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Reinaldo Polito

Lula debocha de Bolsonaro e desrespeita a liturgia do cargo

Bolsonaro e Lula frente a frente - 16.out.2022 - Nelson Almeida/AFP
Bolsonaro e Lula frente a frente Imagem: 16.out.2022 - Nelson Almeida/AFP

Colunista do UOL

21/02/2023 04h00

Respeita-se um homem que se respeita a si mesmo.
Balzac

Um presidente não é "um Lula" ou "um Bolsonaro", mas sim "um presidente". Assim como aquele que foi chefe do Executivo nunca poderá ser "um Collor" ou "um Temer", mas sim "um ex-presidente". Por isso, a liturgia do cargo daquele que veste a faixa presidencial exige uma comunicação exemplar.

Erra Bolsonaro ao se referir a Lula de forma pejorativa, assim como erra Lula ao se referir ao ex-presidente com deboche. Chamar Bolsonaro de "o coisa", Temer de "golpista" e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, de "aquele cidadão" não é respeitoso e não condiz com o cargo para o qual foi investido dentro de um processo democrático.

Metade da população

Afinal, "o coisa" a que Lula se refere não foi apeado do poder por uma diferença abismal de votos. E mesmo que fosse. Ao contrário, o resultado das últimas eleições apresentou a menor diferença da história, apenas cerca de dois milhões de votos. Foram 60,1 milhões para o vencedor, contra 58 milhões para o derrotado.

Portanto, quase 60 milhões de brasileiros escolheram o ex-presidente nas eleições. O que nos leva a dizer que adotar esse tipo de tratamento desrespeitoso, agride não apenas a figura do ex-presidente, mas sim cerca de metade da população brasileira que fez uma opção diversa no pleito.

Pacificação

Sem contar que Lula faz uma pregação com as palavras, e age de maneira totalmente distinta. Desde o início, fala o tempo todo em pacificação, mas suas ações demonstram que o que ele menos deseja é buscar harmonia com aqueles que saíram derrotados das urnas. Essa conduta não é boa para o Brasil. Não é saudável para o nosso processo democrático.

Ninguém espera que o atual presidente elogie as ações de seu antecessor. Não, faz parte da política mostrar os erros dos adversários para valorizar as decisões que toma. Para isso, entretanto, não há necessidade de baixar o nível e deteriorar a liturgia do cargo só para agradar seus seguidores.

O retorno de Bolsonaro

Em breve Bolsonaro estará de volta. Se, por acaso, seguir essa mesma linha, referindo-se ao presidente com insinuações pejorativas, também merecerá críticas. Por exemplo, por mais que Bolsonaro tenha ficado magoado com a derrota, como ex-presidente, deveria ter tido a humildade de passar a faixa ao novo presidente.

Não seria ele Bolsonaro participando desse ato, mas sim o ex-presidente, dentro das regras da democracia, empossando o novo presidente. Ou seja, mais uma vez, não seria Bolsonaro e Lula, mas sim o ex-presidente e o presidente. Todos teriam se beneficiado com esse gesto; quem chega, quem sai e, principalmente, o país, que ainda está engatinhando nesse aprendizado da conquista da democracia.

Revanchismo

Tomara que esse revanchismo, que esse rancor pessoal desapareça. Que deixem essas farpas por conta dos eleitores, que muitas vezes costumam se comportar como ferrenhos torcedores de futebol. Sempre com muita emoção, dificilmente com a razão.

Ainda estamos no início do governo. Teremos mais quatro anos pela frente. As contendas serão cada vez mais acirradas. Sem problema, visto que essa disputa é até benéfica ao país. Cada lado mostrando os desacertos do outro. É uma boa oportunidade de deixar um pouco de lado o populismo, bastante natural em quem está no poder, ou em quem deseja ocupá-lo, e acertar os rumos que colocarão o Brasil nos trilhos.

Ataques repetidos

Os ataques têm sido recorrentes. Especialmente por parte de Lula, desde que assumiu a presidência. Quem sabe ele se conscientize de que foi eleito, que as eleições terminaram, que é o momento de governar e não ficar com picuinhas que só mostram a mágoa - que até poderia ser do Lula, mas nunca do presidente.

Assim sendo, que aprenda logo. Ele é o presidente, e precisa ser respeitado pelo cargo que ocupa. Do mesmo jeito que Bolsonaro é o ex-presidente, e também precisa receber a consideração pelo cargo que ocupou.

Superdicas da semana

  • Para ser respeitado é preciso saber respeitar
  • Uma coisa é a pessoa, outra, diferente, é o cargo que ocupa
  • Atacar as ideias, sim. Atacar as pessoas pode ser um equívoco
  • Quem planta vento pode colher tempestade

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Como Falar Corretamente e sem Inibições", "Saiba dizer não", "Comunicação a distância", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.