como se cada um de nós estivesse ali em seu lugar fazendo a justiça que desejamos.

Era esse herói, esse justiceiro, na concepção mais elevada do termo, que os telespectadores aguardavam ansiosamente para esta entrevista. E Moro não decepcionou. Respondeu a todas as perguntas com equilíbrio, sensatez e ponderação. Ao mesmo tempo em que se mostrava indignado ao falar daqueles que saquearam as empresas estatais.

Não importava se a pergunta vinha redonda, quicando na área, só para que ele concluísse a jogada, ou quadrada, com força desproporcional, obrigando-o a usar toda sua habilidade para ajeitar a jogada. Em todos os casos a resposta era dada de maneira natural, espontânea, sem nenhuma demonstração de artifício ou segundas intenções.

Fugindo um pouco até das suas características normais, em certos momentos falou com bastante emoção e foi enfático ao tratar dos temas mais agudos ligados à corrução. Em todos os instantes, entretanto, jamais alterou a postura altiva, sem arrogância, ou comprometeu a coerência do seu raciocínio.

Moro sabia também que seu conhecimento estava sendo avaliado, tanto pela maioria que o apoia, quanto por alguns que insistem em criticá-lo, seja por convicção ou por conveniência. Por isso, sem dar a impressão de que pretendia demonstrar preparo, naturalmente passou a imagem de um homem bem preparado.

Sem fugir um milímetro sequer do contexto do tema, em diversas situações, antes de dar a resposta, apoiou sua tese em exemplos de autoridades jurídicas ou em referências a grandes pensadores. Suas respostas foram cirúrgicas, envolvendo todos os ângulos da questão formulada. E se expressou com tanta convicção que não deixou uma dúvida sequer sobre o domínio que possui sobre a matéria da sua especialidade.

Sua fala quase sempre pausada acompanhada de postura elegante e de uma voz, que mesmo não sendo privilegiada pelo timbre e sonoridade, em todas as respostas e considerações transmitiu confiança e respeitabilidade. Da mesma forma, o vocabulário pronto, fluente, sem demonstrar hesitação, tratou dos mais complexos temas jurídicos com tamanha simplicidade que todas as pessoas conseguiram compreendê-lo sem nenhum esforço.

Os gestos foram sempre moderados, acompanhando de maneira harmoniosa o ritmo e a cadência da sua fala, suficientes para destacar as palavras relevantes, complementar as informações e, quando necessário, substituir vocábulos não proferidos. O semblante se assemelhou ao de um jogador de pôquer. Se alguém pretendeu observar alguma contradição entre o que ele comunicava com as palavras e o que demonstrava com a fisionomia, se frustrou, pois houve coerência o tempo todo, mesmo nos momentos em que virava os olhos para o lado antes de responder às perguntas mais delicadas.

Moro foi o Moro que todos esperavam. Sem subterfúgios atendeu a todos os entrevistadores. Até os mais críticos não podem reclamar, como Sérgio D'Ávila, da "Folha", que habilmente fazia perguntas como se o estivesse interrogando, usando para isso o mesmo recurso que o próprio Moro usa nos seus interrogatórios: o senhor não gostaria de aproveitar essa oportunidade para esclarecer esse assunto?

Ainda ouviremos falar muito sobre o juiz Sergio Moro. Esperamos que continue com a mesma conduta que adotou até aqui – agindo corretamente para julgar, sem olhar nome, posição social ou econômica. É o que cada brasileiro de bem gostaria de estar fazendo.

Superdicas da semana:

  • Fale com naturalidade
  • Fale com emoção
  • Demonstre conhecimento
  • Seja coerente

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "As Melhores Decisões não Seguem a Maioria", “Oratória para advogados”, "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva. “Oratória para líderes religiosos”, publicado pela Editora Planeta.

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