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Reinaldo Polito

Os cursos remotos são até mais eficientes que os presenciais

Falando em público - Getty Images
Falando em público Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

28/06/2022 04h00

Reservo-me com firmeza o direito de contradizer-me.
Paul Claudel

Durante 47 anos a nossa escola construiu a maior estrutura instalada para o ensino de Expressão Verbal do mundo. Não existe em nenhum outro país instalações semelhantes específicas para o ensino dessa matéria.

Só para dar ideia da dimensão dessas dependências, há uma história bastante curiosa. Há 20 anos ministramos aulas nos cursos de pós-graduação na ECA-USP. Em determinada época, por causa de uma greve prolongada, para não comprometer a sequência de um dos cursos que estava próximo ao encerramento, como a nossa matéria era a derradeira, resolveram levar os alunos para o nosso prédio.

Ficaram encantados com o que viram. A avaliação do local obteve resultados máximos. Como consequência, nos anos seguintes, as nossas aulas para eles foram todas ministradas ali.

Não estavam nos planos

Por que estou recordando esse fato? Nesses anos todos as pessoas viviam nos instigando a realizar cursos a distância: "Polito, faça cursos remotos. Você vai atender o mundo todo com mais facilidade. Muita gente que precisa se deslocar de estados distantes para aprender terá condições de frequentar suas aulas sem sair de casa".

Sempre resisti. Como é que eu poderia concordar que o resultado de um trabalho realizado em uma salinha de dois por dois seria o mesmo aos obtidos naquela sofisticada e bem aparelhada edificação. Eu respondia com firmeza: "Não dá. Esse é um tipo de curso que precisa do olho no olho. O aluno tem de perceber a presença do professor para se sentir animado e seguro".

Bem, nessas mais de quatro décadas, ministrando aulas nos três períodos do dia, inclusive aos sábados, formamos mais de 50 mil alunos. Quase a população de uma cidade de porte médio. Não havia nenhum motivo para novas experiências e mudanças.

Veio a pandemia

Veio a pandemia. No início imaginávamos que tudo seria resolvido em poucos dias. Depois em poucos meses. Mal sabíamos que ficaríamos reclusos por mais de dois anos. A realidade era outra, e a vida precisava continuar. Será que finalmente eu me renderia aos cursos remotos?

O primeiro passo foi o de adquirir computadores e iluminação de ótima qualidade. Em seguida experimentar todas as plataformas até identificar a mais adequada para esse trabalho. Foi preciso também encontrar um local dentro da própria casa para desenvolver as atividades com o mesmo profissionalismo a que estávamos acostumados e pelo qual éramos reconhecidos no mercado. Confesso que chegou a bater certa insegurança. Cheguei mesmo a duvidar de que o resultado seria excelente.

A minha filha Rachel Polito, que ministra cursos comigo há 25 anos, e com quem já escrevi cinco livros nos últimos tempos, por ser bem antenada na tecnologia, se mostrou mais confiante. Sentamos, a distância, evidentemente, porque não podíamos nos aproximar fisicamente, e discutimos as modificações que deveriam ser operadas.

Adaptações

A primeira decisão foi a de que não deveríamos, em nenhuma hipótese, transportar para o online o que fazíamos no presencial. A circunstância era outra. Concluímos também que a carga horária precisaria ser mais curta. Os alunos se cansariam muito, não aproveitariam a matéria e teriam dificuldade para se desenvolver com a mesma quantidade de horas consumidas no presencial.

Assim, as aulas que duravam três horas foram reduzidas pela metade, só uma hora e meia. Os grupos presenciais que chegavam a 30 participantes foram reduzidos para no máximo dez. Cortamos os intervalos. Tornamos os cursos mais dinâmicos e interativos. Deu certo.

Resultado

Nos cursos remotos passamos mais teoria, os alunos fazem mais apresentações, com mais gravações dos seus exercícios. As nossas avaliações orais e escritas são mais abrangentes e profundas. Como consequência todos aprendem muito em menos tempo. São dois anos e meio de resultados bem-sucedidos.

Já tivemos oportunidade de receber nos cursos remotos ex-alunos que nos procuraram para fazer reciclagem do aprendizado e aperfeiçoar as técnicas de comunicação. Os comentários são unânimes: "Eu não imaginava que pudesse aprender ainda mais nos cursos remotos".

Conto essa experiência pessoal para mostrar que às vezes nos apegamos a determinadas fórmulas de ações e imaginamos que não existem caminhos alternativos. Somente diante das crises, quando somos obrigados a buscar saídas, muitas vezes emergenciais, e até de sobrevivência, é que descobrimos que as soluções quase sempre estão diante dos nossos olhos.

Crescemos nas crises

Dessa mesma salinha de dois por dois, já proferimos várias palestras para mais de dez mil pessoas cada uma com resultados excepcionais. Houve casos em que tivemos participantes de todos os estados do país e alguns do exterior. A pandemia foi uma tragédia humanitária. Quantas pessoas queridas nos deixaram por causa do Coronavírus!

Em termos profissionais, entretanto, foi o empurrão de que precisávamos para encontrar uma nova e arrebatadora dimensão para o nosso trabalho. Para encontrar esses novos atalhos, na maior parte das vezes, dependemos de preparo, necessidade, iniciativa e uma boa dose de ousadia. As crises são, sem dúvida, a alavanca que nos movem para o crescimento e realização.

Ah, e por causa desses resultados tão positivos nos nossos cursos remotos, eu e a Rachel publicamos pela Expressa, um selo da Editora Saraiva, um livro ensinando como se comunicar a distância: "Comunicação a distância - o que não fazer".

Superdicas da semana

  • Cursos remotos podem ser até mais eficientes que os presenciais
  • Erra quem tenta levar para o online as mesmas soluções empregadas no presencial
  • Com os cursos remotos temos a oportunidade de frequentar as melhores escolas do mundo
  • Para trabalhar ou estudar em casa é preciso vontade, critério e disciplina
  • As crises nos ajudam a encontrar soluções inimagináveis

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Comunicação a distância - como não fazer", "Os segredos da comunicação no mundo corporativo", "Como falar corretamente e sem inibições" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 minutos para falar bem em público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.